O Estado de São Paulo, n. 44947, 08/11/2016. Economia, p. B4

Bolsa Família é cancelado para 469 mil

Governo encontra mais de 1,1 milhão de beneficiários irregulares e bloqueia saque de 654 mil até que seja comprovado que são regulares

Por: Luísa Martins

 

Um pente-fino feito com base em um grande cruzamento de dados do governo federal levou o Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário (MDSA) a cancelar 469 mil benefícios do Bolsa Família e bloquear o saque de outras 654 mil famílias beneficiárias.

Em ambos os casos – mais de 1,1 milhão –, há suspeita de que a renda per capita seja superior ao teto exigido para ingresso e permanência no programa.

Apuradas nos últimos quatro meses, as irregularidades representam 8% do total de famílias favorecidas pelo Bolsa Família, que, em setembro, complementou a renda de 13,9 milhões. O governo estima que a triagem gere economia anual de R$ 2,4 bilhões caso todas as inconsistências sejam confirmadas – mais de 8% (R$ 203 milhões) já na folha de novembro.

O ministro Osmar Terra assegura que o objetivo “não é economizar recursos, mas focalizar o programa para que ele não seja contaminado pelo uso inadequado de dinheiro público”.

Os valores referentes aos benefícios que deixarão de ser pagos pelo governo devem entrar no orçamento do Bolsa Família em 2017. “Não é corte, é controle dos gastos públicos”, afirmou.

Quem teve o benefício bloqueado ou cancelado será comunicado e terá três meses para se explicar nos Centros de Referência da Assistência Social (Cras) de seu município, munidos de documentação que demonstre renda per capita mensal entre R$ 85,01 e R$ 170 – requisitos para ter direito ao Bolsa Família.

Se for comprovado que as famílias estão legais e que o sistema errou, voltarão a receber a mensalidade (com retroativo).

Além dos contratos bloqueados e cancelados, mais 1,4 milhão de famílias vão ser intimadas por carta, a partir de janeiro, para atualizarem seus cadastros, sem perda do benefício nesse meio tempo.

Além disso, segundo dados segundo dados obtidos com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Tribunal de Contas da União (TCU), outras 3 mil famílias que fizeram doações a campanhas eleitorais neste ano estão impedidas de sacar o valor mensal.

As suspeitas das irregularidades no cadastro do Bolsa Família foram levantadas pelo cruzamento que considerou seis bases de dados: o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ), o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), o Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos (Siape), o Sistema de Controle de Óbitos (Sisobi) e a Relação Anual de Informações Sociais (Rais).

O Estado apurou que houve casos de beneficiários cujo CNPJ associado era referente a uma empresa de porte médio, por exemplo.

O ministério informou que o pente-fino deverá se tornar uma prática mensal. “O objetivo é separar o joio do trigo.

Quem realmente precisa, vai continuar recebendo o benefício”, disse Terra.

 

Região.Os municípios com maior número relativo de benefícios cancelados são Treviso (SC), Picada Café (RS) e Vargem Bonita (SC). Já as cidades que mais tiveram contratos bloqueados também são da Região Sul: Lacerdópolis (SC), Montauri (RS) e Poço das Antas (RS). O secretário executivo do ministério, Alberto Beltrame, justifica que a região tem economia mais aquecida, tornando mais viável a mobilidade social – pessoas que eram consideradas pobres ou extremamente pobres podem mais facilmente melhorar de vida e deixar de fazer parte desses grupos.

Em números absolutos, São Paulo (SP) lidera como a cidade onde mais benefícios foram bloqueados ou cancelados, seguida pelo Rio de Janeiro (RJ).

 

“Não é economizar recursos (...) não é corte, é controle de gastos.”

Osmar Terra, ministro do Desenvolvimento Social e Agrário

 

PRESTE ATENÇÃO

1.Quem tem direito. O Bolsa Família é um programa do governo federal destinado a famílias que comprovadamente tenham renda per capita mensal entre R$ 85,01 e R$ 170.

2. Cadastro. Além dos contratos bloqueados e cancelados, mais 1,4 milhão de famílias vão ser intimadas por carta, a partir de janeiro, para atualizarem seus cadastros, sem perda do benefício nesse meio tempo.

3. Cruzamento de dados. As suspeitas foram levantadas pelo cruzamento as informações de seis bases de dados: Caged, CNPJ, INSS, Sistema Integrado de Administração de Recursos Humanos, Sistema de Controle de Óbitos e a Relação Anual de Informações Sociais.

 

BOLSA FAMÍLIA

Municípios com maior número relativo

De cancelamentos

TREVISO (SC) -25,93

PICADA CAFÉ (RS) -23,08

VARGEM BONITA (SC) - 18,89

ITAIPULÂNDIA (PR) - 16,62

MUÇUM (RS) -16,42

SANTA ERNESTINA (SP) -16,35

JUMIRIM (SP) -15,87

PRESIDENTE LUCENA (RS) -15,38

COCAL DO SUL (SC) -15,33

NOVA ERECHIM (SC) -15,28

 

De bloqueios

LACERDÓPOLIS (SC) -36,36

MONTAURI (RS) -33,33

POÇO DAS ANTAS (RS) -33,33

SERRA ALTA (SC) -23,08

MARZAGÃO (GO) -21,97

D. PEDRO DE ALCÂNTARA (RS) -20,37

FERNANDO DE NORONHA (PE) -20,00

UNIÃO PAULISTA (SP) -20,00

LINHA NOVA (RS) - 20,00

PIRATUBA (SC) - 19,57

 

469 mil

BENEFÍCIOS CANCELADOS (R$ 440 OU MAIS DE RENDA PER CAPITA)

 

654 mil

BENEFÍCIOS BLOQUEADOS (ENTRE R$ 170 E R$ 439 DE RENDA PER CAPITA)

 

1,4 milhão

DE FAMÍLIAS CONVOCADAS A SE EXPLICAR (ATÉ R$ 169 DE RENDA PER CAPITA)