O Estado de São Paulo, n. 44955, 16/11/2016. Política, p. A7
Para auditores, crise na Receita afeta a Lava Jato
Chefe da área de Inteligência do órgão envia carta à força-tarefa com apelo contra risco de ‘ingerência política’ em projeto de lei que altera funções do cargo
Por: Julia Affonso / Mateus Coutinho / Ricardo Brandt / Fausto Macedo
Auditores fiscais da área de Inteligência da Receita Federal em Curitiba, que atuam no âmbito da Lava Jato dentro da instituição, enviaram carta ao comando da força-tarefa da operação com alerta contra o que chamam de “ingerências políticas” que, segundo eles.
podem comprometer a continuidade das investigações.
No texto enviado ao procurador da República Deltan Dallagnol, um dos coordenadores da força-tarefa do Ministério Público Federal na Lava Jato, Roberto Leonel de Oliveira Lima fala do impacto causado em sua instituição pelo substitutivo do Projeto de Lei 5864/2016 que, na avaliação dos auditores, põe sob ameaça prerrogativas da classe e levará ao “desmonte” da Receita.
Ele comanda o Escritório de Pesquisa e Investigação da 9.ª Região Fiscal, sediada em Curitiba.
Cabe à essa área de Inteligência da Receita todo o levantamento técnico-contábil da operação.
A versão do PL sobre a carreira dos auditores aprovada na semana passada em comissão da Câmara dos Deputados, segundo o grupo, atenta contra o alcance dos trabalhos da Receita no âmbito da operação ao garantir a analistas as mesmas prerrogativas dadas aos auditores. Para eles, há o risco de abrir a Receita para indicações políticas.
Na carta a Dallagnol, Roberto Leonel pede “apoio dessa força- tarefa para que a Receita continue a ser órgão de Estado, com eficiência gerencial e sem eventuais ingerências políticas”.
O auditor pede, ainda, incentivo da entidade de classe de Dallagnol, a Associação Nacional dos Procuradores da República, na luta a ser travada na Câmara para resgatar o texto original do projeto de lei.
Na quarta-feira passada, como revelou a Coluna do Estadão, um bloco de 57 fiscais ameaçou renunciar a cargos estratégicos que ocupam na 8.ª Região (São Paulo), a que mais arrecada tributos em todo o País, cerca de R$ 500 bilhões por ano. Na sexta, a mobilização ganhou adesão de 400 auditores em postos de comando da Receita. Segundo Roberto Leonel, a crise na Receita vai afetar a Lava Jato.
De acordo com ele, o texto do relator Wellington Roberto (PR-PB) – que alterou a versão pactuada entre o Executivo e os servidores da Receita – “pode gerar ineficiência ou confusão na execução dos processos de trabalho”.
“Em sentido contrário ao previsto no projeto de lei original, que é apoiado pela administração da Receita e foi elaborado com o governo federal, vê-se no substitutivo aprovado uma mitigação do alcance da denominação Autoridade Tributária e Aduaneira da União, histórica e umbilicalmente ligada ao cargo de auditor fiscal, o qual sempre desenvolveu atividades de elevada complexidade”, assinala.
Alcance
“Vê-se no substitutivo aprovado uma mitigação do alcance da denominação Autoridade Tributária e Aduaneira da União.”
Roberto Leonel de Oliveira Lima
CHEFE NA 9ª REGIÃO FISCAL DA RECEITA
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Por: Jamil Chade / Beatriz Bulla / Fábio Serapião
Um dos principais responsáveis pelo Setor de Operações Estruturadas – conhecido como o “departamento de propinas da Odebrecht” – voltou ao Brasil de forma “voluntária” para negociar um acordo de delação premiada meses após ser preso na Suíça. Fernando Miggliaccio da Silva, ex-executivo do grupo, foi considerado tanto em Berna quanto em Brasília uma peçachave no esquema de propinas montado pela empreiteira.
Sua prisão e seu retorno aceleraram outros acordos de delação premiada entre os executivos da construtora. Em menos de três meses, ele foi interrogado no país europeu em pelo menos oito ocasiões.
Com a Operação Lava Jato em curso, o executivo se mudou para os Estados Unidos, no segundo semestre de 2014, com apoio financeiro do grupo Odebrecht.
Em fevereiro deste ano, porém, ele foi preso na Suíça sob a “forte suspeita” de corrupção e ao tentar esvaziar contas.
Migliaccio voltou ao Brasil após negociar o acordo de delação premiada. Na 35.ª fase da Lava Jato, em setembro deste ano, o executivo foi denunciado por lavagem de dinheiro. “O empregado da Odebrecht que foi preso na Suíça retornou voluntariamente ao seu país, depois de ser liberado de prisão”, indicou o Ministério Público da Suíça.
A Procuradoria do país europeu pediu a colaboração oficial do Panamá nas investigações.
O ex-executivo da Odebrecht seria o administrador de uma conta por onde cerca de US$ 50 milhões teriam passado para pagar propinas.
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Por: Fábio Fabrini
Depois de apontado pelo ex-gerente de Relações Institucionais da Camargo Corrêa Gustavo da Costa Marques como um dos operadores de propinas ao senador e ex-ministro Edson Lobão (PMDB-MA), o empresário Rodrigo Brito iniciou tratativas para um acordo de colaboração com investigadores da Lava Jato. O Estado apurou que ele pretende prestar novo depoimento a ser prestado à Polícia Federal.
Rodrigo é filho de Fernando Brito, dono da AP Energy Engenharia e Montagem, que, segundo as investigações, foi usada pela Camargo para intermediar pagamento de ao menos R$ 2 milhões a Lobão, em suborno referente às obras de Belo Monte.
Como revelou o Estado ontem, Marques, que também colabora com a Lava Jato, afirmou à PF ter omitido informações em dois depoimentos para seguir “versão estabelecida” pela empreiteira.
O advogado de Rodrigo Brito, Daniel Bialski, disse que não poderia comentar o caso, pois ele é sigiloso. A defesa de Lobão nega irregularidades. / FÁBIO FABRINI