O Estado de São Paulo, n. 44956, 17/11/2016. Política, p. A4

Agenda contra Judiciário e MP avança no Congresso

Deputados articulam texto para explicitar anistia ao caixa 2 e insistem em endurecer punição a juízes, procuradores e promotores; Renan marca votação de lei de abuso de autoridade
 

Propostas que na visão de procuradores e magistrados têm potencial para enfraquecer investigações, especialmente a Operação Lava Jato, avançaram ontem no Congresso Nacional.

Na Câmara dos Deputados, partidos se articularam para alterar pontos do parecer apresentado por Onyx Lorenzoni (DEM-RS), relator do pacote de medidas contra a corrupção. Um grupo de parlamentares ameaça apresentar um relatório paralelo para tornar explícita a anistia ao caixa 2 cometido até a publicação de uma nova lei que criminaliza a prática. Deputados também articulavam a mudança de integrantes da comissão e o retorno ao texto do endurecimento das regras de punição a juízes, procuradores e promotores. A movimentação na comissão da Câmara gerou reação do procurador Deltan Dallagnol, que no Facebook acusou “lideranças partidárias” de “manobras” de última hora. “Isso é um desrespeito com os mais de 2 milhões de brasileiros que assinaram o projeto de iniciativa popular”, disse o coordenador da força-tarefa em Curitiba.

A articulação contra o parecer de Lorenzoni acabou por adiar a votação do texto da comissão especial. A previsão inicial era de que a proposta fosse votada ontem mesmo no plenário da Casa. O local acabou sendo invadido à tarde por de cerca de 50 pessoas – manifestantes que se intitularam de direita e disseram que tinham como bandeiras a intervenção militar, o combate à corrupção e o apoio ao juiz Sérgio Moro e à Lava Jato. A invasão gerou tumulto e brigas no plenário. Uma porta de vidro foi quebrada. O ato organizado pelo aplicativo WhatsApp ocupou a Mesa Diretora da Casa e pedia o fechamento do Congresso. O presidente Michel Temer classificou o caso como “uma afronta à instituição que representa a soberania popular”. Na outra Casa legislativa, o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), acelerou a tramitação do projeto que modifica a lei de abuso de autoridade e agendou a votação da proposta diretamente em plenário no dia 6 de dezembro. O senador Roberto Requião (PMDB-PR) foi anunciado como relator do projeto.

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Deputados articulam texto paralelo com anistia explícita para caixa 2

Parlamentares de siglas como PMDB, PP, PSDB e PT trabalham para flexibilizar pacote anticorrupção na Câmara

Por: Igor Gadelha e Isadora Peron

 

Deputados de diversos partidos, entre eles PMDB, PP, PSDB e PT, trabalharam ontem para tentar flexibilizar o pacote de medidas de combate à corrupção enviado pelo Ministério Público Federal (MPF) ao Congresso.

Diante da ofensiva, a votação do relatório final da comissão especial para debater as medidas, que estava prevista para ocorrer na tarde de ontem, foi adiada para hoje.

Os parlamentares querem que o relator da proposta, deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), mantenha no texto a previsão de crime de responsabilidade para juízes, procuradores e promotores, além da anistia para quem praticou caixa 2. Ontem, parlamentares atuaram para convencer o relator a fazer as alterações em seu parecer. O grupo que articula as mudanças se diz insatisfeito com o relatório apresentado pelo deputado gaúcho.

“Não podemos privilegiar um seguimento em detrimento de outro. Se ele não atender aos nossos apelos e voltar o que estava no relatório e foi acordado conosco, com certeza vai ser aprovado um substitutivo”, disse o deputado Danilo Forte (PSB-CE).

Diante da resistência inicial do relator em mudar o texto, deputados propuseram pareceres alternativos e emendas. Os deputados Fausto Pinato (PP-SP) e Félix Mendonça (PDT-BA), apresentaram votos em separado nos quais sugerem, por exemplo, a inclusão de juízes e membros do Ministério Público no rol de autoridades que estão sujeitas a responder por crime de responsabilidade. A medida, que não constava no pacote original do MP, foi incluída pelo relator em seu parecer, mas retirado após conversa com integrantes da força-tarefa da Operação Lava Jato. A retirada irritou outros deputados.

Um grupo também articula um parecer alternativo no qual estará explícita a anistia a políticos, partidos e empresas que cometeram crime de caixa 2 antes da aprovação do pacote anticorrupção.

No relatório de Lorenzoni, essa anistia não estava explícita.

Mesmo assim, a interpretação de parte dos deputados é de que a tipificação da prática no Código Penal pressupõe que a conduta não representava crime antes. Esse entendimento, no entanto, dependeria de um aval da Justiça. O objetivo com a inclusão da emenda é que o “perdão” para quem praticou o caixa 2 antes da aprovação da lei seja automático.

No fim do dia, após dizer que não iria admitir um “golpinho” contra o texto, Lorenzoni indicou que poderá fazer mudanças.

 

Comissão. Caso a pressão não tenha efeito, a estratégia deve ser tentar derrotar o relatório de Lorenzoni na comissão. Ontem, PT e PP mudaram parte de seus integrantes no colegiado. Nas redes sociais, o procurador da República Deltan Dallagnol, da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, afirmou que as mudanças estariam sendo realizadas para que os novos titulares votassem contra o pacote. “Sentindo- me profundamente desrespeitado, como cidadão”, disse o procurador no Facebook.

O presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), João Ricardo dos Santos, acusou parlamentares de utilizarem o pacote do MPF para tentar barrar a Lava Jato. “Virou um projeto pró-corrupção”, afirmou.

 

PRINCIPAIS PONTOS

Lei de abuso de autoridade

O que é

Prevê punição em casos como publicidade de investigação antes de ação penal ou por constrangimento causado por depoimento sob ameaça de prisão.

Trâmite

Há impasse porque a Lava Jato critica o texto por avaliar que ele cerceia alguns dos métodos de investigação.

 

Anistia para caixa 2

O que é

Medida prevê de forma explícita extinção da punibilidade, ou a anistia ao caixa 2, praticada até a publicação de uma nova lei que criminaliza a prática.

Trâmite

Pressão por anistia acabou por adiar a votação do texto da comissão que analisa as medidas anticorrupção, uma vez que o relator se recusa a incluir a anistia explícita.

 

Anistia a executivos em caso de acordo de leniência

O que é

Medida prevê a extinção da punibilidade penal a executivos de empresas acusadas de corrupção que fecharem acordos de leniência.

Trâmite

O relator do projeto, o líder do governo André Moura (PSCSE), deve finalizar a nova redação do texto ainda nesta semana.