Renan busca aval de Temer a ações contra Judiciário

 

14/11/2016
Erich Decat

 

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), buscou respaldo político do Palácio do Planalto, da Câmara dos Deputados e do Tribunal de Contas da União (TCU) para as ações que tem levado adiante no Congresso Nacional contra o Poder Judiciário e o Ministério Público. As recentes movimentações de Renan foram o principal assunto de um encontro com o presidente Michel Temer, Rodrigo Maia (DEM-RJ), chefe da Câmara, e Aroldo Cedraz, presidente do órgão de fiscalização de contas.

Em almoço realizado anteontem na residência oficial do Senado, no qual foram servidos feijoada e caipirinha, participaram também o líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE); o secretário executivo do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Moreira Franco; o ex-presidente José Sarney; e outros dois ministros do TCU, Bruno Dantas e Vital do Rêgo Filho. Procuradas, as assessorias de Temer, Renan, Maia e dos demais convidados não retornaram.

O Estado apurou que Renan, que deixa a presidência do Senado em fevereiro, tratou do pente- fino que pretende fazer em “supersalários” de servidores do Judiciário e do MP e afirmou que deve anunciar nesta semana um novo relator para o projeto da Lei de Abuso de Autoridade, que, na prática, limita a atuação de investigadores. A proposta tem sido alvo de críticas da Lava Jato, que apura envolvimento de políticos do PT, PMDB e PP, entre outros partidos, no esquema de corrupção na Petrobrás.

Renan afirmou aos presentes que a comissão criada na quintafeira para investigar os contracheques de quem ganha acima do teto do funcionalismo vai “incomodar muito”. Ele citou como exemplo a ser investigado o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS), onde haveria significativo número de funcionários com altos rendimentos.

O presidente do Senado também apontou como contrassenso o fato de, atualmente, os magistrados receberem como pena máxima diante de infrações a aposentadoria compulsória.

Ele lembrou da decisão de terça- feira tomada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) contra a juíza Olga Regina de Souza Santiago, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Ela é acusada de envolvimento com narcotraficantes e recebeu a aposentadoria.

Em sua defesa, Olga tentou justificar o recebimento dos pagamentos alegando que um traficante teria se interessado pela sua casa de veraneio.

Presente nas conversas, Temer ouviu os interlocutores, mas não fez nenhum comentário a respeito. Apesar do silêncio do presidente, nas avaliações colocadas no encontro e em conversas entre integrantes da cúpula do Congresso, o entendimento é de que o avanço das investigações por parte da comissão servirá para mostrar as “mazelas” do Judiciário, em um momento em que vários setores da sociedade e os parlamentares discutem como implementar o teto dos gastos públicos.

Alguns dos presentes chegaram até a desafiar quem vai à comissão defender o pagamento de “supersalários”, estimados em até R$ 200 mil.

Em meio às argumentações de Renan, o presidente do TCU se colocou à disposição para ajudar no levantamento e cruzamento de dados dos supersalários.

O filho de Aroldo, o advogado Tiago Cedraz, é citado em depoimentos do empresário Ricardo Pessoa, dono da UTC Engenharia e um dos delatores da Lava Jato. Tiago alega que nunca patrocinou nenhum caso do grupo UTC perante o TCU.

 

Convite. Renan comunicou aos presentes sobre o convite que fará ao juiz Sérgio Moro, um dos principais responsáveis por conduzir a Lava Jato, para discutir o projeto que altera a Lei de Abuso de Autoridade. A proposta passou a ser defendida mais intensamente por Renan após ser deflagrada a Operação Métis, em que policiais federais fizeram busca e apreensão nas dependências do Senado, com autorização de um juiz federal. Integrantes da cúpula do Congresso consideram que Moro não vai se posicionar a favor de abusos cometidos por autoridades nem fazer da comissão um “palanque”.

Segundo presentes à reunião, apesar das críticas, Renan estava descontraído e chegou até a brincar com a escolha da senadora Kátia Abreu (PMDB-TO) para a relatoria da comissão. Segundo ele, não escolheu o futuro líder do governo, Romero Jucá (PMDB-RR), em razão de “a cota de coragem” do senador já ter se esgotado. Os dois peemedebistas constam hoje do rol de congressistas que são investigados na Operação Lava Jato e negam qualquer irregularidade em suas condutas.

 

Câmara. As conversas também trataram da sucessão na Câmara dos Deputados, prevista para fevereiro. Na frente de Maia, Renan ressaltou que vê legitimidade na tentativa do deputado em pleitear a reeleição.

 

PONTOS-CHAVE

Congresso resgata temas polêmicos

Anistia ao caixa 2

Deputados articulam livrar parlamentares e partidos que tenham cometido a irregularidade antes da aprovação da lei que discute criminalizar a prática.

 

Leniência

Deputados mobilizam a votação de projeto que extingue a punição penal a executivos de empresas acusadas de corrupção que fecharem acordo de leniência.

 

Abuso de autoridade

Renan Calheiros (PMDB-AL) desengavetou projeto que prevê punição para casos como o de publicidade de investigação antes de ação penal.

 

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Veto à transmissão de julgamento penal na TV Justiça vai à CCJ

 
14/11/2016

 

A Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara aprovou a proibição de a TV Justiça transmitir sessões do Supremo Tribunal Federal (STF) e dos demais tribunais superiores que envolvam o julgamento de processos penais e cíveis. A aprovação foi dada no momento em que um número considerável de deputados e senadores estão na mira da Lava Jato.

O texto aprovado na sexta-feira segue para a análise da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e, se referendado no órgão, não precisará de votação no plenário. A versão do Projeto de Lei 7.004/2013 é a do relatório do deputado Silas Câmara (PRB-AM). O texto original (Projeto de Lei 8.977/1995) é assinado pelo deputado Vicente Cândido (PT-SP).

No entendimento do autor da proposição, a transmissão ao vivo das sessões de julgamento é impeditiva do cumprimento dos preceitos jurídicos no Brasil, uma vez que “as entranhas da Justiça é que estão sendo mostradas com sensacionalismo exacerbado por parte de alguns ministros em particular”.

Câmara escreve no relatório que “o projeto visa a impedir a exibição das sessões dos tribunais superiores de modo a preservar a imagem, a honra e a dignidade da pessoa humana”.

Aos que defendem o acesso aos julgamentos via TV Justiça, o próprio relator trata de informar: “Ocorre que esses militantes da mídia livre se esquecem que a garantia de um julgamento isento e imparcial é um direito humano, que se sobrepõe ao direito de informação, ou seja, o interesse público não pode ser maior do que o direito a um julgamento isento”.

 

‘Covardia’. A contundência do relator também aparece no seguinte trecho: “O cidadão vem sendo condenado a priori e de maneira covarde pela superexposição na mídia, exposição esta que influencia, também, diretamente no resultado do julgamento per se, ao criar o que podemos chamar, ironicamente, de ‘afã condenatório’ por parte de membros do Poder Judiciário que tenham dificuldade em conter eventuais ‘arroubos’ de vaidade, provocados pela súbita notoriedade conferida pela mídia”.

O texto de Câmara prevê ainda que “qualquer pessoa que se sinta prejudicada por prática da concessionária de telecomunicações de TV a cabo poderá representar ao Executivo, independente de outras providências que venha a tomar nos âmbitos administrativo ou judicial”.

No entanto, o mesmo relatório isenta as mídias do Senado e da Câmara de qualquer tipo de cerceamento. “Cumpre externar ainda que o mesmo potencial lesivo não se aplica para mídias da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, uma vez que a natureza de seus conflitos e confrontos é política e a transparência midiática visa a ampliar ao máximo a participação democrática da população nas decisões que impactam o conjunto da sociedade brasileira, o que não se aplica no caso de julgamentos de pessoas nos tribunais superiores e na Corte Máxima do País.”

 

Relatório

“Militantes da mídia livre esquecem que o interesse público não pode ser maior do que o direito a um julgamento isento.”

Silas Câmara

DEPUTADO FEDERAL (PRB-AM)

 

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Até vaquejada motiva disputa entre Legislativo e STF

 
14/11/2016
Isabela Bonfim

 

Em mais um confronto com o Supremo Tribunal Federal (STF), o Congresso Nacional articula uma proposta para reverter a decisão da Corte que tornou a vaquejada ilegal no início de outubro. A reação parlamentar foi imediata e, na semana seguinte, quatro projetos com o objetivo de regulamentar a prática foram protocolados.

No início de novembro, em tramitação expressa, senadores aprovaram de forma simbólica a proposta que eleva vaquejadas e rodeios a manifestação cultural nacional. A matéria aguarda a sanção do presidente Michel Temer.

“Esse projeto é o primeiro passo para reverter o entendimento do Supremo”, disse o relator Otto Alencar (PSD-BA) logo após a votação na Comissão de Educação do Senado. Os parlamentares se mobilizaram e, poucas horas depois, aprovaram o projeto também no plenário. O próximo passo é aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que derrube definitivamente a decisão do STF.

A vaquejada remonta ao Nordeste do século 18, mas é praticada atualmente também no Centro-Oeste, Norte e interior de São Paulo. Na competição, o cavaleiro precisa derrubar um boi dentro da área demarcada, puxando o animal pelo rabo. Enquanto os parlamentares defendem que a prática faz parte da cultura do País, a interpretação do Supremo é de que a vaquejada causa sofrimento animal.

Os parlamentares evitam falar abertamente em confronto com o Judiciário, mas acreditam que houve um equívoco por parte do STF. A senadora Lídice da Mata (PSB-BA) critica o fato de a Corte não ter realizado nenhuma audiência pública sobre o tema.

Alencar defende que existem regras que prezam pelo bem-estar do boi. “A vaquejada profissional já não tem sofrimento animal, porque é usada uma cauda artificial, a pista tem um colchão de 50 centímetros de areia para amortecer a queda do boi e o cavalo não usa mais espora.” O projeto determina que não serão consideradas cruéis as manifestações culturais, desde que regulamentadas em lei específica que assegure o bem-estar dos animais. O texto vai ser relatado pelo presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), José Maranhão (PMDB-PB).

Na Câmara, o presidente Rodrigo Maia (DEM-RJ) se comprometeu a abrir uma comissão para discutir outra PEC, de autoria do deputado João Fernando Coutinho (PSB-PE), com o mesmo objetivo.

Os parlamentares argumentam que a vaquejada é uma atividade econômica próspera. De acordo com a Associação Brasileira de Vaquejada (ABVAQ), o setor movimenta em torno de R$ 600 milhões por ano e emprega 120 mil pessoas, além de 600 mil empregos indiretos.

 

O Estado de São Paulo, n. 44953, 14/11/2016. Política, p. A5