O Estado de São Paulo, n. 44967, 28/11/2016. Política, p. A4

'Voz das ruas' motiva acordo para barrar anistia a caixa 2

Michel Temer, Renan e Maia anunciam ‘ajuste institucional’ entre o Executivo e o Legislativo para ‘desestimular’ a tramitação de qualquer proposta de perdão a crimes eleitorais

Por: Daiene Cardoso / Luísa Martins / Tânia Monteiro / Elizabeth Lopes

 

O presidente Michel Temer e os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), anunciaram ontem um “ajuste institucional” para “desestimular” a tramitação de qualquer proposta de anistia ao caixa 2 – que vinha sendo discutida pelos parlamentares no pacote das medidas contra a corrupção na Câmara.

Para justificar o anúncio decidido às pressas, em reunião realizada no sábado, Temer disse que o desejo de atender à “voz das ruas” é unanimidade entre os dirigentes do Executivo e Legislativo.

O Estado mostrou ontem que até mesmo grupos que apoiaram fortemente o impeachment de Dilma Rousseff (como o Vem Pra Rua e o Movimento Brasil Livre) estão dispostos a organizar manifestações pela saída do presidente caso a anistia seja aprovada pelo Congresso e sancionada pelo Planalto – em um raro momento de convergência com as bandeiras da oposição.

Os chefes dos poderes agiram para dar uma mensagem de compromisso com o combate à corrupção num momento em que o próprio presidente enfrenta questionamentos éticos, frente à polêmica envolvendo os ex-ministros Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo) e Marcelo Calero (Cultura).

Temer disse que a sanção de uma lei que perdoe políticos e partidos que praticaram caixa 2 é “impossível” e que a divulgação do acordo “desestimula qualquer movimento para fazer essa matéria tramitar”.

A possibilidade de aprovação de uma emenda que anistie crimes eleitorais virou tema de alto interesse de políticos ameaçados por sanções da Lava Jato e provocou forte reação de integrantes da força-tarefa como o juiz Sérgio Moro e os procuradores que atuam em Curitiba.

Houve grande reação também nas redes sociais e o governo identificou uma pressão popular crescente. A iminência das manifestações de rua preocupou o Planalto. No fim da semana passada, interlocutores do presidente passaram a divulgar que ele vetaria a anistia ao caixa 2 caso ela fosse aprovada no Congresso.

O presidente da Câmara foi um dos que mais se desgastaram no episódio. Enquanto Maia concedida entrevista em Brasília, um pequeno grupo de manifestantes protestou em frente ao condomínio onde ele mora, em São Conrado, zona sul do Rio de Janeiro. Eles gritaram palavras de ordem contra a anistia ao caixa 2 e em apoio ao pacote de medidas contra a corrupção.

Alguns vestiam camisetas com a foto do juiz Sérgio Moro.

 

Votação nominal. Maia sustentou que houve “confusão de comunicação” no debate sobre a anistia. “Nas discussões com os líderes, nossa intenção jamais foi anistiar crime.” Ele ressaltou que qualquer emenda polêmica que for apresentada durante a votação – prevista para amanhã – do pacote de combate à corrupção será submetida à votação nominal e não simbólica. “É isso que a sociedade exige e com razão.” Renan reiterou o acordo “institucional” para que a anistia a crime eleitoral não seja apreciada.

Segundo ele, cabe ao Congresso fazer qualquer anistia. “Tanto que acabamos de fazer uma de repatriação, mas para melhorar o caixa do Tesouro”, disse, destacando que isso não ocorrerá com o caixa 2. “Temos outras prioridades para o Brasil. Estamos fazendo o ajuste fiscal e vamos votar matérias econômicas que são prioritárias para retomar o crescimento da economia.” /COLABOROU ROBERTA PENNAFORT

 

Fileira. Rodrigo Maia, Renan Calheiros e Michel Temer chegam para a coletiva de imprensa

 

POVO

“Verificamos que era preciso atender àquilo que se chama voz das ruas (...) O poder é do povo. Então, quando o povo se manifesta, esta audiência há de ser tomada pelo Poder Legislativo e igualmente pelo Poder Executivo.”

Michel Temer

PRESIDENTE DA REPÚBLICA

 

Ameniza

A percepção no Planalto é a de que a saída de Geddel Vieira de Lima do governo ameniza, mas não acaba com a crise política, que contamina a recuperação da economia.

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Vacinas do governo

Por: Vera Rosa

 

 

O anúncio do presidente Michel Temer de que seria impossível sancionar uma emenda para anistiar o caixa 2 eleitoral, caso a proposta seja aprovada pelo Congresso, marca o início de uma nova estratégia de comunicação do Palácio do Planalto. Com a imagem desgastada pela crise política, Temer foi aconselhado por sua equipe a dar respostas imediatas a temas que vêm minando cada vez mais a avaliação do governo. Nos bastidores, o diagnóstico é o de que, até agora, o presidente virou refém da agenda negativa.

Nos constantes monitoramentos das redes sociais, a Secretaria de Comunicação (Secom) constatou que a ideia de embutir a anistia ao caixa 2 no pacote anticorrupção tem potencial de causar estrago ainda maior para o Planalto. Foi então que Temer decidiu, em conjunto com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) – todos eles pressionados por reações da sociedade –, anunciar um acordo institucional no sentido de barrar qualquer movimento para perdoar quem cometeu crime de caixa 2.

Sob o risco do ressurgimento das manifestações de rua, em defesa do “Fora, Temer”, o presidente resolveu lançar vacinas para blindar o governo e, na tentativa de mostrar que não é conivente com falcatruas, admitiu a possibilidade de solicitar ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI) que grave todas as suas audiências públicas. A ideia de criar uma espécie de “gabinete de portas abertas” faz parte da nova política de comunicação do governo, montada depois que o Planalto foi informado de que o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero gravou conversas no Planalto.

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Deputados querem limite para investigar políticos

Por: Daiene Cardoso / Isadora Peron / Igor Gadelha

 

Apesar da intenção do Executivo e Legislativo de tentar barrar a anistia ao caixa 2, há outros itens na lista de iniciativas dos congressistas com bondades à classe política. Os parlamentares articulam, por exemplo, trazer de volta uma proposta que foi retirada do relatório aprovado na semana passada na comissão especial: a limitação para seis meses do período de investigação de crimes praticados por políticos com mandatos eletivos.

A votação do pacote no plenário da Câmara está marcada para amanhã.

A proposta, que vem sendo chamada de “emenda Amin”, por ser de autoria do deputado Esperidião Amin (PP-SC), estabelece que a Polícia Federal e o Ministério Público teriam esse prazo para apurar atos ilícitos praticados por parlamentares, prefeitos, governadores e presidente da República. Esse tempo poderia ser prorrogado por mais seis meses, desde que haja autorização judicial. Se o processo não fosse concluído nesse tempo, o caso seria arquivado e a autoridade responsável seria obrigada a apresentar um relatório explicando as diligências efetuadas e as possíveis razões pelas quais a investigação foi frustrada. Caso a denúncia fosse apresentada, o texto prevê que um novo prazo para o procedimento investigatório seria aberto.

Nos bastidores, os deputados alegam que a medida é necessária porque os agentes públicos ficam expostos diante das denúncias, sofrendo desgaste político, sem que haja um prazo definido para que as acusações sejam esclarecidas. O próprio autor da emenda reconheceu, porém, que a medida favorece políticos que são culpados, que farão de tudo para atrasar a investigação, embora ajude aqueles que são inocentes, que poderão ter sua inocência provada mais rápido. Grandes partidos apoiam a iniciativa. / D.C., ISADORA PERON e IGOR GADELHA

 

Reação

Outro item que deve voltar à discussão é o que estabelece crime de responsabilidade para magistrados e membros do MP. A proposta é interpretada como reação dos parlamentares à Lava Jato