Estado de São Paulo, n. 44943, 04/11/2016. Política, p. A7

Moro torna Palocci réu por corrupção e lavagem

Para juiz da Operação Lava Jato, o codinome ‘Italiano’ em planilhas de propina da Odebrecht é uma referência ao ex-ministro dos governos Lula e Dilma

Por: Mateus Coutinho / Julia Affonso / Ricardo Brandt

 

O juiz federal Sérgio Moro aceitou ontem a denúncia contra o ex-ministro Antonio Palocci, que, assim, torna-se réu por corrupção e lavagem de dinheiro. Também são acusados Branislav Kontic, ex-assessor de Palocci, o empreiteiro Marcelo Odebrecht e outros 12 investigados.

Eles são investigados por corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro, relacionadas à obtenção, pela Odebrecht, de contratos de afretamento de sondas do pré-sal com a Petrobrás.

Com a decisão, mais um dos principais ex-ministros dos governos Lula e Dilma passa a ser réu na Lava Jato. José Dirceu, ex-titular da Casa Civil no primeiro mandato de Lula, já foi sentenciado por Moro a 20 anos e dez meses de prisão por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e associação criminosa no esquema de corrupção revelado pela operação.

Palocci, por sua vez, foi preso na Operação Omertà, 35.ª fase da Lava Jato, em 26 de setembro.

Para a força-tarefa, o codinome “Italiano” em planilhas de propina da Odebrecht é referência a o ex-ministro.

Ao aceitar a denúncia, Moro afirmou que “há razões fundadas para identificar Antônio Palocci Filho como a pessoa identificada pelo codinome ‘Italiano’ no Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht”.

 

Interferência. Nesta ação, a Lava Jato aponta que Palocci teria interferido em favor da Odebrecht na licitação que definiu as contratações dos estaleiros para produzir as sondas do pré-sal pela Sete Brasil e também que seria o responsável por orientar pagamentos da Odebrecht no exterior ao casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura, que atuavam para o PT.

Em relação às sondas do pré-sal, o Estaleiro Enseada do Paraguaçu, na Bahia, pertencente à Odebrecht, não saiu vencedor na primeira licitação, feita pela Petrobrás em 2010. Posteriormente, segundo a Lava Jato, Palocci teria interferido para moldar a forma de contratação de um outro edital de sondas de forma a favorecer a Odebrecht e garantir a margem de lucro pretendida pela empreiteira.

Nesta segunda licitação, o estaleiro acabou ficando com seis sondas. Neste episódio, segundo a Lava Jato, teriam sido pagas propinas da ordem de R$ 252,5 milhões a executivos da Petrobrás e da Sete Brasil – empresa de capital misto criada para gerenciar a construção das sondas do pré-sal. Parte do dinheiro também teria sido destinado ao PT, sendo que desta “cota”, Palocci teria orientado o repasse de US$ 10,2 milhões a Santana e Mônica no exterior.

Em sua decisão, Moro aponta que este acerto da Odebrecht com o casal de marqueteiros “é consistente com o lançamento a esse título na referida planilha” da Odebrecht.

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Para defesa, denúncia é ‘inverossímil’

Por: Fausto Macedo / Mateus Coutinho

 

O criminalista José Roberto Batochio, que defende o ex-ministro Antonio Palocci e o ex-assessor Branislav Kontic, afirmou que “não há surpresa” na decisão do juiz Sérgio Moro em aceitar a denúncia contra seu cliente, mas disse que a acusação se baseia em uma planilha apreendida “sem assinatura”.

“Então a denúncia, a despeito da sua dimensão amazônica, oceânica, ela usa milhares de palavras para dizer nada. A única coisa que diz é que ‘encontramos uma planilha’ sem assinatura, pode ser de qualquer pessoa. Ali são alçadas cifras, elas seriam despesas da Odebrecht, porque foi apreendida no escritório, então quem é o italiano?”, afirmou o advogado.

Para Batochio, “italiano” é um “apelido em busca de um personagem”.

De acordo com o criminalista, a acusação é uma tentativa de criminalizar o ex-ministro “de qualquer modo”. “A acusação gravita só em torno disso”, disse Batochio, em referência a documentos encontrados nas trocas de e-mails da Odebrecht.

“Você acha crível, verossímil, que R$ 128 milhões possam ter transitado sem deixar nenhuma marca? O ‘italiano’ manuseia esse dinheiro? Pagou como? Onde? De que forma? Para quem?”, afirmou o defensor.

 

‘Institucional’. Em relação aos encontros de Palocci com o empreiteiro Marcelo Odebrecht, o advogado afirmou que o ex-ministro conhece Emílio Odebrecht, patriarca do grupo, desde antes de ser deputado.

Para o defensor, os encontros de seu cliente com altos executivos fazia parte da função de ministro da Fazenda. “É uma obrigação do ministro e do administrador público manter uma interlocução com os diversos setores da sociedade.” Procurada, a Odebrecht informou que não iria se manifestar sobre o acolhimento da denúncia.

O Estado não conseguiu contatos com os advogados do casal João Santana e Mônica Moura./ FAUSTO MACEDO. e M.C.

 

AÇÃO PENAL

Odebrecht

Segundo a Lava Jato, de 2006 a 2015, o ex-ministro Antonio Palocci atuou por interesses da Odebrecht “na alta cúpula do governo federal”. A interferência de Palocci se dava mediante o pagamento de propina destinada ao PT”, sustenta a investigação.

 

Sondas

Palocci, o empreiteiro Marcelo Odebrecht e outros 13 são acusados de corrupção ativa e passiva e lavagem de dinheiro relacionadas à obtenção, pela Odebrecht, de contratos de sondas com a Petrobrás para o pré-sal.

 

 

Marqueteiros

A acusação do Ministério Público Federal aponta que o casal de marqueteiros João Santana e Mônica Moura teria recebido, “sob a supervisão” de Palocci, parte da propina a título de remuneração dos serviços prestados.