O globo, n. 30423, 22/11/2016. País, p. 4

Cabral diz estar indignado com acusações

Ex-governador nega ter pedido propina, mas afirma não ter como provar consultorias que alega ter feito

Por: TIAGO DANTAS, DIMITRIUS DANTAS

 

-SÃO PAULO- Em depoimento à Polícia Federal logo após ser preso na última quinta-feira, o ex-governador do Rio Sérgio Cabral disse que tem a “consciência tranquila” em relação às acusações feitas contra ele. Apontado como chefe de um grupo que desviou R$ 224 milhões em obras públicas, Cabral declarou que são mentirosas as denúncias feitas contra ele nas delações de executivos de empreiteiras que participaram de grandes obras no estado. Ontem, a Justiça Federal do Rio negou um pedido de habeas corpus feito pela defesa do ex-governador.

Segundo o termo de depoimento, ao final do interrogatório, Cabral demonstrou indignação com a prisão e com as delações contra ele. Disse que “tem a consciência tranquila quanto às mentiras absurdas que lhe foram imputadas” e que acredita na Justiça.

Ao ser confrontado com as delações dos ex-executivos da Andrade Gutierrez Rogerio Nora e Cloves Primo, disse achar que essas informações foram apresentadas para “salvar as delações dos executivos e de Paulo Roberto Costa (ex-diretor da Petrobras)”. Ao menos cinco delatores acusam Cabral de ter recebido propina.

O ex-governador afirmou que todas as reuniões que teve com representantes de empreiteiras tiveram o objetivo de discutir obras no estado, foram acompanhadas por secretários e ocorreram na sede do governo ou na residência oficial. Também afirmou que nunca solicitou a Carlos Miranda, seu homem de confiança, que pedisse propina em seu nome. Cabia a Miranda, disse, auxiliar “sua vida pessoal financeira” e até fazer sua declaração de Imposto de Renda.

No depoimento, afirmou que “não recebeu propina” e negou conhecer o que significava “taxa de oxigênio”.

O ex-governador admitiu prestar consultoria por um ano para uma empresa chamada Creação Jeans, pela qual recebeu R$ 60 mil. Ao ser questionado se podia apresentar provas desse trabalho, disse que não, pois “o resultado se dá de forma mais pessoal em encontros de aconselhamento” com o dono da marca.

Cabral também negou beneficiar a empresa Delta Construções na reforma do estádio do Maracanã, como foi dito por Nora e Primo. Quando questionado sobre quem era o secretário responsável pela obra, disse que a licitação começou na gestão do atual governador Luiz Fernando Pezão e terminou com Hudson Braga, também preso semana passada. “Ambos efetuaram diversas visitas às obras e o indiciado apenas umas duas vezes”, diz o termo de depoimento de Cabral. O nome de Pezão foi citado pelo menos mais duas vezes.

Cabral afirmou que não se lembrava como foram pagas reformas de até R$ 100 mil em sua casa nem de quantas compras fez em joalherias. Refutou “qualquer tipo de relação espúria com Eike Batista”, embora tenha confirmado que viajou num avião do empresário para defender a candidatura do Rio para a Olimpíada de 2016.

Estão anexados ao processo os bens apreendidos nas propriedades de Cabral. Além de cinco celulares e seis tablets, foram recolhidas 40 joias, 28 obras de arte e três veículos. Em Angra dos Reis e Mangaratiba, foram encontrados uma moto-aquática, um “jet-boat” e uma lancha.

 

MAGISTRADO DO TRF NEGA HABEAS CORPUS

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no Rio, negou ontem o pedido de habeas corpus feito pela defesa de Cabral. No despacho, o desembargador Abel Gomes concluiu que faltam às alegações dos advogados de Cabral relato “concatenado e substancial” que possa mostrar que não houve “justa causa” para a prisão preventiva do ex-governador.

Segundo a decisão, faltam aos argumentos da defesa documentos que permitam a “instrução do pedido”. Os advogados de Cabral alegaram que a prisão constituía “prévia e antecipada condenação à pena privativa de liberdade”.

A defesa argumenta que Cabral “nunca foi ouvido” pelo juízo da 7ª Vara Federal Criminal, responsável pela decisão de prendê-lo. “Por mais grave que o fato seja, exige o devido processo legal, direito constitucionalmente assegurado”, afirmaram os advogados.(com G1)

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Moro mantém preso ex-secretário de governo

-SÃO PAULO- O juiz Sérgio Moro decidiu manter preso Wilson Carlos Cordeiro da Silva Carvalho, ex-secretário de Governo de Sérgio Cabral. No despacho que deflagrou a Operação Calicute, Moro decretou a prisão temporária do ex-secretário, que venceria hoje, quando Wilson Carlos deixaria a prisão. Agora, ele teve decretada a prisão preventiva (sem data para terminar).

No pedido de prorrogação da prisão, o Ministério Público Federal (MPF) anexou os depoimentos de Cabral e de Carlos Miranda, homem de confiança do ex-governador, à Polícia Federal no dia das prisões como motivos para que Wilson Carlos permaneça preso.

“Nesse contexto, documentação apreendida no apartamento de Wilson Carlos reforça que este, auxiliado por Carlos Miranda, gestionava e operacionalizava a propina de Sérgio Cabral, por meio de atos de lavagem de ativos”, afirmaram os procuradores. Outra razão apontada pelo MPF são os gastos de Wilson, considerados incompatíveis com sua situação financeira, como uma propriedade em Mangaratiba que ele afirma ser alugada, uma embarcação e os gastos de cartão de crédito.

“O padrão de vida ostentado por Wilson Carlos e seus familiares, e toda a evidência, é incompatível com sua declarada condição de desempregado desde o ano de 2014, revelando claramente que ainda usufrui, via operações rotineiras de lavagem de dinheiro, registro de bens em nome de terceiros e ocultação do patrimônio, das vantagens indevidas amealhadas no decorrer da gestão de Sérgio Cabral no governo do Estado do Rio de Janeiro”, dizem os procuradores.

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BC bloqueia R$ 11 milhões de Adriana Ancelmo

Decisão é de Sérgio Moro. Nas contas de Cabral, Banco Central encontrou apenas R$ 455

Por: DIMITRIUS DANTAS E TIAGO DANTAS


 

-SÃO PAULO- O Banco Central encontrou R$ 11 milhões nas contas de Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador Sérgio Cabral, e de sua empresa de advocacia. A pedido do juiz Sérgio Moro, o banco bloqueou R$ 10 milhões das contas de cada um dos acusados da 37ª fase da Operação Lava-Jato, batizada de Calicute. Nas contas do ex-governador, o BC encontrou apenas R$ 455. Na conta pessoal de Adriana foram encontrados R$ 10 milhões e mais R$ 1 milhão na de sua empresa.

No despacho em que autorizou a prisão de Cabral, Moro afirmou que não importa se os valores nas contas bancárias foram misturados com valores de procedência lícita. “O sequestro e confisco podem atingir ativos até o montante dos ganhos ilícitos. Também se justifica a mesma medida em relação às contas das empresas de sua titularidade e controle que podem ter sido utilizadas para ocultar e dissimular a vantagem indevida recebida”, afirmou o juiz.

 

PATRIMÔNIO CRESCEU DEZ VEZES

Durante as investigações, o sigilo fiscal de Adriana Ancelmo foi quebrado. Um relatório da Receita Federal apurou que a ex-primeira-dama aumentou seu patrimônio dez vezes desde 2007, ano em que Cabral tomou posse como governador do Rio de Janeiro. O salto foi de R$ 2,078 milhões naquele ano para R$ 21,7 milhões no ano passado, segundo a Receita Federal.

No informe aos procuradores, a Receita Federal classificou como “pujantes” as movimentações financeiras de Ancelmo. A suspeita da Lava-Jato é que seu escritório tenha sido usado para receber recursos do esquema.

Em seu despacho, Moro afirmou que foram encontrados indícios de que Andriana Ancelmo estruturou suas operações financeiras em valores fracionados para que ficassem abaixo dos parâmetros de segurança do Banco Central — operações bancárias suspeitas de lavagem de dinheiro de valor igual ou superior a R$ 10 mil são comunicadas para o banco.

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MP: cirurgia de Garotinho era necessária, mas ex-governador pode ter alta até quinta

Político se recusou a ser examinado por peritos; Clarissa é expulsa do PR por votar contra PEC

Por: CLARISSA PAINS E LUÍS GUILHERME JULIÃO*

 

-RIO E BRASÍLIA- O ex-governador Anthony Garotinho se negou a ser examinado, no domingo, por peritos em Medicina Legal do Ministério Público estadual (MP-RJ), sem a presença de seu advogado, Fernando Fernandes. A informação foi antecipada pelo blog de Ancelmo Gois, no GLOBO. Com base nos laudos disponibilizados pelo Hospital Quinta D’Or, a equipe técnica do MP avaliou que havia a necessidade da cirurgia cardíaca, concluiu que Garotinho reagiu bem à operação e estimou que ele poderá ter alta até quinta-feira.

Os peritos afirmaram que o ex-governador está em “boas condições clínicas” e com “os sinais vitais e todos os parâmetros dentro da normalidade”. Com base no relatório hospitalar, a equipe disse que havia uma obstrução de 60% num dos ramos da artéria coronária direita, o que motivou a angioplastia e a colocação do “stent”. Ainda segundo a perícia, o padrão em casos semelhantes é que o paciente fique internado por um dia na unidade cardiointensiva e outros dois no quarto, antes de ser liberado.

Segundo o médico Marcelo Sobral, membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Cardiovascular, a conclusão a partir das informações divulgadas é que o procedimento cirúrgico foi “razoavelmente simples”, sem complexidade elevada:

— A situação é pior quando a pessoa já chega ao hospital infartando ou com angina instável, que também dá fortes dores no peito. Esse, a princípio, não foi o caso do ex-governador. Há outros aspectos que podem tornar o procedimento mais difícil, como a existência de trombos ou de calcificação dentro das coronárias — disse.

Sobral frisou que, mesmo correndo tudo bem durante a internação, é necessário um período de repouso em casa para que a via de acesso usada para inserir o cateter no vaso sanguíneo se feche bem. Essa via pode ser aberta no punho ou na virilha, eé a partir dela que o cateter chega ao coração e se implanta o “stent”.

Doutor em Cardiologia pela UFRJ, Cláudio Domênico avalia não ser possível dizer se a operação de Garotinho foi menos complexa só pelo fato de ter posto apenas um “stent”.

— Tudo depende do tamanho do “stent” e da localização exata onde ele foi colocado. Às vezes, pode-se colocar um “stent” do mesmo tamanho de três menores — diz Domênico, membro da Sociedade Europeia de Cardiologia.

 

PR EXPULSA CLARISSA

O PR expulsou ontem a deputada federal Clarissa Garotinho, filha do ex-governador. Ela contrariou a orientação do partido e votou contra a Proposta de Emenda Constitucional que estipula um teto para os gastos públicos. O projeto foi aprovado e seguiu para o Senado.

(*)Estagiário, sob a supervisão de Roberto Maltchik Colaborou Isabel Braga