Correio braziliense, n. 19524, 08/11/2016. Política, p.4
Nova frente de mudança do foro na CCJ da Câmara
Natália Lambert
#XôPRIVILÉGIO » Deputados pretendem acelerar tramitação da proposta que acaba com o benefício de as autoridades serem julgadas em instâncias superiores. Outro texto, com o mesmo teor, avança no Senado.
Após 11 anos de tramitação na Câmara dos Deputados, coordenadores de partidos da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) se reúnem, na tarde de hoje, às 14h, para debater a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 470/2005, que, junto a 11 matérias semelhantes, propõe mudanças no foro de prerrogativa para crimes comuns de autoridades públicas. A intenção do presidente do colegiado, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), é encontrar um consenso para que o tema seja apreciado, no máximo, na próxima semana. “Até o fim do mês, a gente vota com certeza”, garante Serraglio.
O presidente da comissão explica que alguns parlamentares queriam esperar a realização de audiências públicas com juristas e ministros do Supremo para esclarecer se a questão pode interferir na separação de Poderes, mas o deputado acredita que é melhor deixar o debate para a comissão especial, que tratará o tema em 40 sessões e chegará a um projeto final, caso a matéria seja aprovada na CCJ. “A proposta está na pauta da comissão, mas quero conversar com os representantes dos partidos para que a gente separe um dia somente para esse tema”, esclarece. Apesar de saber que a ideia é polêmica entre parlamentares, Serraglio acredita que não haverá muita briga. “É um assunto muito tortuoso para se enfrentar neste momento”, comenta o parlamentar, que defende a prerrogativa somente para os presidentes dos três Poderes.
Depois de muitas idas e vindas, o relator da matéria desde 2009, deputado Efraim Filho (DEM-PB), está otimista que conseguirá votá-la. Segundo ele, a resistência ao tema já foi muito maior na Casa e o caminho é que se consiga construir maioria para aprová-lo, pelo menos, na comissão. “É uma demanda da sociedade. O Parlamento não pode ser cego e surdo à voz das ruas. O foro privilegiado é um resquício aristocrático na Constituição”, comenta Filho. O relator explica que a PEC 470, originalmente, extingue a prerrogativa somente para deputados e senadores, mas, em seu parecer, ele propõe a admissibilidade de outras PECs que retiram o benefício de todas as autoridades públicas. “A ideia é aprovar a admissibilidade na CCJ e o mérito da matéria ser mais bem definido na comissão especial”.
Atualmente, prefeitos, deputados estaduais, governadores, desembargadores, membros dos Tribunais Regionais Federais, Eleitorais e do Trabalho, presidente e vice da República, ministros, membros dos tribunais superiores, senadores e deputados federais são contemplados pelo benefício de serem julgados somente em instâncias superiores. Ao todo, estima-se em 22 mil profissionais no país. Para Filho, o foro privilegiado cumpriu um papel importante na história quando protegeu parlamentares que fizeram oposição ao regime militar e contribuíram para o retorno da democracia, mas é um modelo que se esgotou. “O foro parece, talvez, o maior símbolo da impunidade no Brasil. E, se a prioridade hoje é o combate à corrupção, é preciso que ele acabe para todos os Poderes.”
Apoio
No Senado, também caminha a PEC 10/03, de autoria do senador Alvaro Dias (PV-PR), que determina o fim do foro privilegiado para autoridades em casos de crimes comuns. Relator da matéria, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) pretende ler o relatório na sessão de amanhã para que ele possa ser votado na semana que vem. Defensor do fim do benefício desde os tempos em que atuava na Câmara dos Deputados, o senador Reguffe (sem partido–DF) apoiou a PEC ontem em plenário. “Todos os brasileiros devem ser iguais perante a lei e todos devem ter tratamento igual. Alguns falam: ‘Mas vai deixar na mão de um juiz de primeira instância?’ Todos os brasileiros estão na mão de um juiz de primeira instância. Que desconfiança é essa com juízes de primeira instância? Nós temos que acreditar nas instituições brasileiras, acreditar no Poder Judiciário. O foro privilegiado hoje não passa de fermento e de instrumento da impunidade”, afirma Reguffe.
Assassinatos “incompreensíveis”
A presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, afirmou ontem que o número de homicídios no Brasil, superior ao de países que estão em guerra, é “incompreensível”. No ano passado, 58 mil pessoas foram assassinadas, resultando em uma média de 170 assassinatos por dia. Cármen discursou durante a cerimônia de abertura do Mês Nacional do Júri, no Tribunal de Justiça do Distrito Federal. “O número de mulheres assassinadas só pela circunstância de ser mulher não condiz com nenhuma situação aceitável no momento em que vivemos”.