Lava-Jato critica projeto sobre acordo de leniência

Rafael Mota Martins e Manoel Ventura

10/11/2016

 

 

Aprovação seria como ‘ferida de morte’, diz procurador

 

-CURITIBA E BRASÍLIA- A força-tarefa da Operação Lava-Jato convocou a imprensa ontem em Curitiba para criticar o substitutivo a ser proposto pelo deputado federal André Moura (PSCSE) ao projeto de lei que modifica regras para acordos de leniência. O procurador Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa, disse que a Lava-Jato estará “ferida de morte” caso a mudança seja aprovada.

O projeto original diz, entre outras coisas, que o governo pode fechar os acordos sem a necessidade de submetê-los ao Tribunal de Contas da União e não permite que o Ministério Público questione o valor a ser devolvido pelas empresas.

Para o procurador Carlos Fernando Lima, ao discutir projetos como esse sobre os acordos de leniência, o que pode dar uma anistia ao caixa dois e o que permitiu a repatriação de recursos ilícitos depositados no exterior, a Câmara “não está mandando mensagens de acordo com interesse da população”.

— Esse substitutivo traz prejuízo para todo o combate à corrupção daqui por diante. Prejudicaria tanto (a operação) que não teríamos mais efetivamente uma Lava-Jato. Transformaria (a operação) em outra coisa que não uma investigação de sucesso de corrupção. Significaria enterrar a Lava-Jato — disse Lima.

Segundo Dallagnol, “é público e notório que existem grandes negociações (de delação) em andamento, e elas seriam muito prejudicadas e iriam por terra (se o texto fosse aprovado)”.

Lima deu exemplo de como a mudança afetaria a operação:

— Os executivos condenados de uma empreiteira que faça acordo de leniência terão sua punibilidade extinta. Serão imediatamente soltos. Bens bloqueados seriam devolvidos, os valores ressarcidos à Petrobras também seriam devolvidos — explicou. — Temos diversos acordos de leniência em negociação. Possivelmente tornaria inútil para empresas fazer acordo conosco. Isso impactaria na produção de provas de outros crimes. Impede a expansão das investigações, a entrega de provas de crimes cometidos por políticos, empresários.

Em Brasília, André Moura disse que o texto substitutivo ainda não está fechado e não seria apresentado ontem:

— Também, tudo acaba com a Lava-Jato... Eu ainda não apresentei o substitutivo. Essa entrevista foi feita com base em um texto que não é o meu. Eu não iria apresentar o relatório hoje, porque o texto não está pronto. Passei o dia em reuniões com várias centrais sindicais, no Palácio do Planalto, com o ministro da Transparência. Ainda vou conversar com o Tribunal de Contas da União (TCU), e com quem quiser dar sugestões.

Moura negou que tenha adiado o relatório após as críticas dos procuradores, porque, segundo ele, o texto não está pronto. No ano passado, o projeto foi discutido em uma comissão especial da Câmara, mas o substitutivo de Moura não chegou a ser votado. Na terça-feira, líderes de 15 partidos apresentaram um pedido de urgência para esse projeto.

 

 

O globo, n. 30411, 10/11/2016. País, p. 10.