Correio braziliense, n. 19534, 18/11/2016. Política, p. 7

Turbulência política segura a recuperação

Analistas temem que aumento da instabilidade institucional e aprofundamento da crise fiscal dos estados possam atrasar a retomada da economia. Índice de atividade do Banco Central caiu 0,78% no 3º trimestre e acumula recuo de 4,83% no ano

Por: ANTONIO TEMÓTEO

 

A escalada da crise política no país, que teve como último episódio a prisão do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (PMDB), deixou o mercado e o setor produtivo em alerta. Analistas e empresários temem que mais caciques peemedebistas sejam presos na Operação Lava-Jato e a turbulência traga instabilidade institucional e afete ainda mais a economia.

A situação preocupa o vice-presidente de Relações Institucionais da Serasa Experian, Paulo Melo. Ele explicou que os varejistas estão otimistas com a possibilidade de aumento de vendas em novembro e dezembro. Entretanto, a escalada das manifestações no Rio de Janeiro e a possibilidade de outros estados não honrarem o pagamento do 13º salário dos servidores pode prejudicar o faturamento das companhias.

Melo comentou que parte do mercado espera uma recuperação da atividade econômica a partir do segundo semestre de 2017, mas uma nova crise política poderia prejudicar esse processo. “A instabilidade política não ajuda. Já temos várias revisões das projeções de crescimento no próximo ano, e a retomada demoraria mais”, disse.

 

Projeções

Em meio ao aumento dos riscos políticos, o Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), divulgado ontem, registrou queda de 0,78% no 3º trimestre. Nos nove primeiros meses do ano, a retração chega a 4,83%. Em setembro, o indicador subiu 0,15%, abaixo da estimativa do mercado, que esperava aumento de 0,2%. O diretor de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, Octavio de Barros, destacou que o resultado do mês refletiu, majoritariamente, a alta de 0,5% da produção industrial.

Barros disse que a queda do IBC-Br no trimestre o levou a projetar recuo de 0,8% do Produto Interno Bruto (PIB) no mesmo período. O resultado oficial será divulgado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 30 de novembro. O economista-chefe do banco Haitong, Jankiel Santos, lembrou que tem sido frequente, nas declarações de diretores do BC, a afirmação de que os primeiros sinais de retomada já começam a surgir. “Entretanto, a divulgação do índice compilado pela própria instituição poderá levar a autoridade monetária a rever tal prognóstico”, afirmou.

Santos explicou que o cenário indica forte possibilidade de que o resultado do PIB no terceiro trimestre será pior que o esperado. “Caso isso seja confirmado, a onda de revisões baixistas nas projeções de crescimento para este ano e o próximo deverá se intensificar e abarcar também a própria autoridade monetária”, destacou. Ele ainda comentou que, com o prolongamento da recessão, haverá maior deflação e as projeções para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) tendem a diminuir ainda mais.

 

Mudança de cenário

O IBC-Br do 3º trimestre decepcionou, avaliou o economista-chefe do Itaú Unibanco, Mário Mesquita. Ele explicou que, embora a produção industrial tenha aumentado em setembro, a alta não compensou o recuo do mês anterior. “A queda do PIB no 3º trimestre deve ser mais forte do que temos no cenário, de 0,5%. Embora isso coloque um viés de baixa para nossa projeção do PIB em 2016, vale notar que a divulgação do PIB do terceiro trimestre trará informações adicionais, com a provável revisão da série histórica”, comentou.

Para o próximo ano, Mesquita ressaltou que os indicadores antecedentes e os fundamentos continuam sugerindo uma melhora da atividade econômica, liderada pela indústria. Com isso, ele manteve as projeções de queda de 3,2% do PIB, em 2016, e de crescimento de 2%, em 2017. Mas alertou que ambas poderão ser revistas à luz dos dados das contas nacionais do terceiro trimestre, que devem ser divulgados no fim de novembro. “Quanto ao mercado de trabalho, mantemos a projeção para a taxa de desemprego, de 12,5% no fim deste ano, e de 12,2% em dezembro de 2017”, disse.

A prisão de Sérgio Cabral, depois do encarceramento do também ex-governador do Rio Anthony Garotinho, traz turbulência ao cenário local”, avaliou o economista-chefe do Home Broker Modalmais, Álvaro Bandeira. “Isso dificulta os ajustes que o governador Pezão tenta fazer, que têm provocado transtornos aos cariocas. As votações serão ainda mais complicadas pelo fato de Pezão ter sido da equipe de Cabral”, destacou.

Na opinião do economista-chefe do Banco Goldman Sachs, Alberto Ramos, a economia brasileira continuará a enfrentar dificuldades. Para ele o país ainda tem um mercado de trabalho fraco, altos níveis de endividamento das famílias, fraca demanda externa e baixa confiança de consumidores e empresas.

 

PIB de 2014 foi maior

O Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu mais em 2014 do que o estimado anteriormente. A alta foi revista de 0,1% para 0,5%, segundo divulgou ontem o IBGE, com base nas Contas Nacionais Anuais. O dado anterior tinha como base as Contas Nacionais Trimestrais. O resultado pode mudar o início do ciclo de recessão que o país atravessa até hoje. De acordo com as Contas Trimestrais, o PIB começou a cair no segundo trimestre de 2014 ante o mesmo período do ano anterior, acumulando uma sequência de nove resultados negativos até o segundo trimestre de 2016, último resultado conhecido. Os resultados referentes ao terceiro trimestre deste ano serão divulgados no próximo dia 30. Os dados dos trimestres anteriores também devem ser revistos para incorporar as novas informações.