Temer mantém Geddel; Comissão de Ética investiga

Tânia Monteiro, Carla Araújo, Vera Rosa e Andrei Neto

22/11/2016

 

 

A Comissão de Ética Pública da Presidência da República voltou atrás e abriu processo, por unanimidade, para investigar se o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima, pressionou o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero para liberar a construção de um empreendimento em Salvador nos arredores de uma área tombada.

Geddel disse ter comprado um apartamento no prédio.

Apesar da denúncia, o presidente Michel Temer mandou o porta-voz Alexandre Parola anunciar que o ministro fica no cargo. A situação de Geddel, no entanto, é considerada “delicada” e há o receio de que novas acusações possam tornar insustentável a permanência do articulador político do governo.

A decisão da comissão foi tomada no fim do dia, após o conselheiro José Leite Saraiva Filho, indicado para o cargo pelo próprio Geddel, ter pedido vista do caso. Até então, 5 dos 7 integrantes do colegiado haviam dado aval para a abertura de investigação.

O pedido adiaria a definição do caso para 14 de dezembro, quando está prevista a próxima reunião do grupo.

O episódio repercutiu de forma negativa. Saraiva, que também é baiano, tomou posse na Comissão de Ética em 6 de setembro deste ano, nomeado já na gestão Temer. Geddel justificou que todas as nomeações passam por ele, que “a indicação foi da bancada de deputados baianos” e que “o antecessor de Saraiva também era baiano”.

Diante da polêmica, à tarde, o ministro telefonou não só para Saraiva, mas também para o presidente da Comissão, Mauro Menezes, pedindo “pressa” na avaliação do caso. Em nova discussão, Saraiva recuou e anunciou que votava favoravelmente à abertura da investigação, seguido pelo sétimo conselheiro, que não tinha anunciado ainda sua posição.

Geddel disse que não estava desconfortável com a decisão porque ele mesmo solicitou que o assunto não fosse adiado. O ministro foi notificado ontem e tem dez dias para enviar explicações à comissão. Caso o colegiado entenda que Geddel cometeu alguma infração ética, ele poderá ser advertido ou ter uma sugestão de pedido de demissão apresentada ao presidente da República. Cabe a Temer acatar ou não.

“Estou tranquilo, ainda que lamente e me desculpe pela repercussão”, disse Geddel ao Estado. 

‘Serpentário’. No sábado, ao saber das denúncias, o presidente disse a interlocutores estar “cansado de apanhar injustamente”. Embora Temer tenha tentado encerrar a polêmica, auxiliares defendem a saída do ministro.

Em Paris, o secretário executivo do Programa de Parcerias de Investimentos, Moreira Franco, disse que Temer está “muito preocupado” com as acusações e não garantiu a permanência do colega no governo. “O PMDB não se organizou para fazer delito”, afirmou ele. A declaração do ex-governador do Rio expôs o confronto no Planalto.

Na mira da Lava Jato, Moreira está há tempos em atrito com Geddel e com o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha.

Os três são considerados “homens fortes” do presidente e dão cotoveladas entre si, em busca de maior protagonismo. Nos bastidores, o Planalto é conhecido como “serpentário”, tamanho o grau da disputa que ocorre ali.

Moreira Franco não é, no entanto, o único a avaliar que a permanência de Geddel não está garantida e pode até ser uma solução para Temer. “Ele (Geddel) jogou no colo do governo uma crise que não precisava, numa semana que já tinha começado difícil e com a economia dando soluço”, disse um auxiliar do presidente.

Articulador político do Planalto com o Congresso, Geddel é quem está conduzindo, ao lado de Padilha, as negociações para a votação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita os gastos públicos por 20 anos.

A intenção de Temer é segurar no cargo, enquanto puder, seu amigo de quase 30 anos, até para evitar mais turbulências às vésperas da votação. Na prática, porém, tudo depende, mais uma vez, do que está por vir.

Oposição. Parlamentares do PT e do PCdoB protocolaram ontem na Procuradoria-Geral da República (PGR) um pedido de abertura de investigação contra o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima. A oposição quer que seja apurado se houve crime de concussão – ato de exigir vantagem indevida – e de advocacia administrativa, que consiste em patrocinar interesse pessoal perante a administração pública.

‘Limpando’

“O presidente teve uma semana para montar o governo (em razão do impeachment de Dilma Rousseff) (...) A vida é assim. Você vai limpando, selecionando.”

Marcos Pereira

MINISTRO DO DESENVOLVIMENTO, DURANTE FÓRUM ECONÔMICO EM PARIS.

 

O Estado de São Paulo, n. 44961, 22/11/2016. Política, p.A4