Valor econômico, v. 17, n. 4130, 11/11/2016. Política, p. A5

Lava-Jato investe contra operador

Por: André Guilherme Vieira

 

A Operação Lava-Jato deflagrou ontem sua 36ª fase, a Dragão, e investiu contra um operador até pouco conhecido, que lavou mais de R$ 56 milhões para empreiteiras como UTC, Mendes Junior e Odebrecht, segundo o Ministério Público Federal. O advogado Rodrigo Tacla Duran, suspeito de receber R$ 61,3 milhões de origem criminosa entre 2011 e 2015.

Duran teve prisão decretada e é apontado pelo MPF como controlador de 12 contas em nome de offshores usadas pelo grupo Odebrecht para movimentar recursos ilícitos no exterior. O Ministério da Justiça já solicitou a extradição dele aos Estados Unidos, onde estaria foragido. Duran, que tem nacionalidade espanhola, está incluído na lista de fugitivos da Interpol desde 13 de setembro.

O operador utilizou do expediente conhecido como dólar cabo - troca de posições financeiras feitas entre países por doleiros, sem o uso do sistema bancário oficial - para abastecer o caixa dois das empresas investigadas, segundo o procurador da República Julio Noronha.

"Valores mantidos em contas secretas da Odebrecht [no exterior] foram transferidos para contas de Rodrigo Duran, também secretas e no exterior, para que por meio destas ele disponibilizasse recursos a doleiros e estes pudessem gerar o recurso em espécie no Brasil, que eram utilizados para o pagamento de propinas", disse Noronha.

A análise das contas bancárias do escritório de advocacia Tacla Duran revelou um fluxo milionário de pagamentos recebidos pelas empresas e empreiteiras que estão na mira da Lava-Jato.

Foram R$ 15 milhões da UTC Engenharia; R$ 9,7 milhões da SA Paulista; R$ 2,9 milhões de empresas da Triunfo Participações e Investimentos; R$ 2,5 milhões da EIT Engenharia e R$ 1 milhão da Empresa Concessionária de Rodovias do Norte S.A - Econorte.

A Mendes Júnior e a UTC repassaram, respectivamente, R$ 25 milhões e R$ 9 milhões para as empresas controladas por Duran, no período de 2011 a 2013, de acordo com o MPF.

A atuação criminosa atribuída a Rodrigo Duran foi revelada pelo delator da Odebrecht Vinicius Veiga Borin. Ele mostrou aos investigadores que o operador é identificado no sistema Drousys do Setor de Operações Estruturadas pelo codinome "Rui Rey" - menção ao ex-centroavante do Corinthians na década de 70.

Além da prisão de Duran, o juiz Sergio Moro decretou a preventiva de Adir Assad, operador de propinas condenado em primeira instância na Lava-Jato por associação criminosa e lavagem de dinheiro pelo repasse de R$ 18 milhões em contrato do Consórcio Interpar com a Petrobras, destinado ao pagamento de propinas ao ex-diretor de Serviços Renato Duque e ao ex-gerente de Engenharia Pedro Barusco. Assad cumpre prisão cautelar desde agosto e também é investigado por suspeita de desvios de R$ 370 milhões em obras públicas envolvendo a construtora Delta.

Segundo o procurador Julio Noronha, Assad realizou lavagem de dinheiro para a Odebrecht gerar recursos destinados ao pagamento de propinas ao menos até 2014.

O procurador da República Roberson Pozzobon destacou que o fato de Rodrigo Duran ter sido o destinatário de mais de R$ 61 milhões caracteriza uma operação de caixa dois que garantia às empresas "disponibilidade financeira para prática de todos os [tipos de] fins ilícitos".

Pozzobon aproveitou a entrevista coletiva realizada ontem, em Curitiba, para enviar uma mensagem ao governo e à Câmara dos Deputados, que têm ensaiado hipóteses legislativas para anistiar a prática de caixa dois.

"Muito nos preocupa um contexto em que nossos representantes políticos falem, pelo menos nos corredores se ouve muito dizer, de uma anistia ao caixa dois. Pois com isso se anistiariam justamente o processo de lavagem de capitais e de corrupção".

Pozzobon foi categórico ao criminalizar toda atividade que envolva caixa dois. "É crime. Não existe caixa dois que não seja de uma prática de crimes antecedentes, de corrupção, de organizações criminosas, de fraudes à licitação".