Valor econômico, v. 17, n. 4134, 18/11/2016. Política, p. A11

Pauta de manifestantes vai de fim do comunismo a nióbio

Por: Raphael Di Cunto e Fabio Murakawa

 

Basta uma busca nos seguidores e integrantes de comunidades que apoiam a candidatura presidencial do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ) no Facebook para encontrar os manifestantes que participaram da invasão do plenário da Câmara dos Deputados com o objetivo de defender intervenção militar no país e uma nova ditadura.

Organizados em grupos nacionalistas nas redes sociais, os participantes da invasão estavam em Brasília desde o dia anterior, mas o Congresso estava fechado devido ao feriado da República. Segundo parlamentares, a segurança estava mais relaxada no dia pela falta de pautas polêmicas em votação, e o ingresso foi facilitado pela falta de um líder. O movimento sequer tem uma identificação nacional e foi batizado com vários nomes pelos próprios manifestantes.

O ato tinha uma pauta extensa. Eram 40 itens, desde o fim do comunismo e do aborto até a valorização do nióbio e a maioridade penal com 14 anos. Em alguns pontos, se assemelha à agenda da esquerda, exigindo a auditoria na dívida e nas privatizações do governo FHC. Em outros, defendem delegar o poder aos militares.

No corre-corre da invasão do plenário, o principal objetivo não ficava evidente. Até que o grupo começou a gritar que exigia a presença de um general para negociar. Apesar de defenderem um golpe militar, reclamaram na internet de serem tratados na mídia como invasores, enquanto o MST faz "ocupações".

A manifestação de ontem parecia não ter uma liderança unificada. Mas, a depender de parte da plateia no Facebook, já há uma eleita. "Não existe movimento sem um líder e agora já temos, é Dileta Corrêa Silva, Intervencionista Militante de ótimo valor moral e intelectual", diz a página FaceNews Conservadores, que até ontem contava com 94.918 seguidores.

O comentário foi postado junto a um vídeo da ação em que Dileta, sobre a Mesa Diretora da Câmara, faz um discurso furioso contra os deputados, a quem classifica como "crime político organizado que saqueou o Brasil". Ela os responsabiliza pelo alto número de assassinatos no Brasil e o de mortos na fila dos SUS. "E vocês estão aqui fazendo o quê? Discutindo pauta? Querendo acabar com a Lava-Jato? É isso?", diz Dileta no vídeo.

Entre os itens da pauta que queriam negociar com o "general" e o presidente Michel Temer, a quem parte acusou de comunista, está o julgamento dos políticos por um tribunal militar sob as acusações de traição e lesa-pátria.

Nas redes sociais, integrantes do grupo defendiam, durante a invasão, que as Forças Armadas deveriam apoiar o protesto e "libertar o Brasil da mão dos comunas".

Como ninguém fardado apareceu, todos foram levados pela Polícia Federal. Decepcionados, criticaram aqueles a quem desejavam entregar o país. "O alto comando das Forças Armadas defendem (sic) os comunistas... não defendem o povo. Querem que o povo morra de fome", reclamou um corretor de imóveis, pelo Facebook, acusando generais de estarem de mãos dadas com "o governo socialista bolivariano brasileiro".

Segundo a PF, duas pessoas serão indiciadas por lesão corporal, por uma briga com seguranças da Câmara, e os outros 49 serão alvo de inquérito por dano ao patrimônio -a porta de vidro do plenário quebrou durante a invasão.

Os invasores mantêm contato pelas redes sociais desde as manifestações pelo impeachment de Dilma Rousseff. Dileta é figura conhecida nos protestos contra a petista e a favor da intervenção militar tanto em Brasília como em sua terra, Balneário Camboriú (SC).

Ela diz fazer parte de um movimento chamado União Patriótica Nacional. Em abril, acampou com outros manifestantes pró-impeachment por mais de um mês em frente ao Congresso. Na véspera da votação na Câmara, deu entrevista à Agência Brasil: "Com impeachment ou sem impeachment a resistência vai continuar", disse, referindo-se ao ideal da intervenção militar.