Correio braziliense, n. 19521, 05/11/2016. Política, p. 2

Um terço de deputados e senadores na berlinda

São pelo menos 150 parlamentares na Câmara e 24 no Senado investigados no Supremo. Em julgamento em andamento no STF, seis ministros já se mostraram favoráveis a proibir réus de assumirem cargos na linha sucessória do Planalto

Por: Paulo de Tarso Lyra

 

O julgamento, ainda não concluído no Supremo Tribunal Federal (STF), definindo que réus não podem concorrer às presidências da Câmara e do Senado, por estarem diretamente na linha sucessória do Palácio do Planalto, impõe um funil considerável aos candidatos a comandar deputados e senadores. Sem dados oficialmente divulgados pelo STF, a estimativa é que 30% dos congressistas estejam sobre investigação na Corte. Seriam pelo menos 150 deputados e 24 senadores, incluindo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que responde a 12 inquéritos.

A análise da ação movida pela Rede Sustentabilidade foi suspensa por um pedido de vistas do ministro Dias Toffoli, após receber seis votos favoráveis. “Não acredito que haja algum tipo de reversão nesse placar. Além disso, a pausa pode ser importante para que outros ministros reflitam sobre a matéria”, declarou o líder da Rede na Câmara, Alessandro Molon (RJ). “É muito razoável que parlamentares que sejam efetivamente réus não desejem comandar o Congresso”, ponderou.

Na lista de deputados investigados, aparecem muitos que exercem posições de destaque em suas legendas ou no próprio parlamento. Um dos congressistas que respondem a ações penais no STF é o atual líder do governo na Câmara, André Moura (PSC-SE). Contra ele correm três ações, uma por improbidade e duas por crime de responsabilidade.

Na época em que foi escolhido para comandar o governo na Casa, Moura afirmou se sentir bastante tranquilo em relação às investigações e não achava que isso poderia ser um impeditivo para ele assumir o posto. “Acho que a medida poderia ser até mais abrangente. Não acho que parlamentares que sejam réus de fato deveriam assumir cargos de mais responsabilidade e visibilidade”, defendeu o presidente nacional do PPS, deputado Roberto Freire (SP). “A questão não é apenas estar na linha sucessória, é ter postos de destaque”, afirmou. Freire lembrou que, no serviço público, há um entendimento de que servidores investigados devem ser afastados no decorrer das apura- ções. “Por que essa regra não valeria para os políticos?”, questionou. Freire acha que um dos riscos é fulanizar o debate. Embora a ação da Rede no STF tenha sido batizada de Ação Renan, o presidente do PPS disse que ela poderá dar uma moralizada de maneira geral.

Para o líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM), se um presidente da República não pode ser réu e permanecer no cargo, por que a regra para os comandos da Câmara e do Senado deveriam ser diferentes? O deputado torce para que, mesmo enquanto o STF não concluir a votação, a simples maioria já pronunciada seja suficiente para coibir candidatos que venham, posteriormente, a enfrentar problemas com a Justiça. “Evidentemente que a regra não vale apenas para alguns nomes. Mas não podemos esquecer que, se Eduardo Cunha não tivesse assumido a presidência da Câmara, muito provavelmente a Rede não teria apresentado ação semelhante no Supremo”, acrescentou.

O líder do PT na Câmara, Afonso Florence (BA), acha a proposta boa, mas mantém suas ressalvas. “Nós tivemos, recentemente, um deputado (Marx Beltrão, do PMDB de Alagoas), réu no STF, que assumiu um ministério (Turismo). E Lula, que sequer era oficialmente investigado na época, não pôde assumir a Casa Civil da presidente Dilma”, lembrou o petista. Florence teme essa discrepância de avalia- ções e afirma que, em tempos de “governos ilegítimos”, podem ser tomadas medidas perigosas, restritivas, de exceção.

Embora ainda pretenda consultar os “juristas” da bancada, como os deputados Paulo Teixeira (SP) e Wadih Damous (RJ), Florence acha que a decisão que se delineia no STF pode ser uma medida draconiana. “Se o parlamentar já tiver sido condenado, entende-se a proibição. Mas quando ele se torna réu, após o aceite da denúncia, ainda há um amplo espaço para a defesa. Se ele for inocentado posteriormente, como fica o desgaste político?”, questionou Florence.

 

Frase

"Acho que a medida poderia ser até mais abrangente. Não acho que parlamentares que sejam réus de fato deveriam assumir cargos de mais responsabilidade e visibilidade”

Roberto Freire, presidente nacional do PPS