A nova Previdência

Martha Beck e Geralda Doca

03/12/2016

 

 

Governo enviará texto ao Congresso na terça, depois de discutir com partidos e sindicatos

 

A proposta de reforma da Previdência que o governo enviará ao Congresso na terça-feira vai prever idade mínima de aposentadoria de 65 anos e desvinculação das pensões do salário mínimo. Todos os trabalhadores com até 50 anos (homens) de idade e 45 anos (mulheres) terão que seguir integralmente as novas exigências. Para os mais velhos, haverá regra de transição. Segundo fontes do Palácio do Planalto, a ideia é enviar uma proposta mais rigorosa para dar margem a negociações no Congresso. As Forças Armadas, porém, não serão incluídas nas mudanças. Ainda não foi decidido se a reforma vai atingir os parlamentares. Para aliviar as contas dos estados, professores terão as regras para aposentadoria equiparadas às dos demais trabalhadores. Policiais militares e bombeiros terão idade mínima para se aposentar. A proposta de reforma da Previdência, que o governo planeja enviar ao Congresso Nacional na próxima terça-feira, vai incluir medidas para ajudar a resolver a crise fiscal dos estados. Segundo uma fonte a par das discussões, o texto da proposta de emenda constitucional (PEC) propõe mudanças no regime especial de policiais militares e bombeiros, que deverão ter regras mais duras para se aposentar. O Executivo pretende ainda ampliar a lista de receitas tributárias que os entes da federação poderão oferecer como garantia nas operações de crédito para antecipação de recursos. Hoje, a Constituição limita esse rol a tributos sobre a renda, IPVA e Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural (ITR), entre outros.

O presidente Michel Temer se reúne com as centrais sindicais, federações e líderes dos partidos da base na noite de segunda-feira para apresentar a reforma. Antes, ele apresentará o texto aos líderes dos partidos. Será uma proposta dura, resumiu uma fonte do Planalto, para que dê margem ao processo de negociação com o Congresso. Vai atingir os atuais trabalhadores dos setores púbico e privado, inclusive rurais, com até 50 anos (homens) e 45 anos (mulheres e professores), que não poderão se aposentar antes dos 65 anos — independentemente do tempo de contribuição. Quem estiver acima dessa faixa etária será enquadrado na regra de transição, pagando pedágio de 50% (adicional sobre o tempo de contribuição que faltava) para requerer aposentadoria pela legislação atual.

Segundo os técnicos que acompanham o assunto, por saber que a reforma enfrentará forte resistência, o governo optou por encaminhar medidas mais duras. Eles explicam que ficará mais fácil negociar no Congresso com normas mais rígidas do que encaminhar uma PEC mais benevolente, que poderia ser excessivamente desvirtuada. O texto já foi encaminhado à Casa Civil.

De acordo com a última versão do texto da PEC, os benefícios assistenciais (Loas, concedido a idosos e deficientes de baixa renda) não mais seguirão a política de reajuste do salário mínimo, que permite ganhos reais. A idade para receber o benefício subirá dos atuais 65 para 70 anos. As pensões por morte também serão desatreladas do salário mínimo. O governo pretendia desvincular o piso previdenciário do mínimo, mas chegouse à conclusão que isso é cláusula pétrea.

A PEC vai mexer também no cálculo do benefício. Segundo um técnico envolvido nas discussões, o valor deverá cair para 51% sobre a média das contribuições mais 1% por ano adicional de contribuição. Dessa forma, quem começou a trabalhar aos 16 anos, por exemplo, com 49 anos de contribuição alcançará a idade mínima de 65 anos e poderá receber o benefício integral. Para estimular as pessoas a postergarem a aposentaria, a idade para a aposentadoria compulsória subirá de 70 para 75 anos para todos os servidores públicos.

Além de vedar o acúmulo de benefícios (aposentadoria e pensão), a proposta reduz o valor da pensão para 50%, mais 10% por dependente, no limite de 100%, para todos os trabalhadores. A reforma cria ainda uma contribuição obrigatória para os trabalhadores rurais, que atualmente podem se aposentar apenas com a comprovação de atividade no campo.

Atendendo ao pleito dos governadores, o Executivo também decidiu elevar a alíquota de contribuição dos servidores da União, que funciona como piso para os regimes estaduais, de 11% para 14%. Mas não dentro da PEC. Como essa é uma matéria de lei ordinária, será encaminhado um projeto à parte. Os governadores já se comprometeram a fazer o mesmo em seus estados.

As Forças Armadas, no entanto, ficaram de fora da PEC, devido à reação dos militares. A ideia é alterar o regime previdenciário desses servidores posteriormente. Já em relação aos parlamentares, que seguem as normas de aposentadoria dos servidores públicos, Temer ainda vai bater o martelo se eles serão incluídos ou não na reforma, com benefício limitado ao teto do INSS (R$ 5.189).

A PEC vai também alterar as regras de aposentadoria especial de quem trabalha em atividade de risco ou lida com agentes nocivos à saúde, nos setores público e privado. Hoje, eles se aposentam com 15, 20 e 25 anos de contribuição, conforme a área de atuação, sem idade mínima.

No Brasil, 44% dos ocupados começam a trabalhar antes dos 14 anos, na página 20

 

AS PRINCIPAIS MUDANÇAS

IDADE MÍNIMA: Será de 65 anos para requerer aposentadoria. O tempo mínimo de contribuição passa de 15 para 25 anos. As regras valerão para todos os trabalhadores, dos setores privado e público.

TRANSIÇÃO: Quem tem menos de 50 anos (homens) e 45 anos (mulheres e professores) deverá obedecer às novas regras integralmente. Acima dessa faixa etária, haverá uma regra de transição, com tempo adicional para requerer aposentadoria. Aposentados e quem completar os requisitos para pedir o benefício até a aprovação da reforma não serão afetados.

APOSENTADORIAS ESPECIAIS: A proposta inclui professores, que atualmente podem se aposentar cinco anos antes, cujas regras serão equiparadas às dos demais trabalhadores. Para policiais militares e bombeiros, será fixada idade mínima. Trabalhadores rurais terão de começar a contribuir para a Previdência.

FORÇAS ARMADAS E PARLAMENTARES: Os militares não foram incluídos no texto da PEC. Quanto aos parlamentares, o Planalto ainda vai bater o martelo se eles entrarão ou não na reforma.

DESVINCULAÇÃO DO MÍNIMO: Os benefícios assistenciais (Loas) não serão mais vinculados ao salário mínimo. Já o piso previdenciário continuará seguindo os reajustes: o governo entendeu ser uma cláusula pétrea.

 

 

O globo, n. 30434, 03/12/2016. Economia, p. 19.