Sérgio Cabral nega acusações e contesta delatores

Julia Affonso, Mateus Coutinho, Ricardo Brandt e Fausto Macedo

22/11/2016

 

 

O ex-governador do Rio Sérgio Cabral (PMDB) negou em depoimento à Polícia Federal ter recebido propina durante a sua gestão no Estado e acusou delatores de mentirem ao relatarem cobrança de porcentagens sobre contratos de obras públicas, conforme apontaram as investigações da Operação Calicute.

O peemedebista é suspeito de receber 5% sobre grandes obras no Estado durante seus dois mandatos, de 2007 a 2014, como a reforma do Estádio do Maracanã, o Arco Metropolitano e o PAC das Favelas. Cabral foi delatado por executivos da Andrade Gutierrez e da Carioca Engenharia. O esquema, segundo o Ministério Público Federal, desviou R$ 224 milhões.

“O mesmo (Cabral) externou sua indignação com a situação e a afirmação dos delatores e que tem a consciência tranquila quanto as mentiras absurdas que lhe foram imputadas e que acredita na Justiça”, registra relatório sobre o depoimento do exgovernador concedido no dia da sua prisão, na quinta-feira passada.“ O declarante afirma que as declarações são inverídicas. Relata que acha que essas informações apresentadas nas delações dos retro mencionados foram para salvar as delações dos executivos da Andrade Gutierrez e Paulo Roberto Costa (ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás), desconhecendo tais fatos e sendo isso uma ‘mentira’.” No depoimento, Cabral também afirmou que sua amizade com Fernando Cavendish, dono da Delta Construções, acabou em 2012, quando a empresa foi considerada inidônea para firmar contratos com órgãos públicos.

“Ressalta que a Delta, antes mesmo de assumir como governador do Estado, em 2007, já era a maior contratante com os órgãos público municipais e estaduais”, disse Cabral.

Cavendish foi alvo da Operação Saqueador, em junho deste ano, e negocia acordo de delação premiada sobre supostos pagamentos de propinas a políticos.

Em um trecho da proposta de colaboração, o dono da Delta relata seu relacionamento com Cabral e desvios praticados para obter contratos de obras, como a reforma do Estádio do Maracanã, do Parque Aquático Maria Lenk, na Barra da Tijuca, realizado com dispensa de licitação, e da transposição do Rio Turvo.

Em outro trecho do depoimento, Cabral afirma que o atual governador do Rio, Luiz Fernando Pezão – que foi secretário e vicegovernador em sua gestão –, foi quem lhe apresentou o ex-secretário de Obras Hudson Braga, apontado pela Procuradoria como responsável por cobrar propina das empresas.

Segundo Cabral, Pezão foi o responsável, quando secretário, por iniciar a licitação de reforma do Maracanã para a Copa de 2014 – as obras de reforma do estádio são alvo da PF.

Procurado pela reportagem, o governo do Rio informou que não iria comentar o caso. 

Contas. Ao cumprir decisão judicial do juiz Sérgio Moro, da 13.ª Vara Criminal Federal de Curitiba, de bloquear valores dos investigados, o Banco Central encontrou R$ 10 milhões em apenas uma das contas bancárias pessoais da advogada, Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador. Já nas contas de seu escritório de advocacia, Ancelmo Advogados, foi encontrado R$ 1 milhão. Adriana foi levada pela PF para depor na quinta passada, mas liberada em seguida.

Nas contas pessoais de seu marido, por sua vez, foram encontrados R$ 454,26.

É a primeira vez, desde o início da Lava Jato, que o valor encontrado em apenas uma das contas bancárias de um investigado atinge o valor integral do bloqueio determinado.

 

Cartão. O Ministério Público Federal também identificou gastos totais de R$ 2,1 milhões no cartão de crédito do ex-secretário de Governo Wilson Carlos, apontado por delatores da Lava Jato como “operador administrativo” de Cabral, e de sua mulher.

As despesas, entre 2007 e 2015, o que daria uma média de R$ 19,5 mil por mês, chamou a atenção dos procuradores por, muitas vezes, extrapolar o rendimento declarado pelo casal no Imposto de Renda. No relatório, a Procuradoria aponta um gasto de US$ 416 com o aluguel de limusine em 2011. A força-tarefa da Lava Jato destacou também gastos com cosméticos, roupas e restaurantes.

Ontem, Moro converteu a prisão temporária de Wilson Carlos em custódia preventiva. O juiz acatou aceitou pedido da Procuradoria, que disse ver “risco à ordem pública” mantê-lo encarcerado. Ele é o único dos alvos da Calicute que esta preso em Curitiba.

Salvar

“Relata (Cabral) que essas informações foram para salvar as delações dos executivos da Andrade Gutierrez e Paulo Roberto Costa (ex-diretor de Abastecimento da Petrobrás).”

RELATÓRIO DA PF SOBRE O DEPOIMENTO DO EX-GOVERNADOR SÉRGIO CABRAL 

Coercitiva. Adriana Ancelmo, mulher de Cabral, deixa a PF após prestar depoimento.

 

O Estado de São Paulo, n. 44961, 22/11/2016. Política, p.A6