Valor econômico, v. 17, n. 4127, 08/11/2016. Brasil, p. A2

Dívida de R$ 170 milhões com União bloqueia contas do governo do Rio

Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, presidente do TJ do Rio: pacote poderá acarretar o sucateamento da Justiça

Por: Robson Sales

 

A penúria das contas do governo do Rio de Janeiro ganhou novo capítulo ontem após o bloqueio dos recursos estaduais devido a uma dívida de R$ 170 milhões com a União. A Secretaria Estadual de Fazenda prevê quitar o débito em três dias úteis, mas até lá todos os pagamentos estão suspensos, inclusive para servidores e fornecedores.

Em junho, as contas do Estado foram bloqueadas, quando não foi paga uma parcela de empréstimo com a Agência Francesa de Desenvolvimento. Agora, a conta não paga é referente a contratos com a União. Um bloqueio total das contas não está descartado, admite a secretaria.

"Ocorre cada vez que o Estado deixa de pagar parte da dívida contratada. Novo bloqueio sempre pode acontecer se o Estado voltar a atrasar pagamento, isso é contratual, é uma ação imediata", informou a Secretaria de Fazenda. Segundo a secretaria, o bloqueio não deve interferir no pagamento de servidores, inativos e pensionistas previsto para o dia 16.

O bloqueio das contas ocorre logo após o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) anunciar um pacote fiscal. Estão no programa 22 projetos de lei, que precisam ser aprovados na Assembleia Legislativa (Alerj). A proposta prevê elevar a contribuição previdenciária de servidores, inativos e pensionistas a até 30% e ainda cortes de programas sociais.

A expectativa da Alerj é começar a votar a partir do dia 16. Sindicatos e associações já se armam para uma guerra jurídica, caso as medidas sejam aprovadas. "Estamos produzindo ações para minimizar os prejuízos das medidas", diz Álvaro Barbosa, presidente da Federação das Associações dos Servidores Públicos (Fasp).

Deputados estaduais já ensaiam resistência para aprovar as medidas na Assembleia Legislativa. A principal questão, destaca Carlos Minc (sem partido), é a elevação da alíquota para servidores. "Haverá uma insurreição dos funcionários", previu o parlamentar que integra a oposição ao governador. Se os textos passarem, é provável enfrentarem barreira judicial antes de serem implementadas, disse Minc.

A base do governador na Alerj deve diminuir com o corte de secretarias deixando sem cargos aliados, atrapalhando a votação do plano. "Quem vai se expor na defesa de um governo fraco e com medidas que podem ser contestadas na Justiça?", indagou.

O presidente do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ), desembargador Luiz Fernando Ribeiro de Carvalho, demonstrou publicamente a insatisfação com cortes de recursos do Judiciário. Em pronunciamento, alertou que o pacote lançado pelo governo fluminense poderá acarretar o sucateamento da Justiça, com o consequente fechamento de fóruns. Disse que o Judiciário não permitirá que a crise seja utilizada para justificar o que considera desrespeito aos princípios da independência dos Poderes.

Durante sessão do Órgão Especial em que 25 desembargadores do TJ-RJ são reunidos para o julgamento de ações em tramitação na alta esfera do Poder Judiciário, Carvalho acrescentou que Pezão reeditou projetos de lei que já haviam sido questionados pelo Judiciário, pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública e por outras entidades quando da sua primeira discussão. "Agora, novamente reedita algumas propostas que além de inconstitucionais, não salvam o Poder Executivo, mas quebram o Poder Judiciário. Um verdadeiro 'abraço do afogado'", disse.

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Estudo mostra benefícios dos incentivos no Estado

Por: Cláudia Schüffner

 

Em meio a uma grande pressão devido aos incentivos fiscais concedidos para empresas, o governo do Rio preparou um estudo mostrando os efeitos para 35 municípios que receberam empresas que tiveram direito aos benefícios. Todas foram contempladas por um conjunto de leis editadas em 2005 (no governo Rosinha), 2010 (Sérgio Cabral) e 2015 (Pezão). O estudo mostra que, entre 2004 e 2013, houve aumento da atividade industrial, com resultado superior ao da média estadual.

No período, dentro do conceito de valor adicionado bruto a preços correntes da indústria, houve crescimento de 333,4% nos municípios com incentivos. Já a média do Estado foi de 187,2%. "As críticas feitas têm escassez de análise econômica. Dizer que os benefícios não servem para nada e precisam acabar é um discurso vazio. O debate precisa ser um pouco mais eficiente", afirma João Gomes, assessor especial de estudos econômicos da secretaria estadual de Fazenda.

No Estado do Rio, 51 municípios são elegíveis para receber os investimentos com incentivos, mas em 16 deles não houve interesse por parte de empresas de se instalarem, por isso, apenas 35 fazem parte da análise.

A análise da arrecadação de ICMS e do Fundo Estadual de Combate à Pobreza e às Desigualdades Sociais (FECP) na indústria de transformação desses municípios destaca que houve crescimento na arrecadação dos impostos naqueles onde existe ao menos uma indústria beneficiada.

Desde que o Tribunal de Contas do Estado do Rio (TCE-RJ) publicou relatório mostrando que o Estado teria deixado de arrecadar R$ 185,85 bilhões de 2007 a 2015, a oposição vem fustigando o governo estadual.

Segundo o TCE, os R$ 185,8 bilhões são resultado da interpretação do artigo 14 da Lei de Responsabilidade Fiscal. Os benefícios são informados pelas empresas à Secretaria de Fazenda. O TCE admite que quando consideradas exclusões - onde são contabilizados benefícios concedidos por convênios, decretos e leis estaduais - a renúncia efetiva foi de R$ 47 bilhões no período.

A alegação é que elas atraíram empresas que não viriam para o estado caso não fossem dados incentivos fiscais. A assessoria de estudos econômicos contabiliza benefícios de R$ 129,845 bilhões entre 2008 e 2013, um período diferente do examinado pelo TCE (2007 a 2015).

Até agora os esclarecimentos não foram suficientes para evitar que no fim de outubro a 3ª Vara da Fazenda Pública do Rio aceitasse uma ação do Ministério Público Rio pedindo a proibição de novos benefícios fiscais ou financeiros até que o governo do Rio mostre estudos sobre o impacto das medidas. No mesmo mês o Tribunal de Justiça condenou o ex-governador Sérgio Cabral a ressarcir o Estado por créditos de R$ 1 bilhão concedidos à Michelin.

Em nota, Cabral disse que o incentivo "permitiu que essa empresa consolidasse todas as suas plantas fabris dentro do Estado e triplicou o pagamento de ICMS ao governo". A Michelin vai recorrer.