Título: Vereadores no mundo da fantasia
Autor: Maciel, Alice
Fonte: Correio Braziliense, 20/11/2011, Política, p. 9

A criatividade impera em projetos que tramitam em câmaras municipais. Vale proibir morrer e exigir lixo cheiroso

Se esta cidade fosse minha, as pessoas seriam proibidas de morrer, os cachorros não latiriam depois das 22h e não teriam nomes de gente, os cavalos seriam atendidos em postos de saúde, o lixo seria cheiroso, os mendigos não beberiam cachaça e todos os restaurantes venderiam refrigerante de um litro. Parece que defender os interesses da população e promover melhorias nos serviços públicos nem sempre são prioridade dos vereadores brasileiros que lotam as câmaras municipais com propostas inviáveis como essas que tramitaram ou estão tramitando nos legislativos.

Entre as propostas apresentadas país afora, não foi difícil encontrar projetos tão ou mais absurdos do que os dos da capital mineira. E não precisa ir muito longe. Em São João del-Rei, na Região Central de Minas Gerais, a vereadora Silvia Fernandes propôs morte aos animais que permanecessem mais de 48h nas ruas. O projeto de lei gerou revolta nos moradores, que chegaram a fazer passeata contra a ideia. A justificativa da proposta seria a de fazer a sociedade refletir sobre o problema.

Donos de bichos de estimação também se uniram contra o projeto que tramitou na Câmara de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, que propunha a lei do silêncio para animais. O dono do cachorro que latisse depois das 22h seria multado. A pressão foi tão grande que o projeto acabou sendo arquivado. Outros animais incomodaram os vereadores de Porto Alegre não pelo barulho, mas pela sujeira. A Câmara Municipal aprovou o projeto de lei que obriga os cavalos a usarem fraldas. Quem desrespeitar a regra terá de pagar R$ 246. De autoria do vereador Adeli Sell (PT), a lei não inclui, no entanto, o uso de bolsas coletoras de fezes em animais que participam de eventos ou cavalgadas. "O projeto foi vetado e é uma pena porque a cidade continua imunda", disse o parlamentar, ressaltando que a cidade, que tem muitas carroças, vive suja.

Cemitério Mas não só foram os animais que ocuparam espaço na imaginação dos vereadores. Em Paraíso, no interior de São Paulo, as pessoas não poderiam mais morrer, caso o projeto do então vereador Luiz Carlos Rosa (PPS) fosse aprovado. Em protesto contra a lotação do cemitério, ele proibiu o óbito na cidade. "As sepulturas estão sendo emprestadas para caber o número de mortos e, se nada for feito, as pessoas terão de ser enterradas nas cidades vizinhas", contou. O projeto, apresentado em abril, de tão inusitado, foi ignorado pelos colegas do Legislativo e o próprio vereador o retirou.

Um parlamentar de Juiz de Fora (MG) não proibiu os moradores de morrer, mas, para tentar evitar doenças cardíacas, propôs, no ano passado, que todos os bares e restaurantes apresentassem em seus cardápios, além da quantidade de calorias e de glúten dos alimentos, a necessidade calórica diária por faixa etária. Informação que nem os enlatados têm. O estabelecimento que descumprisse a lei estaria sujeito à multa de R$ 1 mil a R$ 5 mil. Em Manaus, chama a atenção o projeto de lei que quer limitar o uso de roupas brancas aos médicos e profissionais de saúde.