Correio braziliense, n. 19521, 17/11/2016. Opinião, p. 15

Maduro e seus militares

 

O presidente Nicolas Maduro, da Venezuela, criou uma estrutura militar que ele provavelmente supõe capaz de sustentá-lo em palácio. O general Vladimir Padrino Lopez, ministro da Defesa, tido não se sabe com que grau de autenticidade, como porta-voz dos quartéis, já lhe deu apoio militar. A oposição tem meios constitucionais para tirá-lo do poder, item maior da mediação do papa, com um momento de redução de tensões.

Procurando dizer que não se tornou ditador e nem pretende tornar-se, o general López trata de desfazer suposições a respeito de suas novas funções. Já ministro da Defesa, assumiu a chefia de um novo comando nacional, com a “grande missão” de administrar abastecimento “soberano e seguro”. Leia-se lotar prateleiras vazias. Os portos são ocupados por tropas sob sua chefia. A ele ficaram subordinados todos os outros ministérios e instituições do Estado.

Na práica, diz a Latin News, o general López passou a ter mais poderes do que o presidente e reitera a todo momento, inclusive diante de câmeras de tevê, que a criação de um novo comando, capaz de escapar de controle, é de fato uma quartelada. “Não gosto de presenciar intervenção militar em áreas que não são de nossa natureza, mas o que acontece é questão de segurança nacional e de defesa da mãe pátria”, justificou-se. Fala, na realidade, de protestos populares.

Mortes, descontroles de fronteiras, sobretudo com a Colômbia, cruzadas diariamente por milhares de venezuelanos à procura de alimentos e de produtos de higiene cujos suprimentos o governo quer normalizar à força. A oposição política fala de um grau improcedente de militarização, o que levou o general López a reiterar negativa diante de câmeras de tevê. “Mas se trata de fato de completa militarização do governo”, insistiu Luis Manuel Esculpi, com a experiência de antigo chefe da comissão das Forças Armadas da Assembleia Nacional. “O exército se tornou a única fonte de autoridade do presidente Maduro.

O deputado Júlio Borges, da Mesa de Unidade Democrática (MUD), coalizão de grupos de oposição, diz que Maduro entregou as chaves do Palácio Presidencial de Miraflores a um chefe militar incapaz de lidar com a crise econômica, o que significaria “mais corrupção e menos produção”. Formou-se, diz Borges, um quadro notável: “Generais do exército, agora, a cargo de empresas de importação de alimentos”.

Críticos sustentam que tais oficiais e seus parceiros chavistas já acumularam, ao longo dos anos, ganhos especulativos, jogando com preços fixos e taxas de câmbio. Outros sugerem que Maduro, de forma deliberada, vai colocando os oficiais militares a par do que “se passa de fato”, talvez com agenda de uma renúncia negociada. Mas, arriscam analistas, a militarização carrega um risco, os quartéis podem se fortalecer popularmente e os militares acabem decidindo derrubar, eles próprios, as portas do palácio.

Num grau logo abaixo do general López, outro general, Efraín Velasco, assumiu o comando da Autoridade Nacional dos Portos. Ela terá controle direto dos cinco maiores portos da Venezuela: Maracaibo, Puerto Cabello, Guamache, Cuenta e La Guairá. Também foi assinado decreto que obriga todas as empresas, públicas e privadas a colocarem seus funcionários à disposição do governo. Serão mandados aos campos com a tarefa de encarar a crise de abastecimento de alimentos. Trabalho escravo, acusam ONGs.

Ao mesmo tempo, Maduro reagiu com gestos de desafio a sentenças de tribunais dos Estados Unidos envolvendo militares venezuelanos. O general Néstor Reverol foi nomeado ministro do Interior, um dia depois de indiciado em tribunais americanos sob acusações envolvendo tráfico de drogas. Reverol foi removido do comando da Guarda Nacional Bolivariana (polícia militar) sem qualquer explicação, alem de ser saudado por Maduro por honestidade e trabalho árduo. Antes, com Hugo Chávez, dirigiu a agência antidrogas, subordinada ao Ministério do Interior.

Um sócio de Reverol seria o adido militar na Alemanha. Ambos são acusados de usar suas posições de poder em favor do narcotráfico. Maduro reagiu falando de “renovado ataque à Venezuela por parte do império americano”. Saudou Reverol como tendo quebrado recordes na captura de traficantes de drogas quando dirigiu a agência encarregada de fazê-la.

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» NEWTON CARLOS

Jornalista