O Estado de São Paulo, n. 44948, 09/11/2016. Política, p. A4

Odebrecht negocia acordo com EUA, Suíça e Brasil

Empresa é suspeita de pagar propina a políticos e agentes públicos em uma dezena de países onde tem negócios; multas de leniência podem chegar a R$ 6 bi

Por: Jamil Chade

 

Prestes a assinar o termo da colaboração com a Operação Lava Jato no Brasil, a Odebrecht negocia também um acordo de leniência com os Estados Unidos e a Suíça. As investigações apontam para a suspeita de pagamento de propinas a funcionários públicos e políticos para financiar campanhas eleitorais em uma dezena de países. As tratativas envolvem autoridades brasileiras, americanas e suíças e devem resultar no maior acordo de leniência da história.

O Estado apurou que já estariam sob investigação suspeitas de pagamentos ilícitos em troca de contratos para a execução de obras em El Salvador, Panamá, Venezuela, Equador e Peru, além das denúncias em apuração no Brasil. Na Suíça, o crime seria o de lavagem de dinheiro cometido com a movimentação de milhões de dólares por meio de quatro empresas de fachada.

Fontes próximas ao caso em Genebra indicam que o valor total das multas está estimado entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões.

No entanto, o montante pode oscilar em razão dos acordos que serão estabelecidos e, principalmente, a depender do que ainda pode ser descoberto. O objetivo da construtora, ao lado da delação de 53 executivos no Brasil, é buscar a leniência, com pagamento de multas bilionárias também no exterior, na tentativa de garantir a sobrevida dos negócios.

Até hoje, o maior valor de um acordo de leniência foi assinado entre a Siemens e governos dos Estados Unidos e da Europa.

No total, a empresa alemã desembolsou US$ 1,6 bilhão. A francesa Alstom pagou US$ 770 milhões em outro acordo, também envolvendo corrupção em países emergentes. Na Lava Jato, a holandesa SBM Offshore já arcou com uma multa de US$ 340 milhões.

As autoridades suíças não estão interessadas na prisão de executivos da Odebrecht – o objetivo de Berna é estipular eventuais multas. O Departamento de Justiça dos Estados Unidos, além de reter uma parcela maior dos valores do que a destinada ao país europeu, pede que todos os nomes de cidadãos americanos envolvidos no esquema sejam entregues.

Na cooperação entre os investigadores dos três países, cabe aos brasileiros da Lava Jato a missão de determinar quem será denunciado e, se condenado, preso. Metade de todo o valor arrecadado no acordo de leniência deverá ficar com o Brasil.

 

Cooperação. Em suas investigações, os suíços já pediram a cooperação do Panamá, Liechtenstein e outras jurisdições diante da descoberta de transações financeiras internacionais.

Berna admite suspeitas de que campanhas políticas na América Central foram financiadas com recursos ilícitos que passaram por contas secretas em Genebra e Zurique. “O mapeamento das atividades da Odebrecht pelo mundo já está praticamente encerrado”, disse um advogado em Genebra que acompanha o caso.

Outra dimensão das delações e das contas secretas na Suíça aponta para atividades na África, um território no qual a Odebrecht avançou significativamente nos últimos 20 anos. O Estado apurou que um dos principais centros de atividade seria Angola, com o suposto pagamento de propinas.

 

Denúncias. A dimensão inédita do acordo foi atingida depois que, por meio de delações premiadas de dezenas de executivos, ficou evidente que existia um esquema de pagamento de propinas e essa prática ia além das fronteiras do Brasil.

Os detalhes da supostas infrações já foram debatidos entre procuradores brasileiros e autoridades suíças, que passaram a cooperar em uma nova fase de delações.

O Estado informou com exclusividade como uma equipe do Ministério Público suíço viajou ao Brasil para coordenar com os procuradores brasileiros o que ocorreria com as novas delações e a forma de trabalho entre Berna e Curitiba. O encontro se concentrou no dossiê da Odebrecht e na negociação.

Cerca de 2 mil páginas com extratos bancários serão enviadas ao Brasil até o fim deste ano.

No entanto, por temer serem considerados cúmplices, bancos suíços têm acelerado o processo de identificação de novas contas. No total, dezenas de políticos e ex-altos funcionários de diversos governos no Brasil estariam implicados.

 

Delação

53 Executivos da Odebrecht negociam acordo de delação com a Operação Lava Jato – força-tarefa que investiga esquema de formação de cartel e corrupção na Petrobrás.

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Negociações entre americanos e Embraer levaram seis anos

Conclusão de acordo com Departamento da Justiça dos EUA tende demorar e são feitas diligências americanas

Por: Josette Goulart

 

Há pouco mais de um mês a Braskem, a empresa petroquímica do grupo Odebrecht, anunciou oficialmente que iniciou negociações com o Departamento de Justiça americano e a Comissão de Valores mobiliários do país (SEC, na sigla em inglês) para tentar um acordo em relação a casos de corrupção na empresa. Disse em seu comunicado que também negocia com autoridades brasileiras e que, ao fim, deverá fazer um pagamento relevante, mas que não tinha como quantificar neste momento.

O comunicado precede, segundo alguns advogados, um período normalmente longo de negociação até os acertos finais. A única brasileira que já esteve em situação semelhante foi a Embraer, investigada por ter pago propinas a países da América Central para vender aviões. Para se ter uma ideia, desde que foi notificada oficialmente que estava sendo investigada até o acordo se passaram seis anos e o caso foi concluído somente no mês passado. O acerto foi o pagamento de US$ 206 milhões para as autoridades americanas e brasileiras. O esquema de corrupção havia lhe rendido US$ 83 milhões. Outro caso brasileiro já em curso no departamento é o da Petrobrás.

Os advogados especialistas no assunto Isabel Franco e Eloy Rizzo do escritório KLA dizem que a demora em se chegar a um acordo se deve à diligência das autoridades americanas. Primeiramente, elas exigem que seja feita uma ampla investigação interna na empresa. Depois, cada relatório é avaliado e pormenores são contestados. É bastante comum que sejam exigidas novas investigações. Além disso, todas os envolvidos são ouvidos. Segundo advogados, a relação entre autoridades brasileiras e americanas é bastante próxima e é possível que as diligências no caso Odebrecht sejam feitas conjuntamente.

Na medida em que é feito o levantamento dos casos de corrupção apontados pela investigação interna, o departamento estipula valores de multas, seguindo uma espécie de tabela e atribui pesos aos atos de corrupção. Para amenizar, é levada em consideração o grau de contribuição da empresa na apuração.

Recentemente, o país estabeleceu o que chama de “Pilot Program”. Por este programa, as empresas que se autodelatam e entregam com minúcia os casos de corrupção podem até mesmo não pagar um centavo de multa, sendo absolvidas pela confissão. Porém, necessariamente precisam dar nomes aos empregados que praticaram os atos corruptos.

 

Valores

U$$ 206 mi

foi o valor acertado pela Embraer para o pagamento a autoridades americanas e brasileiras em função dos casos de suborno e governos de países da América Central para a venda de aviões