O Estado de São Paulo, n. 44969, 30/11/2016. Economia, p. B3


Reforma do INSS prevê fim de isenções e contribuição rural

 
Alexa Salomão

 

A reforma da Previdência não vai se limitar a conter despesas. Uma parte dela inclui medidas para incrementar a receita. Entre os setores que vão ser chamados a contribuir está a cadeia do agronegócio, desde as empresas exportadoras até o pequeno produtor rural. Parte das medidas, porém, não vai constar da espinha dorsal da reforma, que seguirá para o Congresso como Proposta de Emenda Constitucional (PEC).

O governo vai tentar melhorar a arrecadação com medidas em paralelo: rever desonerações, criar uma contribuição previdenciária para empresas do Simples e rever isenções, como a de entidades sem fins lucrativos.

O presidente Michel Temer já avaliou as principais medidas da reforma. Inicialmente, a proposta é que o texto seria encaminhada ao Congresso nesta semana, mas algumas definições jurídicas podem jogar o encaminhamento oficial para semana que vem ou até para a outra.

Hoje, a contribuição previdenciária varia por setor e por porte de empresa. Há isenções ou cobranças ínfimas para algumas atividades e categorias profissionais.

O princípio é fazer a “convergência” das regras, para que todos contribuam. Nesse espírito, o papel do agronegócio é considerado essencial.

 

Rombo. No ano passado, as contribuições rurais somaram R$ 7,3 bilhões, mas a despesa do segmento foi de R$ 102 bilhões, o que resultou num rombo de quase R$ 95 bilhões. Uma boa parte das empresas do setor contribui com 2,5% sobre o faturamento, e não sobre a folha.

No caso do produtor, a retenção previdenciária deveria ser feita por quem compra as suas mercadorias, mas uma decisão do Supremo Tribunal Federal considerou a cobrança inconstitucional.

Equalizar as regras no setor é considerado prioridade.

Em paralelo, como medida de apoio à reforma, o governo negocia com entidades empresariais e de trabalhadores o fim da desoneração da folha de pagamentos.

Ela reduziu a arrecadação previdenciária em R$ 18 bilhões e jogou a conta para o Tesouro. Como o ambiente é de recessão, o governo busca uma saída caso a caso, para não piorar a situação do setor privado, mas quer rever o benefício.

Também por causa da crise, o governo decidiu não incluir na reforma em si a revisão de uma série de “leniências” com a Previdência, mas não descarta a possibilidade de realizar mudanças à medida que economia melhore.

Entre as alterações consideradas pertinentes estão a criação de uma contribuição previdenciária para as micro e pequenas empresas. Subordinadas ao Simples, elas pagam a contribuição previdenciária aglutinada a uma série de outros tributos, com descontos. Também podem ser reavaliadas isenções, como as dadas ao microempreendedor individual (MEI) e a instituições filantrópicas e sem fins lucrativos. Procurada para comentar as medidas, a Secretaria de Previdência não respondeu até o fechamento desta edição.

 

PARA ENTENDER

O porquê da reforma

Com cerca de 29 milhões de beneficiários, a Previdência pagou benefícios de R$ 413,5 bilhões até outubro este ano, ou 41,6% de todas as despesas do Tesouro. Essas despesas representam mais que o dobro das despesas com pessoal e encargos sociais, de R$ 205 bilhões neste ano. Para pagar a conta salgada, o INSS não dispõe de receitas suficientes. Além de serem estruturalmente deficitárias, as contas previdenciárias não terão alívio enquanto o desemprego estiver crescendo, a renda formal dos trabalhadores continuar caindo e a economia não sair da recessão.

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Senado terá órgão para monitorar contas públicas

 
Alexa Salomão

 

Para combater a maquiagem contábil que levou à crise fiscal brasileira, o Senado Federal instala hoje a Instituição Fiscal Independente (IFI), órgão que terá a função de monitorar o desempenho orçamentário e fazer contraponto aos números das contas públicas divulgados pelo governo. O órgão será chefiado pelo economista Felipe Salto, que teve sua indicação aprovada pela comissão diretora do Senado após uma sabatina comandada pelo presidente da Casa, Renan Calheiros.

A proposta de criação da IFI surgiu no ano passado, em meio ao debate sobre as pedaladas fiscais, como ficaram conhecidos os atrasos nos pagamentos de dívidas do governo com os bancos públicos que levaram ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.

Com a instalação do IFI, o Brasil vai integrar um grupo de 28 países que já possuem órgãos independentes, a maior parte deles vinculado ao Legislativo. É o caso do CBO (Congressional Budget Office, na sigla em inglês) dos EUA, criado em 1974 e que realiza análises independentes sobre a sustentabilidade fiscal a longo prazo. Em outros países, são vinculadas ao Executivo ou a órgãos de controle.

A criação desse tipo de instituição pelos países cresceu depois da crise financeira internacional de 2008. Canadá, Austrália e Itália são alguns dos países que criaram suas IFIs mais recentemente.

Durante a sabatina, Salto destacou que a IFI terá a missão de trazer mais luz para as contas públicas. “A relevância de um órgão independente com as características da IFI fica ainda mais evidente diante da profunda crise econômica e fiscal vivida pelo Brasil”, afirmou o economista, atualmente assessor parlamentar do gabinete do senador José Aníbal (PSDB-SP). Salto foi indicado por Calheiros com apoio do senador licenciado e atual ministro das Relações Exteriores, José Serra.

A despeito da indicação tucana, Salto, especialista em contabilidade pública, disse que a instituição terá atuação apartidária e plural. Ele fez questão de destacar durante a audiência no Senado que a atuação da IFI não terá intersecção com a atividade dos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU). / A.F.