Título: Crise abate uma gigante nos EUA
Autor: Ribas, Sílvio
Fonte: Correio Braziliense, 30/11/2011, Economia, p. 9

Terceira maior companhia aérea do mundo, American Airlines pede concordata para tentar se manter nos ares

Símbolo norte-americano na aviação mundial, a American Airlines decidiu fazer um pouso forçado. A AMR Corp, controladora da empresa, entrou ontem com pedido de concordata da companhia, a terceira maior do mundo, num tribunal de Nova York, mas assegurou que todas as operações serão mantidas. Para isso, além da proteção judicial garantida pelo capítulo 11 da Lei de Falências norte-americana, a empresa afirmou ter US$ 4,1 bilhões livres no caixa. A reorganização permitirá reduzir custos da aérea e de outras subsidiárias, sobretudo com salários. O objetivo é torná-las competitivas para voltar ao lucro. A última vez que a American esteve no azul foi em 2007.

Última das grandes companhias aéreas dos EUA a pedir proteção judicial desde os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, a American ficou à beira da concordata em 2003, mas decidiu evitar o processo, após fechar acordo com os funcionários para economizar US$ 1,6 bilhão com cortes de salários e outras concessões.

Especialistas ouvidos pelo Correio acreditam que o tombo da companhia foi resultado da combinação de alta dos combustíveis e acirramento de uma concorrência já agressiva no maior mercado do mundo, os EUA, onde operadoras de baixo custo (low cost) avançaram muito. Elas cresceram na contramão da procura interna, afetada negativamente pelo baixo crescimento do país. Diante das dificuldades para ajustar a folha de pagamento, restou apelar para a concordata.

"Temos de fazer frente à estrutura de custos, incluindo salários", anunciou Thomas Horton, ex-diretor financeiro da empresa e substituto do presidente Gerard Arpey, que renunciou ao cargo. Horton recebeu a missão de buscar a recuperação e seu anúncio veio apenas três semanas após a própria American ter alardeado ser uma das poucas grandes companhias dos EUA a não ter entrado em colapso. O grupo ainda não disse qual será o futuro de um pedido de compra de 460 aeronaves anunciado em julho.

O mercado financeiro sempre duvidou das declarações otimistas e há muito apostava no impasse entre a empresa e seus pilotos, que rejeitavam fazer concessões salariais, necessárias para sanear as contas. Os funcionários alegavam já ter contribuído durante a crise anterior, em 2003, ainda quando o grupo era líder mundial. "A situação serve de alerta para o Brasil, onde está difícil contratar pilotos e cuja falta de mão de obra já provoca pressões salariais sobre as companhias aéreas", chamou a atenção Alessandro Oliveira, pesquisador de mercados do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

No limite O especialista lembra que o sindicato de aeroviários nos EUA é forte o bastante para tirar flexibilidade do mercado, cuja competição cresceu depois do recuo do número de passageiros de negócios. "Lá, as empresas operam no limite. Embora o Brasil ainda não sofra igual impacto das low cost e as taxas de crescimento sejam recordes, os resultados mostram números apertados", explicou.

Rumores de que a AMR iria apelar para a lei de concordata circularam depois de uma onda incomum de aposentadorias de pilotos, seguida da corrida desses funcionários para se desfazerem de US$ 600 milhões em ações recebidas da empresa como indenização. Os papéis caíram 35% desde novembro. Ontem, antes da abertura das bolsas de valores, custavam US$ 1,62. Contudo, após a notícia da concordata, viraram pó, fechando o dia com desvalorização de 84%.

Apesar da péssima reação de investidores, alguns grandes clientes da American não temem problemas a curto prazo. "A experiência mostra que o modelo de concordata de grandes empresas nos EUA conseguiu manter a operação geral das concordatárias. Também estamos menos expostos à American que outros concorrentes", informou Joakim Thrane, presidente no Brasil da companhia norte-americana de entregas expressas DHL.

PanAm Desde 1978, várias grandes companhias aéreas norte-americanas recorreram à lei de concordata. A maioria conseguiu evitar o pior, com exceção da PanAM, que desapareceu em 1991. A Continental recorreu à solução em 1990 e a Hawaiian Airlines, em 1993. A partir de então, iniciou-se uma década de relativa estabilidade, interrompida pelos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001, quando o transporte aéreo recuou drasticamente.

Área de turbulência Dívidas crescentes obrigaram a American Airlines a apelar à Justiça AA em números Patrimônio - US$ 24,7 bilhões Dívidas - US$ 29,5 bilhões Prejuízo acumulado até setembro - US$ 884 milhões Empregados - 78 mil Voos diários - 3,3 mil Total de aeroportos onde pousa - 260 Total de países onde opera - 50

Operação no Brasil São Paulo (Guarulhos) para Boston, Las Vegas e Los Angeles Rio de Janeiro (Galeão) para Dallas, Los Angeles e São Francisco Belo Horizonte (Confins) para Miami Brasília para Miami Recife para Miami Salvador para Miami

Capítulo 11 Proteção dada pela Lei de Falências dos EUA Instrumento legal que permite a uma empresa norte-americana em dificuldades financeiras continuar operando e manter o patrimônio, dando-lhe tempo para negociar com credores, sob tutela de um tribunal. A proteção pode ser pedida pela própria companhia ou por um dos credores. O devedor pode adiar pagamentos e até reduzir dívidas. Em troca, informa ao juiz detalhes de suas negociações.

Legislação brasileira Inspirada nos EUA, a Lei de Falências do Brasil foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em fevereiro de 2005. Ela prevê a recuperação judicial, que substitui a antiga concordata. Uma empresa em dificuldades deve, após permissão da Justiça, apresentar estudo de viabilidade econômica com plano detalhado de recuperação das finanças, que deve ser aceito pela maioria dos credores. Enquanto isso, as ações contra a empresa ficam suspensas por 180 dias.

Grandes concordatas Marcas importantes que já recorreram ao Capítulo 11

Enron (corretora de energia) - 2001 United Airlines (companhia aérea) - 2002 US Airways (companhia aérea) - 2002 WorldCom (empresa de comunicação) - 2002 KMart (grupo varejista) - 2002 Delta Airlines (companhia aérea) - 2005 Northwest (companhia aérea) - 2005 Lehman Brothers (banco) - 2008