O globo, n. 30420, 19/11/2016. País, p. 5

Ex-primeira-dama multiplicou patrimônio por dez

 

Gustavo Schmitt

 

A quebra de sigilo fiscal de Adriana Ancelmo revela que a ex-primeira-dama aumentou seu patrimônio em dez vezes desde 2007, quando Sérgio Cabral tomou posse no governo do Rio. O salto foi de R$ 2,078 milhões, em 2007, para R$ 21,7 milhões, no ano passado.

As informações constam de um relatório da Receita Federal, anexado aos documentos da Operação Calicute, que levou quinta-feira à prisão o ex-governador. Ele entregou o governo a seu sucessor, Luiz Fernando Pezão, em março de 2014, após enfrentar desgaste político e acusações de corrupção nas manifestações do ano anterior.

No informe aos procuradores da Lava-Jato, a Receita Federal classifica como “pujantes” as movimentações financeiras de Adriana, mas não verifica incompatibilidade entre os rendimentos declarados.

O documento informa que a maior parte dos valores declarados pela ex-primeira-dama são provenientes de lucros do seu escritório de advocacia, o Ancelmo Advogados, contratado por empresas contempladas por Cabral com benefícios fiscais, como revelou O GLOBO. Os procuradores suspeitam que Adriana tenha recebido pagamentos sem ter prestado serviço.

 

CONEXÃO COM INCENTIVOS

A Lava-Jato investiga uma conexão entre os bilionários incentivos concedidos pelo exgovernador — cerca de R$ 140 bilhões em renúncia entre 2008 e 2013 — e contratos com o escritório de sua mulher.

As empresas Telemar, CSN, Light, Reginaves, Metrô, Brasken e Unimed, entre outras favorecidas pelos incentivos fiscais, figuram na lista de clientes da exprimeira-dama. Entre os contratos avaliados pela força-tarefa, dois — da Reginaves, de R$ 1,1 milhão, e do Hotel Portobello, de R$ 844 mil — dizem respeito a empresas diretamente envolvidas em operações suspeitas com o grupo investigado.

A Força-Tarefa também achou contratos celebrados entre o escritório de Adriana e concessionárias do poder público como Metrô-Rio (R$ 1,9 milhão), CEG (R$ 865 mil), OI-Telemar (R$ 10 milhões) e Light (R$ 3,5 milhões).

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Compras de imóveis e obras de arte são investigadas

 

Entre 2012 e 2014, a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo comprou dois apartamentos em Ipanema. Somados, os gastos com a aquisição dos imóveis chegam a R$ 6,9 milhões. A Receita encontrou inconsistências numa transação imobiliária de Adriana Ancelmo, feita em 2014: a compra de um apartamento na Rua Prudente de Morais. A investigação identificou que ela adquiriu o imóvel por R$ 3,3 milhões. Porém, o valor declarado foi de R$ 4,6 milhões.

O relatório também informa que, no ano passado, a mulher de Cabral adquiriu por R$ 400 mil um quadro da artista Adriana Varejão e outras duas telas por R$ 150 mil. Em dezembro, consta na declaração da exprimeira-dama a aquisição por R$ 2 milhões da casa no condomínio de Mangaratiba.

Procurado, o escritório de advocacia de Adriana, que a defende, não respondeu. A exprimeira-dama também não deu entrevistas.

 

NOVO PEDIDO DE PRISÃO

A força-tarefa da Lava-Jato recorreu ao Tribunal Federal da 2ª Região para pedir a prisão temporária da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo. Antes da deflagração da Operação Calicute, os procuradores já haviam solicitado a medida ao juiz da 7ª Vara Federal Criminal do Rio, Marcelo Bretas, que negou o pedido. Com isso, ela foi levada coercitivamente para para a Superintendência da Polícia Federal na quinta-feira e liberada após prestar depoimento.

O pedido de prisão temporária de Adriana será analisado pelo desembargador Abel Gomes, da 1ª Turma especializada do TRF-2. Ele aguarda manifestação da defesa da ex-primeira-dama. Depois que isso acontecer, a segunda instância do MPF vai se manifestar. Em seguida, o desembargador vai levar a análise do pedido de prisão para a turma, que é composta por Abel e outros dois desembargadores.

A força-tarefa da Lava-Jato sustenta que Adriana Ancelmo, mesmo sendo casada com Cabral, não “reportou qualquer dificuldade ético-profissional” ao ser contratada, por meio de seu escritório de advocacia, por empresas que mantinham contratos com o governo do Rio e com concessionárias de serviços públicos.