Correio braziliense, n. 19523, 07/11/2016. Brasil, p.4

 

PF prende 11 por fraudes no Enem

Vera Batista


 

EDUCAÇÃO » Duas operações realizadas em oito estados flagram esquema de compra de vagas que custavam, de acordo com o curso superior, de R$ 40 mil a R$ 200 mil. Gabaritos eram passados por ponto eletrônico, um deles tão pequeno que teve de ser retirado com uma pinça do ouvido.

Onze pessoas, ao todo, foram presas, ontem, em oito estados, como resultado de duas operações da Polícia Federal, com o auxílio do Ministério Público Federal (MPF) e do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), para combater fraudes contra o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Duas investigações distintas foram conduzidas. Uma delas, a Operação Embuste, em Montes Claros (MG), desarticulou uma organização criminosa especializada em fraudar o ingresso em instituições de ensino superior. Os gabaritos custavam entre R$ 40 mil e R$ 200 mil.

A outra, batizada de Jogo Limpo, aconteceu em sete unidades da Federação (Maranhão, Piauí, Ceará, Paraíba, Tocantins, Amapá e Pará) e identificou 22 pessoas que fizeram o exame no ano passado, entregaram respostas suspeitas e faziam o teste novamente neste ano. Os detidos (10 em Montes Claros, seis deles em flagrante) poderão responder por crimes contra a fé pública, o patrimônio, a paz pública, entre outros delitos, com penas que chegam a 20 anos de detenção.

Na Operação Embuste, segundo o delegado federal Franco Parazzoni, chefe da Divisão de Combate a Crimes Fazendários, os flagrados dentro das salas nos locais de provas vendiam as vagas, especialmente para o curso de medicina. Por meio de métodos sofisticados, passavam o gabarito para uma central, que imediatamente retransmitia o resultado ao aluno. Em alguns casos, especialistas em uma matéria específica se passava pelo candidato, mudando inclusive a foto no documento. Os interessados em passar na prova sem esforço pagaram entre R$ 40 mil a R$ 200 mil. “Não é difícil ver médicos formados fazendo a prova”, destacou Parazzoni.

Já na Jogo Limpo, no Nordeste, o foco principal eram as escutas. “Foi um trabalho bem articulado de inteligência, com base no banco de dados do Inep. Combater fraudes cibernéticas não é fácil. Os criminosos usavam equipamentos dentro do ouvido tão pequenos que tiveram de ser retirados com uma pinça”, detalhou o delegado. Esse foi o primeiro ano em que o Enem usou a identificação por biometria. Mas o método não contribuiu imediatamente com as investigações. “Hoje, não tem como fazer biometria na hora. A coleta é manual. A identificação total demora pelo menos três minutos. Atrapalharia o início da prova. Além disso, a presença ostensiva da polícia poderia causar constrangimento aos inscritos”, explicou o delegado da Polícia Federal. 

Reincidentes

A Operação Embuste cumpriu 28 mandados judiciais, sendo quatro de prisão temporária, quatro de condução coercitiva, 15 de busca e apreensão e cinco mandados de sequestro de bens, todos autorizados pela Justiça Federal de Montes Claros. Pelos dados da PF, os envolvidos são reincidentes. O bando já teria fraudado, neste ano, ao menos dois processos seletivos: o vestibular na cidade de Mineiros (GO), em 15 e 16 de outubro, e a concorrência para medicina, em Vitória da Conquista (BA), em 22 e 23 do mês passado.

O repasse das respostas era feito para o Brasil inteiro. “No decorrer das investigações, a Polícia Federal conseguiu identificar o repasse de gabaritos, mediante moderna central telefônica via celular, para candidatos situados em diversas partes do país, em evidente fraude ao Enem 2016”, diz a nota divulgada pela assessoria de imprensa da PF.

Líder de ocupação faz o exame

Apoiador do movimento de ocupação das escolas, o presidente da União Paranaense dos Estudantes Secundarista (Upes), Matheus dos Santos, participou do Enem no fim de semana. O estudante foi criticado nas redes sociais. Para muitos internautas, se as ocupações impediram que milhares fizessem a prova, ele também não deveria ter feito. Ao Correio, Matheus disse que o argumento é “esdrúxulo”. “Também tenho o sonho de entrar na universidade. Como outros 8 milhões de alunos, minha prova foi neste fim de semana. Os que tiveram o teste adiado, também farão o Enem. Ninguém foi prejudicado”, sustentou.