Renan quer votar lei de abuso de autoridade com reforma política

Cristiane Jungblut, Júnia Gama e Martha Beck

19/10/2016

 

 

Ideia é rejeitada por relator do projeto, que prevê debate de dois anos

 

presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), defendeu ontem que o Congresso vote a partir de novembro um pacote incluindo a reforma política, as medidas de combate à corrupção e o projeto que pune o abuso de autoridade. Renan disse que a Câmara e o Senado deveriam fazer um acordo para mexer nesses três pontos.

— Fizemos uma reunião com a Câmara para que logo depois do segundo turno possamos avançar na reforma política. E entendo que a reforma política deve ser conjugada com as leis de combate à corrupção e do abuso de autoridade. Esse aperfeiçoamento, mais do que nunca, se faz necessário no Brasil. Se fizermos essa conjunção para votarmos essas propostas, estaremos aperfeiçoando o Brasil e, consequentemente, suas instituições — afirmou Renan.

No dia 9 de novembro, serão votadas as primeiras propostas da reforma política.

— Esse sistema que está aí está carcomido — disse Renan.

O relator do projeto que define os crimes de abuso de autoridade, senador Romero Jucá (PMDB-RR), no entanto, divergiu do presidente do Senado, e afirmou ao GLOBO que a medida não será votada este ano. Jucá discorda do cronograma previsto por Renan, de pautar o tema para votação em novembro, e disse que o projeto ainda não está “maduro”.

Para o senador, que é presidente do PMDB, é preciso desvincular a Operação Lava-Jato da discussão do projeto, para minimizar resistências. Jucá defende que a medida deve passar por um longo debate nas comissões temáticas do Senado, incluindo audiências públicas com todos os atores envolvidos, e só ir ao plenário quando ficar claro para a sociedade que se trata de um avanço, e não de um retrocesso.

— Este projeto só será votado quando estiver maduro e ele não está maduro ainda. O relatório não tem data para ficar pronto. Temos que debater, ouvir todos os envolvidos e desvincular essa discussão dos casos da Lava-Jato. Vai ser um debate longo, deve demorar até uns dois anos para ser votado no Senado e na Câmara. O ideal é que só seja concluído quando a Lava-Jato tiver terminado — defendeu Jucá.

Para o senador, há “muito pouco” abuso de autoridade na Lava-Jato. Jucá acredita que houve alguns episódios que podem ser considerados ilegalidades, como a divulgação dos áudios de conversas entre a então presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula, mas esses casos não podem ser vistos como abuso de autoridade.

Jucá chegou a ser nomeado ministro do Planejamento pelo presidente Michel Temer, em maio, mas pediu exoneração do cargo uma semana e meia depois, após a divulgação de conversas suas com o ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, em que sugeria um pacto para barrar a Lava-Jato.

Após o segundo turno das eleições municipais, Jucá pretende reunir os líderes partidários e anunciar um cronograma de debates sobre o projeto, incluindo as audiências públicas e os nomes que deverão ser ouvidos. A ideia do senador é convidar integrantes do Ministério Público, da receita Federal, da Polícia Federal, do Ministério Público do Trabalho, além de cidadãos que tenham sido vítima de abuso de autoridade.

A discussão sobre o projeto é envolvida por polêmica. O anúncio de que a medida sobre abuso de autoridade seria votada foi feito por Renan pouco depois de o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ter pedido a prisão do presidente do Senado, do ex-presidente da República José Sarney (PMDB-AP), do então presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e de Jucá, em junho deste ano. A reação de Renan foi vista como uma retaliação a Janot.

— Queremos criar canais de denúncia sobre abuso de autoridade e também uma metodologia de avaliação. Ao mesmo tempo, é preciso preservar a autoridade, dar transparência no exercício da autoridade e possibilidade de defesa para o cidadão que foi vítima de abuso — disse Jucá.

 

FUNDO ELEITORAL EXTRA

Com o objetivo de viabilizar a aprovação de um fundo eleitoral extra de cerca de R$ 3 bilhões a cada dois anos para financiar as eleições com recursos públicos, líderes partidários querem convencer o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, a apoiar a medida. Jucá — que é um dos formuladores desta alternativa —, já marcou audiência com Gilmar no início de novembro para tratar do tema.

 

“Entendo que a reforma política deve ser conjugada com as leis de combate à corrupção e do abuso de autoridade”

Renan Calheiros

Presidente do Senado

 

 

O globo, n. 30389 , 19/10/2016. País, p. 10.