Título: ONU pede que Brasil julgue torturadores
Autor: Rizzo, Alana
Fonte: Correio Braziliense, 19/11/2011, Política, p. 4

Planalto sanciona Comissão da Verdade e Lei de Acesso à Informação, mas entidade cobra mais avanços contra os excessos da ditadura

No mesmo dia em que a presidente Dilma Rousseff sancionou a lei que cria a Comissão da Verdade, a comunidade internacional pressionou o Brasil por avanços mais claros na apuração dos crimes cometidos durante o regime militar. A alta comissária dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), Navi Pillay, pediu ontem "medidas adicionais para facilitar o julgamento dos supostos responsáveis por violações dos direitos humanos" durante a ditadura (1964-1985). Ela defendeu a revogação da Lei de Anistia de 1979 ou mesmo que o país declare a legislação inaplicável por impedir a investigação e desrespeitar a legislação internacional de Direitos Humanos. O assunto também foi tema de reportagem da revista britânica The Economist, que analisou o "atraso" brasileiro em solucionar os crimes cometidos pelos militares. Segundo especialistas ouvidos na matéria, o país, em comparação com os países vizinhos, tem sido lento em revisar esses crimes.

Pela nova lei, a comissão não terá poderes de punição nem responsabilização. A Comissão da Verdade será responsável por resgatar a memória e a história dos fatos ocorridos entre 1946 e 1988. O texto, negociado ainda na gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sustenta a natureza não persecutória da comissão e o respeito às leis atuais, inclusive a de anistia. "Hoje o Brasil se encontra enfim consigo mesmo, sem revanchismo, mas sem a cumplicidade do silêncio," disse a presidente Dilma Rousseff, durante a cerimônia em que sancionou a criação da comissão e a Lei de Acesso à Informação , que estabelece o fim do sigilo eterno dos documentos. "Essas duas leis tratam de assuntos distintos, mas estão diretamente ligadas uma a outra. São leis que representam um grande avanço institucional e um passo decisivo na consolidação da democracia brasileira", destacou a presidente. "O que era lei de sigilo se torna Lei de Acesso à Informação. E nenhum ato ou documento que atente contra os direitos humanos poderá ser colocado sob sigilo. Essa é uma conexão decisiva com a lei que cria a Comissão da Verdade. Uma não existe sem a outra", frisou Dilma.

Na presença dos comandantes das três Forças, a presidente evitou usar a trajetória pessoal como guerrilheira no discurso. No entanto, Dilma não deixou de homenagear companheiros da luta armada. A aprovação da Comissão da Verdade era um dos compromissos de Dilma, antes mesmo de assumir o cargo. Já como presidente, ela pediu aos ministros da Justiça, José Eduardo Cardozo; dos Direitos Humanos, Maria do Rosário; e então da Defesa, Nelson Jobim; que viabilizassem, de qualquer maneira, o projeto.

Aprovado no Congresso, o texto sofreu maior resistência dentro do próprio governo. E ainda ontem, o tema provocou polêmica. Antes do início da cerimônia, houve um "desentendimento" entre ministros e militares. Os representantes da caserna não queriam que familiares de mortos ou desaparecidos políticos discursassem no ato. O cerimonial acabou optando pela fala de Cardozo, e do presidente da Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, Marco Antônio Barbosa.