Correio braziliense, n. 19525, 09/11/2016. Brasil, p. 6

Temer critica estudantes por ocupação de escolas

 
Julia Chaib
Antonio Temóteo

 

Após provocarem o adiamento do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para uma parcela dos inscritos, as ocupações das escolas pelo país foram alvo de críticas diretas do presidente da República, Michel Temer. Em discurso ontem na Confederação Nacional da Indústria para empresários, banqueiros e analistas de mercado, o chefe do Executivo afirmou que os brasileiros precisam aprender a respeitar as instituições e que, ao ocupar prédios públicos, utilizam argumento “físico”, e não intelectual ou verbal. Temer ironizou ainda os estudantes ao sugerir que eles não sabem do que se trata uma proposta de emenda à Constituição (PEC).

A PEC 55, que estipula um teto para gastos públicos atrelado à inflação do ano anterior, é um dos alvos de críticas do movimento, como também a medida provisória da reforma do ensino médio. As mudanças propostas para flexibilizar o currículo, como a retirada da obrigatoriedade de algumas disciplinas, a exemplo da filosofia, motivou as ocupações, que tiveram início em setembro. No último domingo, cerca de 271 mil alunos deixaram de fazer a prova do Enem porque fariam a avaliação em um dos 405 locais de prova ocupados até então. O teste será aplicado em 3 e 4 de dezembro. Fizeram a prova na data marcada inicialmente 5.848.619 alunos.

Ontem, Temer criticou abertamente o movimento. “Nós precisamos aprender no país a respeitar as instituições, e o que menos se faz hoje é respeitar as instituições. (...)  É interessante, hoje, em vez do argumento oral, do argumento intelectual, ou que não seja intelectual, mas o argumento verbal, usa-se o argumento físico. A pessoa vai e ocupa não sei o quê, bota pneu velho e queima na estrada para impedir o trânsito, o argumento é argumento físico”, disse Temer.

O presidente, em seguida, ironizou os estudantes. “Eu vi uma entrevista uma ocasião, desses que ocupam: ‘Você sabe o que é uma PEC?’. ‘PEC é Proposta de Ensino Comercial’. Quer dizer, as pessoas não leem um texto. E não estou dizendo dos que ocupam ou não ocupam, estou dizendo no geral. A vida é assim: as pessoas debatem sem discutir, sem sequer ler o texto”, afirmou o presidente.

Apesar de ainda não existir uma discussão concreta no governo para suspender a tramitação da MP do ensino médio e transformá-la em projeto de lei — cuja tramitação não tem prazo —, o presidente ainda disse que, se for preciso alterar a matéria, isso será feito. Uma das críticas do movimento é que MP tem 120 dias para ser votada, tempo curto para um debate amplo em relação à reforma. O governo justificou ter proposto as mudanças no ensino por meio de MP devido à urgência de aprimorar a etapa escolar, porque um projeto de lei com o mesmo tema tramita desde 2013 no Congresso a passos lentos. “Se for necessário votar um projeto de lei, nós votaremos”, disse Temer.

 

Críticas

O Ministério da Educação estima um prejuízo de cerca de R$ 15 milhões com o adiamento do Enem por causa da ocupação das escolas. Em entrevista, o ministro da Educação, Mendonça Filho, chegou a dizer que estuda cobrar dos movimentos estudantis os danos causados. Em nota, a União Nacional dos Estudantes (Une), a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes) e a Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG) repudiaram a declaração do ministro.

Além de o Enem ter sido adiado para uma parcela dos inscritos, a Polícia Federal também prendeu, no domingo, suspeitos de terem tido acesso ao tema de redação da prova com antecedência. Mesmo assim, ontem, a secretária-executiva do MEC, Maria Helena de Castro, garantiu que o teste não será anulado. “Não há risco de cancelamento da prova, nem da redação. A situação está muito circunscrita”, afirmou.