O Estado de São Paulo, n. 44950, 11/11/2016. Política, p. A4

Câmara resiste à proposta que reduz nº de partidos

 
Daiene Cardoso
Erich Decat

 

A reforma política aprovada em primeiro turno no Senado terá dificuldades para avançar quando chegar à Câmara. Parte da Casa rechaça a proposta e já articula para engavetá-la. Deputados dizem que para aprovar a medida vão promover mudanças significativas no texto. O principal ponto de insatisfação é a cláusula de barreira, que, na prática, pretende limitar o número de partidos no País.

Atualmente, são 35 legendas – 28 com representação no Congresso.

A Proposta de Emenda à Constituição aprovada anteontem pelos senadores, em comparação com os resultados das eleições de 2014, reduziria a apenas 16 o número de partidos hoje.

No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), estão em processo de criação mais 29 siglas.

Deputados afirmam que a proposta vai limitar a representatividade, em especial a dos partidos pequenos, e reclamam que grandes legendas culpam os “nanicos” pela dificuldade em se obter a estabilidade política. “As mazelas da política não estão localizadas nos partidos pequenos.

É falsa a ideia de que os pequenos dificultam a governabilidade”, disse o líder do PCdoB na Câmara, Daniel Almeida (BA).

A legenda, com 11 deputados, vai trabalhar para barrar a reforma.

Na avaliação de Almeida, a proposta cria deputados “de segunda e terceira categorias”.

O PCdoB não estará sozinho.

O PT, que originalmente era a favor da cláusula de barreira e do fim das coligações, já admite rever sua posição. “Na bancada é muito forte o respeito ao PCdoB, à Rede e ao PSOL. Isso vai ser rediscutido porque a mudança do cenário é muito brusca”, afirmou o líder Afonso Florence (BA).

 

Propostas. Entre as alterações “bruscas”, como afirmou Florence, está a exigência de os partidos conseguir ao menos 2% dos votos válidos em 14 unidades da Federação em 2018. Se não atingir o desempenho, as siglas não poderão ter assento no Congresso nem acesso ao Fundo Partidário e ao tempo de rádio e TV. A PEC ainda prevê o fim das coligações proporcionais e permite a união das legendas em federações.

Com 58 deputados em sua bancada, Florence disse que será difícil a aprovação da PEC na Câmara do jeito que está. O líder do PROS, Ronaldo Fonseca (DF), endossou a crítica do petista: “Sabe quando vai passar na Câmara? Só no próximo século”.

Com seis deputados na bancada, Fonseca destacou que a cláusula de barreira já foi considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e afirmou que a reforma aprovada no Senado é “piada”.

Parlamentares se queixam da origem da proposta e alegam que o correto seria a Câmara enviá- la aos senadores. A preocupação na Casa é que as medidas aprovadas atingem diretamente a eleição de deputados, por ser disputa proporcional. “Nenhuma regra os atinge. Então, não dá para agradar aos senhores senadores”, afirmou o líder do PTB, Jovair Arantes (GO). A legenda tem 18 deputados.

 

Mudanças. Parte das siglas aceita discutir a PEC na Câmara, mas já avisa que serão feitos ajustes. “A gente vai trabalhar para aprovar mudanças, mas elas não podem acontecer da noite para o dia”, afirmou o líder do PRB, Márcio Marinho (BA). Da forma como foi aprovada, considerou o deputado, os pequenos e médios partidos “sucumbirão”.

Segundo Marinho, o PRB, com 22 deputados, vai recomendar alterações na cláusula de barreira e no tempo de aplicação da regra, para que os partidos se organizem.

A Rede, com quatro deputados, vai reunir a direção do partido para discutir propostas de alterações na reforma política.

Durante as discussões no plenário do Senado anteontem, o próprio autor da proposta, o presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), já admitira que o texto poderia ser alterado.

Presidentes de outros partidos também reconhecem a atuação dos deputados na matéria aprovada pelos senadores.

“Não vejo problema na proposta, mas ela vai mexer com todo o sistema eleitoral. Deverá haver algumas mudanças, acho que com relação ao fim das coligações.

Já no caso da cláusula de barreira é mais fácil, existirão federações”, afirmou o presidente do DEM, senador Agripino Maia (RN). A sigla tem 28 deputados.

Antônio Carlos Rodrigues, presidente do PR, disse que o partido ainda não discutiu a reforma política. “Acredito que o projeto do Senado avance, mas sofrerá grandes alterações pela Câmara”, afirmou o dirigente.

O PR é representado por 42 deputados na Casa.

A PEC deverá ser votada em segundo turno no Senado no dia 23 deste mês e só depois seguirá para a Câmara.

 

Mazelas

“As mazelas da política não estão localizadas nos partidos pequenos. É falsa a ideia de que os pequenos dificultam a governabilidade.”

Daniel Almeida (BA)

LÍDER DO PCDOB NA CÂMARA

 

A PROPOSTA

Cláusula de barreira ou de desempenho

Limita o acesso às verbas do Fundo Partidário e tempo de rádio e TV para partidos que não atingirem o mínimo de votos. A partir de 2018, a cláusula será aplicada aos partidos que não atingirem pelo menos 2% dos votos válidos do País nas eleições para a Câmara, distribuídos em ao menos 14 unidades da Federação, com um mínimo de 2% dos votos válidos em cada um. A partir das eleições de 2022, o mínimo passa a ser de 3% dos votos;

 

Fim de coligações partidárias

São extintas as alianças entre partidos para as eleições a partir de 2020. É válida para as eleições proporcionais de vereadores e deputados. Assim, um candidato com elevado número de votos deixaria de eleger os candidatos da coligação que não obtiveram número significativo de votos;

 

Federação partidária

Os partidos poderão se unir para formar federações e ter atuação parlamentar conjunta.

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Senado agora deve analisar fim da reeleição

 

Isabela Bonfim
Erich Decat

 

Após a aprovação, anteontem, em primeiro turno da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata de pontos da reforma política, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL) disse que outros aspectos da reforma podem ser analisados pelo Senado ainda neste ano. Um deles seria o fim da reeleição para cargos do Executivo, como prefeito, governador e presidente da República.

O texto aprovado no Senado trata apenas do fim das coligações proporcionais, mecanismo que permitir “puxar” deputado pelos votos da coligação, e a criação de uma cláusula de barreira, que tem por objetivo diminuir a quantidade de partidos políticos. A intenção de Renan é de que o texto não receba emendas e, assim, seja aprovado da mesma forma na votação em segundo turno.

Mas dada a facilidade de aprovação e o apoio político da proposta, até mesmo entre alguns senadores da oposição, o presidente do Senado já quer adiantar a discussão de outros pontos da reforma política.

“É muito importante que, na quarta-feira, para além do que aprovamos e do segundo turno que vamos aprovar, que estabeleçamos outros pontos da reforma política que serão votados até o final do ano legislativo”, afirmou Renan.