Teto de gastos mais próximo

Martha Beck e Cristiane Jungblut

07/10/2016

 

 

-BRASÍLIA- Em uma sessão tumultuada, a comissão especial da Câmara dos Deputados criada para analisar a proposta de emenda constitucional (PEC) 241, que fixa um teto para os gastos públicos, aprovou ontem o texto. Apesar das tentativas da oposição, liderada pelo PT, de obstruir a votação, o governo conseguiu vitória por ampla maioria. Dos 30 integrantes da comissão, 23 votaram a favor da PEC e apenas sete contra. O texto segue agora para apreciação no plenário da Câmara, que deve começar na segunda-feira.

Para facilitar a aprovação, o relator, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), decidiu retirar do texto a prorrogação da Desvinculação de Receitas da União (DRU) até 2036. Ele havia incluído esse mecanismo no texto para dar maior flexibilidade à gestão orçamentária. A DRU permite que o governo maneje livremente 30% de sua receita de impostos e contribuições. A desvinculação vigora até 2023, mas a ideia do relator era que ela fosse mantida até o fim da vigência da regra do teto, 2036.

Também ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, fez um pronunciamento veiculado em cadeia nacional para defender a PEC. No vídeo, ele se dirigiu diretamente aos cidadãos:

— Na sua casa, todos sabem que não podem se endividar para gastar mais do que ganham, continuamente. Com o governo acontece a mesma coisa. Temos de sair da crise e reverter esse quadro de recessão e desemprego. É por isso que defendemos o equilíbrio das contas do país. Meirelles criticou a gestão Dilma Rousseff: — Para você ter uma ideia, só este ano o nosso déficit será de R$ 170 bilhões. Ou seja, esse é o tamanho do prejuízo que tivemos de assumir. E isso já vinha ocorrendo em anos anteriores. O governo vinha se endividando e pagando juros muito altos para poder financiar essa conta.

O ministro afirmou que a adoção de um teto de gastos permitirá a retomada da confiança na economia, bem como a queda da inflação e do desemprego. E assegurou que não haverá prejuízos para as áreas de saúde e educação:

— É necessário um prazo para ajustar as contas de forma gradual, sem retirar direitos, sem cortar o dinheiro dos projetos mais importantes. Saúde e educação, por exemplo, serão preservados. Estamos criando mecanismos para garantir que essas áreas prioritárias não terão perdas — afirmou Meirelles, ressaltando que o momento exige “dedicação e esforço” de todos. — Não aceitamos mais inflação e desemprego. Porque os mais pobres é que pagam essa conta. Com a aprovação da proposta que equilibra as contas públicas, vamos superar este momento e recolocar o Brasil no caminho da justiça social, com desenvolvimento de verdade. 

PROTESTOS DURANTE A SESSÃO

Durante quase nove horas, os parlamentares se revezaram nos microfones para defender ou criticar o teto. Em alguns momentos, a temperatura subiu. Durante o debate, manifestantes começaram a gritar: “Não à PEC da morte”. O deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA) reagiu e disse que, na plateia, devia haver servidores ou pessoas pagas para estar lá.

— Vocês estão recebendo “teteia” ou são servidores públicos — disse Aleluia, provocando a ira dos manifestantes e gritos.

O grupo também interrompeu o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) quando este afirmou que a PEC preservava os gastos com saúde e educação. O professor da rede pública de São Paulo Carlos Magalhães gritou que “falta dinheiro até para comprar papel higiênico” nas escolas. Marun se irritou e exigiu que a polícia da Câmara retirasse o homem da sala.

Alguns metros adiante, o professor desmaiou. Vários parlamentares intervieram e acusaram os seguranças de truculência. A deputada Angela Albino (PCdoB-SC) disse que os seguranças agarraram com força a garganta do manifestante, que usava uma camisa da CUT. O professor foi levado para o serviço médico, atendido e, depois, liberado.

A PEC é considerada a principal medida econômica do governo Michel Temer. A fim de reequilibrar as contas públicas, ela estabelece que os gastos de um ano só poderão crescer com base na inflação do ano anterior. A maior polêmica girou em torno do impacto do teto sobre os gastos com saúde e educação.

Para facilitar a aprovação da medida, o governo costurou com o relator um novo texto excluindo os gastos com saúde e educação da regra do teto até 2018. Além disso, para 2017, foi aumentado de 13,2% para 15% da receita corrente líquida (RCL) o percentual mínimo que o governo precisa destinar à área de saúde.

Colaboraram Gabriela Valente e Evandro Éboli.

 

O globo, n. 30377, 07/10/2016. Economia, p.17