O Estado de São Paulo, n. 44966, 27/11/2016. Política, p. A4

Contra caixa 2, grupos já ensaiam 'Fora, Temer'

Líderes de movimentos pró-impeachment preparam volta às ruas e ameaçam presidente caso proposta de anistia avance na Câmara; a aliados, peemedebista diz que vetará

Por: Pedro Venceslau

 

Pedro Venceslau

 

Menos de três meses após o impeachment de Dilma Rousseff, grupos responsáveis pelas manifestações de rua ameaçam agora pedir a saída de Michel Temer caso ele sancione um eventual projeto de anistia ao caixa 2. Vem Pra Rua, Movimento Brasil Livre e Nas Ruas acusam o Planalto de condescendência com parlamentares que tentam descaracterizar o pacote anticorrupção em discussão na Câmara.

Os grupos se reunirão em um protesto pela primeira vez desde a destituição da petista no próximo dia 4, na Avenida Paulista, e o tema principal é o combate a uma eventual anistia.

O desgaste de Temer foi ampliado após as denúncias feitas pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, que levaram à queda de Geddel Vieira Lima da Secretaria de Governo. Principal articulador político do presidente, Geddel foi acusado de pressionar o colega para liberar a construção de uma obra em Salvador embargada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).

“A nossa palavra de ordem vai depender de como Temer agir.

Se passar na Câmara a anistia e ela for sancionada, vamos então pedir o ‘Fora, Temer’”, disse Carla Zambelli, líder dos Nas Ruas e uma das porta-vozes do Convergência, que reúne 40 movimentos em diferentes Estados.

Após a repercussão negativa da articulação na Câmara, aliados de Temer passaram a divulgar que o presidente vetará qualquer proposta de anistia que chegue ao Palácio do Planalto. Até então, o presidente vinha dizendo que respeita decisões do Congresso e chegou a sinalizar, em entrevista, que sancionaria o texto.

O Vem Pra Rua lançou nas redes sociais a hashtag #vetatemer e se aproximou do PSOL, partido de esquerda que combateu o impeachment de Dilma.

“Vamos apoiar fortemente ações como a do deputado Ivan Valente, do PSOL, que está pressionando para que a votação seja nominal. Estamos abertos para conversar com qualquer partido alinhado com a nossa causa. Por isso vamos parabenizá- lo”, disse Rogério Chequer, porta-voz do grupo.

Reduto de políticos tucanos e da antiga oposição, o Vem Pra Rua tem sido enfático. “Não vi o Temer se posicionar contra isso (anistia ao caixa 2). Gostaria de ouvir. Estamos de olho no Temer e no (deputado) André Moura (PSC-SE, líder do governo na Câmara). Estamos juntando evidências”, afirmou Chequer.

Segundo o ativista, o presidente terá uma dura decisão nas mãos.

“Temer vai ter que escolher se é a favor dos políticos corruptos ou está ao lado da sociedade”.

Além do veto, porém, para não arcar com o ônus, o presidente precisará articular sua base para que a decisão não seja derrubada na Câmara posteriormente.

Autores do pedido de impeachment de Dilma, a advogada Janaina Paschoal e o jurista Miguel Reale engrossam a pressão sobre Temer.

“Afirmo de maneira categórica que se esse projeto de anistia tiver andamento no Congresso e for sancionado pelo presidente, isso será uma situação inequívoca de quebra de decoro”, disse Janaina. Na semana passada, a advogada usou o Twitter para cobrar a demissão de Geddel.

Reale, por sua vez, avalia que ainda não há fato concreto para que se peça o impeachment de Temer, mas vê condescendência com a articulação pela anistia ao caixa 2.

“Há um imenso desgaste. O problema não é só sancionar (a anistia ao caixa 2), mas dar sinal verde para as tratativas. As notícias indicam que ele não vetaria.

Até agora, Temer não negou isso”, disse Reale.

 

PSDB. Os juristas e os grupos de rua também estão afinados na crítica aos partidos que apoiaram o impeachment, em especial o PSDB. “Alguns líderes do partido estão mudos. Vários membros estão indicados como envolvidos”, disse Reale.

“A posição do PSDB é lamentável. Será que querem assumir a Presidência em 2018 depois disso?”, questionou Chequer, ampliando as críticas.

 

Caiu antes...

Um dos líderes do MBL, Kim Kataguiri disse que a saída de Geddel Vieira Lima estava na pauta do movimento. “A gente iria para a rua pressionar pela saída do Geddel, mas ele se demitiu antes.”

 

MOVIMENTOS

Rogério Chequer, empresário e líder do Vem Pra Rua

‘Estamos de olho no Michel Temer’

Não vi o Temer se posicionar contra isso (a anistia à prática do caixa 2 articulada por deputados). Gostaria de ouvir. Estamos de olho no Temer e no (deputado) André Moura (PSCSE, líder do governo na Câmara). Estamos juntando evidências.

(...) Não há materialidade para o impeachment. Apesar disso, tudo pode acontecer. As coisas estão mudando muito rapidamente.

 

Janaina Paschoal, autora do pedido de impeachment

‘Se sancionado, será quebra de decoro’

Afirmo de maneira categórica que se esse projeto de anistia (ao caixa 2) tiver andamento no Congresso e for sancionada pelo presidente, isso será uma situação inequívoca de quebra de decoro. (...)Sobre episódio com o (ex-ministro da Cultura Marcelo) Calero, o presidente Temer tem que tomar cuidado para não adotar o estilo Dilma e achar que não é com ele.

 

Kim Kataguiri, coordenador do MBL

‘Não haverá clima para apoiar anistia’

Nossa ideia é gerar um engajamento na internet para que os deputados sintam que a manifestação, no dia 4, será grande e não haverá clima para apoiar nenhum tipo de anistia. Nossa principal bandeira é a defesa da Lava Jato. Ainda não há materialidade para o impeachment, mas dependendo do conteúdo da gravação do (ex-ministro da Cultura Marcelo) Calero e de novas revelações, pode haver .

 

Carla Zambelli, líder do movimento Nas Ruas

‘Vai depender de como Temer agir’

A nossa palavra de ordem vai depender de como Temer agir. Se passar na Câmara a anistia (ao caixa 2) e ela for sancionada, vamos então pedir o ‘Fora, Temer’.(...) Se o Temer não vetar a anistia, isso será uma interferência na Lava Jato. Ele prometeu em seu discurso de posse que não faria isso. Nosso tom será um pouco diferente (dos outros grupos).

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Oposição organiza série de atos por impeachment

Primeiro protesto está marcado para hoje, na Paulista; para líder do MTST, governo perdeu condição de continuar

Por: Ricardo Galhardo

 

Apagada desde a derrota histórica do PT nas eleições municipais de outubro, a bandeira do “Fora, Temer” reascendeu na esquerda com as acusações feitas pelo ex-ministro da Cultura Marcelo Calero contra Geddel Vieira Lima, que deixou a Secretaria de Governo, e o presidente Michel Temer.

Grupos como as frentes Povo Sem Medo, Brasil Popular, a União Nacional dos Estudantes (UNE), União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), além de movimentos de moradia, organizam uma série de manifestações pedindo o impeachment de Temer. Setores do PT e aliados do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva reforçam as articulações.

A primeira manifestação está marcada para hoje, às 15h, na Avenida Paulista, convocada pela Frente Povo Sem Medo.

Inicialmente, o ato tinha como pauta o repúdio à PEC do Teto e contaria com as participações de Lula, do ex-presidente do Uruguai José Pepe Mujica e do cantor Chico Buarque, mas eles desistiram. Agora, a pauta é o “Fora, Temer”.

“Com os últimos acontecimentos, ganha força a pauta da derrubada do governo. Entendemos que este governo perdeu a condição de continuar”, disse Guilherme Boulos, líder do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) e coordenador da Frente Povo Sem Medo.

A Frente Brasil Popular, que havia desistido de participar, agora está revendo sua posição.

Representantes da frente vão se reunir com o senador Lindbergh Farias hoje de manhã.

“Vamos avaliar a conjuntura e traçar uma estratégia com relação à possibilidade de impeachment de Temer”, disse Raimundo Bonfim, um dos coordenadores do grupo.

No dia 29, a UNE e a UBES pretendem reunir 25 mil estudantes nas ruas de Brasília. “A pauta central é a PEC do Teto, mas, sem dúvida, o ‘Fora, Temer’ renasceu”, disse Marianna Dias de Souza, da UNE.