Cláudia Cruz: 'Ele socava a mesa e dizia que o dinheiro era lícito'
17/11/2016
Em depoimento a Moro, mulher de Cunha afirma que sempre confiou nele
-SÃO PAULO- A jornalista Cláudia Cruz afirmou ontem em depoimento na 13ª Vara Federal de Curitiba que não tinha a “menor ideia” da origem dos recursos utilizados em suas compras em lojas de grife, pagas com cartão de crédito internacional. Afirmou que toda a gestão da sua vida financeira cabia ao marido, o deputado federal cassado Eduardo Cunha (PMDB).
Cláudia disse desconhecer que o cartão que possuía na Suíça era vinculado a uma conta que, segundo a Operação Lava-Jato, foi abastecida por propina da Petrobras. E afirmou que só soube da existência da conta em abril do ano passado, quando houve o bloqueio dos recursos.
SEM MOTIVO PARA DESCONFIAR
Questionada sobre a incompatibilidade dos gastos de Cunha com os rendimentos de deputado federal, afirmou:
— Quando as notícias saíram, ele ficava sempre muito bravo, socava a mesa. Sempre repetia: “Meu dinheiro é lícito”. Eu acreditava. Não tenho motivo para desconfiar — disse ela, negando mudança no padrão de vida e de evolução patrimonial do casal após a entrada de Cunha na política. — Eu já conheci meu marido sabendo que ele atuava em comércio exterior, em bolsa de valores e que tinha patrimônio imobiliário. Nós sempre tivemos uma vida muito próspera por conta desse patrimônio.
A mulher do ex-deputado não quis responder às perguntas do juiz Sérgio Moro e esclareceu somente os questionamentos feitos por seu advogado Pierpaolo Bottini.
Indagada sobre inconsistências em seu Imposto de Renda, disse que, antes do casamento, quem fazia sua declaração era seu pai e que, quando casou, Cunha assumiu a tarefa.
— Ele fazia toda a gestão financeira. Eu sempre confiei plenamente. Se é prudente ou não, eu sempre confiei.
O advogado perguntou se, em algum momento, ela conversou sobre a origem do dinheiro do marido. Bottini quis saber se, quando era jornalista, não tinha curiosidade de perguntar de onde vinham os valores:
— Veja bem, em casa eu não era jornalista. Era mãe dos filhos e ele (Cunha) meu marido. E ali não tinha ninguém fazendo entrevista ou perguntando — afirmou.
Após prestar depoimento ao juiz, Cláudia visitou o marido na carceragem da Polícia Federal.
Ao falar aos procuradores, em abril do ano passado, a jornalista dissera que a abertura de uma conta foi sugerida por Cunha para custear as despesas dos filhos no exterior. Disse que ele levou os documentos para que ela assinasse.
Cláudia é ré por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Segundo procuradores, ela mantinha conta secreta na Suíça, denominada Kopek, que recebeu US$ 165 mil de propina de um contrato da Petrobras.
Idalécio Oliveira, o empresário português que vendeu à Petrobras parte de um bloco para exploração de petróleo em Benin, na África, afirmou, também em depoimento a Moro, que não pagou propina no negócio e que o bloco é tão bom que está agora negociando com um novo parceiro, mantido em sigilo.
A Petrobras pagou em 2011 US$ 34,5 milhões por 50% do chamado Bloco 4 — uma área de 7,4 mil quilômetros quadrados, a 60 quilômetros da costa e com profundidade de até 3.200 metros — da Companie Beninoise des Hydrocarbures Sarl (CBH), controlada pelo Lusitania Group, que pertence a Oliveira. Não foi achado petróleo.
O globo, n. 30418, 17/11/2016. País, p. 04.