O Estado de São Paulo, n. 44946, 07/11/2016. Economia, p. B1

Após crise, BTG encolhe e fica mais conservador

Um ano após a prisão de seu principal acionista, André Esteves, pela Operação Lava Jato, banco se desfez de vários negócios, abandonou a ambição de se internacionalizar e voltou às origens como gestor de investimentos de grandes fortunas

Por: Mônica Scaramuzzo / David Friedlander

 

Quase um ano depois de virar de ponta-cabeça com a prisão de André Esteves pela Operação Lava Jato, o BTG Pactual está menor e se desfez de vários negócios, mas não quebrou – contrariando previsões de boa parte do mercado. Saques em massa e fuga de clientes obrigaram o banco a abandonar a ambição de ser “um BNDES privado e eficiente”, como Esteves declarou certa vez ao ‘Estado’, e voltar às origens: ganhar destaque como gestor de investimentos e grandes fortunas da América Latina.

“Para nós, a crise é página virada”, disse ao Estado Roberto Sallouti, copresidente do BTG e braço direito de Esteves. A tradicional festa de fim de ano, que foi cancelada no ano passado porque Esteves estava na cadeia, será retomada na forma de um happy hour menos ambicioso, em algum lugar perto da sede do banco, na avenida Faria Lima, em São Paulo. Os bônus aos principais executivos estão garantidos – os de 2015 foram pagos com atraso –, e há até uma expectativa do mercado de que o banco retome pagamento de dividendos.

Quem se comporta como se o trauma de novembro de 2015 já estivesse superado é Esteves.Acusado de tentar atrapalhar as investigações da Lava Jato, ele ficou 24 dias no presídio Bangu 8 e deixou a presidência do BTG para não comprometer ainda mais a imagem instituição. Voltou em abril deste ano, mas na condição de maior acionista individual.Não tem direito a voto nem função executiva formal. Mesmo assim, senta com os colegas na grande sala de operações da casa no 12.º andar, participa ativamente das decisões estratégicas e faz reuniões com clientes.

Nas conversas mais descontraídas, fala sem mostrar rancor do período atrás das grades. Diz que se dava bem com todo mundo e algumas vezes ajudou colegas com conselhos sobre finanças pessoais. Já disse, também, que amadurecia a ideia de ajudar detentos que conheceu e que não tinham condições de pagar advogados.

Embora o processo contra Esteves continue correndo, Sallouti diz que a volta do banqueiro não compromete a atual governança do banco. “Contamos com o talento e quase 30 anos de experiência de André no mercado.” Com a prisão de Esteves, os sete principais sócios do banco criaram o G7 Holding e seguraram a barra no pior momento do BTG. Para responder à crise, o grupo costurou um aporte relâmpago de R$ 6 bilhões com o FGC (Fundo Garantidor de Créditos) – valor já quitado –, vendeu ativos e se já livrou de algumas empresas de private equity, que tende a ser uma operação irrelevante. O banco também cindiu a divisão de commodities, antes uma aposta alta do BTG, e ficou com apenas 30% do suíço banco BSI, que tinha sido comprado em 2014, sepultando a ambição global.

 

Menor. O banco encolheu. Saiu de um total de ativos de R$ 302,8 bilhões no terceiro trimestre de 2015 para R$ 213,3 bilhões no segundo trimestre deste ano. A carteira de crédito, por exemplo, ficará em uma vez o patrimônio do banco (atuais R$ 23,5 bilhões) – já chegou a três.

Nesse meio tempo, o G7 também sofreu abalo. O executivo James Marcos de Oliveira negociou sua saída do banco – outro sócio deverá entrar em seu lugar.Essa decisão ocorreu em agosto com a realocação de ações, processo de compra e venda de papéis entre acionistas.Além de Sallouti, fazem parte desse grupo de choque Marcelo Kalim, também copresidente, Antonio Carlos Canto Porto Filho, o Totó; Guilherme Paes, Renato Monteiro dos Santos e Persio Arida, atual presidente do conselho de administração.

Sobre outras mudanças na composição acionária desse grupo e mesmo se Arida continua à frente do conselho no ano que vem, Sallouti não quis comentar, alegando que o banco está em período de silêncio, fase que antecede a divulgação de seus resultados financeiros.

O Estado apurou que o conselho ganhará um novo membro: o executivo Guilhermo Ortiz, responsável pelos negócios do BTG na América Latina. Em breve, o ex-ministro Nelson Jobim, desde julho membro do conselho e relações institucionais do banco, também deve apresentar novas diretrizes de compliance do banco.

 

Foco. Com as reestruturações concluídas, Sallouti disse que a principal diretriz do BTG será foco e simplicidade. “Hoje o banco é mais simples de entender do que era um ano ou dois anos atrás.” Outro ponto importante é gestão e cultura. “Só viramos essa página por causa da nossa cultura de ‘partnership’.” As mudanças feitas pelo banco, nos últimos meses, permitiram, segundo Sallouti, ao BTG ter um balanço líquido e sólido.O perfil agressivo do BTG cedeu espaço para uma postura conservadora, diferente da filosofia anterior. “O que sobrou do antigo BTG Pactual será a base para o futuro do banco”, disse Sallouti.Assim, dessa maneira, o banco dá passos para trás. Mas os executivos continuam com sangue nos olhos. “Antes, buscávamos diversificação de uma forma mais agressiva, mas não perderemos agilidade e qualidade.”

 

PARA LEMBRAR

Desde o fim de 2015, o BTG se desfez de vários ativos do braço de private equity (participações em empresas) e operações financeiras. Entre os ativos proprietários vendidos estão a Rede D’Or, BR Properties e fatia no Túnel de Catalunha, que somaram R$ 3,7 bilhões. Também se desfez da Leader e está vendendo bandeiras da BR Pharma, varejo farmacêutico em crise. Da área financeira, vendeu 70% do BSI, Pan Seguros e Corretora, para francesa CNP, além da carteira de crédito Recovery para o Itaú.

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Banco faz apostas em plataforma digital para atrair clientes

Lançamento do banco digital será feito nas próximas semanas; cerca de 3 mil clientes já utilizam os serviços

Por: Mônica Scaramuzzo/ David Friedlander

 

O BTG Pactual está criando uma carteira de clientes para atender em uma plataforma digital. Essa operação será oficialmente lançada no fim deste mês e já conta com cerca de 3 mil usuários, que já utilizam os serviços em caráter experimental.

Roberto Sallouti, copresidente do banco, evita fazer projeções de metas para esse novo negócio do banco, mas está bem animado. “É um movimento que achamos relevante e o banco está focado nessa revolução digital”, disse. Segundo ele, o futuro está na desintermediação do negócio. “É uma área estratégica para o banco.” Embora não haja metas concretas, Sallouti acredita que esse novo filão pode atingir, nos próximos anos, uma carteira de até 50% do valor do total gerido pelo banco no segmento “wealth management” (gestão de fortunas).

De acordo com dados do segundo trimestre do BTG, a área de grandes fortunas tem sob gestão R$ 67,4 bilhões.O cliente do banco digital é totalmente diferente do perfil tradicional atendido pelo BTG.Para participar do seleto grupo de “wealth management”, é preciso ter, no mínimo, R$ 10 milhões.Na plataforma digital, o limite mínimo para se investir em fundos é de R$ 30 mil. Mas, o cliente poderá investir R$ 3 mil por fundo. O processo de abertura de conta é 100% online, sem intermediário.

Com esse novo negócio, o BTG Pactual passa a seguir uma tendência que começa a se expandir entre os bancos de varejo do Brasil e do mundo.Começo. Quando assumiu o BTG Pactual, o banqueiro André Esteves queria abraçar o mundo. O banco diversificou sua atuação e se posicionou como uma instituição global ao anunciar a compra do suíço BSI, em julho de 2014. A instituição – que cresceu por meio de aquisições (foi fundado ao comprar as operações do Pactual do suíço UBS) – tinha planos de se associar ao Bradesco e colocar seus pés no varejo.

Em 2012, o BTG deu um passo arriscado com a compra do banco Panamericano, que pertencia ao empresário Silvio Santos, dono do SBT. Após a crise no fim do ano passado, vendeu as divisões da Pan Seguro e Pan Corretora para a francesa CNP.

Mas ainda está com o banco Pan nas mãos.Sallouti disse que não há intenções de se desfazer do Pan, por enquanto. “Os resultados financeiros não refletem a melhora operacional do banco. Estamos convictos que, em muito breve, os resultados financeiros do Pan vão refletir a melhora operacional que já teve.” O mesmo vale para os 30% que detém no suíço BSI. O BTG deve analisar nos próximos dois a três anos o que deverá fazer com essa fatia. Por ora, é o que restou ao BTG de seu antigo plano de globalização. / M.S. e D.F.