Renan: Cármen Lúcia é 'exemplo de caráter'

 

26/10/2016
Catarina Alencastro
Eduardo Barretto
André de Souza

 

Em reunião de presidentes dos três poderes sobre segurança pública, o presidente do Senado, Renan Calheiros, tentou superar a crise com o Judiciário e elogiou o caráter da presidente do Supremo, Cármen Lúcia. Após uma semana de embates públicos por causa da prisão de agentes da Polícia Legislativa, o presidente do Senado, Renan Calheiros, se desculpou com a presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia. Eles estiveram juntos na reunião dos chefes dos três Poderes para debater a Segurança pública e ao fim do evento, no Palácio do Itamaraty, Renan fez um pronunciamento dizendo que a ministra é um “exemplo de caráter”. A reunião serviu também para baixar a tensão entre o presidente do Senado e o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Os dois se cumprimentaram amistosamente.

Armistício. O ministro Moraes passa por trás de Michel Temer e Cármen Lúcia para cumprimentar Renan Calheiros

— Aproveitei a oportunidade para dizer que tenho muito orgulho, um orgulho que vou levar para a minha vida, de ser presidente do Congresso Nacional no exato momento em que a Cármen Lúcia é a presidente do Supremo Tribunal Federal. Ela é, sem dúvida nenhuma, o exemplo do caráter que nós precisamos e que identifica o povo brasileiro — disse Renan.

Ele começou a trabalhar para acabar com o mal-estar no dia anterior, quando telefonou para Cármen Lúcia e reconheceu que “passou do tom” ao chamar de “juizeco” o magistrado que expediu os mandados de prisão dos policiais legislativos do Senado. O presidente Michel Temer também reafirmou que a paz reinou no encontro, sinalizando que a crise foi superada:

— Clima de harmonia absoluta e de responsabilidade. Todos eles... todos nós, aliás, voltados para esse tema (problemas da Segurança pública) que preocupa o Estado brasileiro.

A outra ponta do conflito também foi aparentemente pacificada. Outro alvo das ofensas de Renan, que o chamou de “chefete de polícia”, Alexandre de Moraes aproveitou a reunião para fazer um gesto amigável ao presidente do Senado. Segundo participantes, Moraes citou o exemplo de Maceió, capital do estado de Renan, dizendo que até 2014 era a capital mais violenta, mas que depois que o governo federal passou a ajudar na investigação de crimes, é hoje uma das 12 menos violentas. Renan, satisfeito com a menção, disse que o apoio da União foi realmente fundamental. Os dois ficaram sentados frente a frente na reunião, à qual compareceram Rodrigo Maia, presidente da Câmara; Rodrigo Janot, procurador-geral da República; Leandro Daiello, diretor da PF; José Serra, ministro das Relações Exteriores; Claudio Lamachia, presidente da OAB; e comandantes militares.

O ministro Teori Zavascki, do STF, autorizou ontem o retorno ao trabalho dos policiais legislativos do Senado presos durante a Operação Métis, suspeitos de tentar obstruir a Operação LavaJato. Todos já foram liberados. O ministro pediu um parecer do MPF sobre um pedido feito pela Mesa do Senado para a devolução de equipamentos antigrampo apreendidos na operação. Quinta-feira, Teori suspendeu o inquérito policial, determinou que o processo seja remetido ao STF, e mandou transferir os equipamentos ao Supremo. Na mesma ação, a PF defendeu a legalidade das buscas feitas no Senado e pediu que o STF aguarde a análise dos equipamentos apreendidos antes de decidir o futuro da investigação.


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Muitas propostas e poucas decisões no encontro dos Três Poderes sobre Segurança

 
29/10/2016
 

A reunião de chefes dos Três Poderes serviu para a apresentação de propostas para melhorar a segurança pública no país. Mas pouca coisa de concreto saiu do encontro. Os participantes citaram medidas já previstas anteriormente, como a liberação de dinheiro para equipamentos para a polícia; e sugeriram outras, como a implantação de um acordo do Mercosul que autoriza a polícia de cada país a atravessar a fronteira para perseguir criminosos.

Os participantes também debateram a crise do sistema prisional. A presidente do STF, Cármen Lúcia, destacou que a Corte já determinou a utilização imediata de verbas do Fundo Penitenciário, que não podem ser contingenciadas. O presidente da OAB, Claudio Lamachia, defendeu que presos de maior e menor periculosidade sejam separados, para evitar que os últimos saiam mais perigosos. A questão foi mencionada pelo presidente Michel Temer em breve pronunciamento após a reunião:

— Nós deliberamos, já para este ano, a aplicação na área de equipamentos da polícia, seja da Força Nacional, seja nos estados, já liberamos R$ 778 milhões. E o Fundo de Segurança Pública também será utilizado para o aprimoramento e a construção de penitenciárias.

— Há necessidade de fazer com que as prisões sejam de melhor qualidade. Quem está fora ir para dentro da prisão. E quem está na prisão sem ter cometido crime doloso contra a vida e sem porte de arma poder pagar penas alternativas — afirmou o ministro da Defesa, Raul Jungmann.

A possibilidade de a polícia de um país perseguir criminosos nas fronteiras foi levada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Segundo Jungmann, o acordo já existe, mas falta ser implementado. O presidente do Senado, Renan Calheiros, propôs a criação de uma CPI para investigar a atuação de grupos criminosos no financiamento das eleições. Cármen Lúcia defendeu uma base de dados única sobre o crime no Brasil.

Também foi mencionado o reforço de 7 mil homens da Força Nacional para o trabalho em campo. Jungmann informou que para o lançamento do Plano Nacional de Segurança Pública falta só a anuência dos governadores. Futuros encontros vão envolver os estados.

 

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‘Polícia é lenta, e os criminosos, rápidos’                    

  
29/10/2016
Vera Araújo     

 

Ex-secretário nacional de Segurança, o coronel reformado da PM de São Paulo José Vicente da Silva Filho fala da crise na segurança pública do país.

Como frear a violência no país, principalmente em estados do Nordeste?

Sergipe e Rio Grande do Norte ocupam as primeiras posições em número de homicídios. Nos últimos anos, não tivemos uma política nacional com um modelo de gestão e tecnologia da informação para os estados, nem bancos nacionais de dados criminais e de identificação civil únicos e atualizados. Sem isso, a vida do criminoso fica mais fácil. Há falta de gestão nos estados?

Sim. As estatísticas devem servir não só para informar a sociedade, mas como ferramentas para se preparar o policiamento nas ruas. O que acontece hoje? A polícia é lenta, e os criminosos, rápidos.

Como fazer um planejamento diante da atual crise financeira?

A solução é investir em talentos. Escolher as pessoas certas, por exemplo, para investigar crimes violentos como homicídios. Não precisa de helicópteros e viaturas potentes. O que fazer para vigiar as fronteiras? São 17 mil quilômetros de fronteira entre o Brasil e outros países. Não é fácil. O combate no território nacional pode ser mais eficiente, como a fiscalização de empresas de segurança que perdem centenas de armas como pistolas e revólveres, mais usadas em assaltos.

 

O globo, n. 30399, 29/10/2016. País, p. 11