Valor econômico, v. 17, n. 4133, 17/11/2016. Política, p. A11

Renan diz que juízes 'vestem carapuça' ao criticá-lo

Por: Fabio Murakawa e Vandson Lima

 

Em mais um capítulo da guerra entre Renan Calheiros (PMDB-AL) e o Judiciário, o presidente do Senado disse ontem ser "uma tolice" pensar que projetos como o que visa limitar os salários dos Três Poderes ao teto constitucional e o de abuso de autoridade, patrocinados por ele, são tentativas de barrar a Lava-Jato e intimidar o Ministério Público e a Justiça. Nos últimos dias, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e seu presidente vêm emitindo notas e declarações abertamente críticas a uma alegada ofensiva de Renan contra o Judiciário.

A relação entre Renan e o Judiciário deteriorou-se desde que o juiz federal Vallisney de Souza Oliveira autorizou uma operação da Polícia Federal dentro do Senado. À época, Renan afirmou que "um juizeco de primeira instância não pode atentar contra um Poder", o que provocou o rechaço da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cármen Lúcia.

Nos últimos dias, a Ajufe vem soltando notas críticas ao Senado e a Renan, desde que começaram a ser discutidos no Congressoprojetos para supostamente intimidar a atuação do Judiciário. Dentre as medidas criticadas pela Ajufe, está uma comissão criada por Renan para identificar e regulamentar a limitação dos salários nos Três Poderes com base no teto constitucional, de R$ 33,7 mil - o salário dos ministros do STF. Outra é o projeto que visa regulamentar o abuso de autoridade, que prevê penas inclusive para magistrados que incorrerem no delito. O presidente da Ajufe, Roberto Veloso, classificou essas iniciativas de "retaliação". ParaRenan, a Ajufe está "vestindo a carapuça", e sua ação se destina "aos Três Poderes".

"Eu acho isso [a reação da Ajufe] uma tolice. Como é que entidades de magistrados, de primeira e segunda instância, fazem notas atribuindo a responsabilidade a alguém porque quer impedir que outros, de todos os Poderes, recebam mais do que a Constituição permite?", questionou. "Se fazem isso para inibir o Senado Federal, definitivamente eles não vão inibir o Senado Federal."

O senador fez referência à PEC do Teto, em tramitação no Senado e que limita o gasto público pelos próximos 20 anos à inflação do na anterior, para dizer que "você não pode regulamentar o gasto público e conviver com salários milionários de marajás". "O Brasil não tolera isso e o senado definitivamente não vai fechar os olhos", afirmou.

Ontem, após reunião de líderes, Renan divulgou um calendário de votações que prioriza duas medidas que afetam diretamente os magistrados: a que prevê o fim da vinculação automática de reajustes dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) a outras carreiras, conhecida entre aliados do presidente como "PEC da Vingança"; e o projeto que atualiza a legislação e aumenta penas para o crime de abuso de autoridade.

A PEC da desvinculação dos subsídios será votada em primeiro turno no dia 30 e em definitivo no Senado no dia 8. O abuso de autoridade tem votação marcada para o dia 6 de dezembro, após a realização de dois debates, dos quais participarão, entre outros, o juiz federal Sérgio Moro e o ministro do STF, Gilmar Mendes.

Para esta proposta, foi definido Roberto Requião (PMDB-PR) como relator. A escolha surpreende. Requião é, de fato, um defensor de primeira hora da proposta. Mas trata-se de um projeto patrocinado pelo presidente do Senado, alvo de oito inquéritos relacionados à Lava-Jato e de quem Requião é um duro crítico.