Correio braziliense, n. 19532, 16/11/2016. Economia, p.7

 

Empresas de sucesso com DNA brasiliense

Antonio Temóteo  

 


NEGÓCIOS » Em uma cidade em que a tradição incentiva a procura pela estabilidade e pela segurança do serviço público, empreendedores correm riscos e criam companhias que se destacam no cenário nacional e se tornam referência em seus segmentos.

A tradição brasiliense de formar mão de obra para o setor público não impediu que parte da população optasse por um caminho alternativo e decidisse empreender. O desejo de ter o próprio negócio, somado à disciplina para gerenciar custos e atravessar momentos de crise, levou empresários a construir em Brasília companhias que se tornaram referência nacional nos seus setores. E motivo de orgulho para os moradores do Distrito Federal, que costumam aprender desde cedo que é melhor garantir um bom salário na administração pública do que se arriscar e abrir a própria firma.

Com a maior renda per capita do Brasil, que em 2015 chegou a R$ 2.252, o dobro da média nacional, a capital sempre atraiu empresas dos mais diversos segmentos. Em um mercado dominado por gigantes, como Burger King, MacDonalds e Bobs, a rede de restaurantes Giraffas foi instituída em 1981 por dois amigos que não estavam interessados no serviço público, Carlos Guerra e Ivan Aragão. Para se diferenciar dos concorrentes e não oferecer aos clientes apenas sanduíches, criaram um fast food de comida caseira, com arroz, feijão e carne no cardápio. 

Orgulho

A expansão da empresa ocorreu, de fato, a partir de 1991, quando decidiram fraquear os restaurantes. Das 420 lojas que utilizam a marca, apenas 15 são próprias. E, após se consolidar no Brasil, com pontos de venda em todos os estados, a companhia decidiu entrar no mercado mais competitivo do mundo: os Estados Unidos. Já são quatro unidades em Miami e uma em Orlando, na Flórida. Toda a rede emprega 10 mil pessoas e, mesmo com a crise, continua em expansão. Com uma gestão familiar, a companhia é gerida pela segunda geração e mantém na estrutura um conselho de administração e profissionais contratos no mercado. Aragão, porém, já deixou a sociedade.

Eduardo Guerra, diretor de Expansão do Giraffas, comenta que 35 restaurantes foram abertos em 2016 e outros 36 serão inaugurados no próximo ano. Ele explica que a rede faturou R$ 800 milhões em 2015 e projeta receitas de R$ 805 milhões neste ano. Apesar disso, Guerra ressalta que a turbulência econômica abriu espaço para a negociação de melhores pontos de venda, e unidades serão abertas nos aeroportos de Brasília, Viracopos, Galeão e Curitiba. “Temos orgulho de ser uma empresa brasiliense e recebemos o carinho da população mesmo em outros estados. Já passamos por outras crises e sabemos que elas são passageiras”, afirma. 

Qualidade

Em uma cidade em que 25,7% da população possui 15 anos ou mais de estudos, a maior taxa do país, bom atendimento é uma exigência para empresas que pretendam se consolidar na capital. O Laboratório Sabin, criado em 1984 pelas bioquímicas Janete Vaz e Sandra Costa, colocou a qualidade como meta permanente. Após 32 anos no mercado, a companhia está presente em 10 estados, com 225 unidades e 3,8 mil empregados.

Assediada por bancos e fundos de investimentos interessados em comprar o negócio, a empresa profissionalizou a gestão e, desde 2014, é presidida pela também bioquímica Lídia Abdalla, que teve o primeiro emprego na companhia. Além dela, quatro diretores executivos foram contratados. Desde que assumiu o posto, Lídia adquiriu laboratórios em São José dos Campos (SP), Campo Grande (MS), Ribeirão Preto (SP), Anápolis (GO), Uberlândia (MG), Salvador (BA), Londrina (PR) e Uberaba (MG). Além das análises clínicas, o Sabin expandiu os negócios para diagnósticos por imagens.

Todo o investimento em compras foi feito com capital próprio da empresa, que, em 2015, faturou R$ 560 milhões. À margem da crise, o Sabin espera crescer 28% neste ano. “Estamos em um momento de consolidação, mas continuamos de olho em oportunidades”, conta Lídia. Ela, agora, comanda a transição para a nova sede da empresa, construída em Brasília a um custo de R$ 50 milhões.

Além da qualidade na prestação de serviço, a experiência no setor público foi decisiva para o sucesso de outras companhias. A Bancorbrás, criada em 1983 por ex-empregados do Banco do Brasil (BB) e do Banco Central (BC), consolidou-se no mercado de turismo e expandiu os negócios para seguros e consórcios. A cultura bancária e de regulação foi fundamental para atravessar períodos de turbulência e acumular experiência para diversificar a operação. Com 1.002 empregados a Bancorbrás espera manter este ano os R$ 400 milhões de faturamento de 2015.

Presente em seis estados e no DF, a empresa de capital 100% privado ainda é confundida como uma subsidiária do BB. O diretor de Negócios do Clube de Turismo da Bancorbrás, Reynaldo Miranda de Abreu, comenta que somente seu segmento responde por 80% do faturamento, com 120 mil clientes. A subida do dólar aumentou a procura por destinos nacionais. De janeiro a outubro, 822,9 mil diárias foram usadas, alta de 14% em relação ao ano passado. “Nosso maior ativo é ter um ano e meio de diárias antecipadas para nossos clientes. E agora deixamos o atendimento tradicional para oferecer uma consultoria de turismo”, diz Abreu.

Outra área com bons resultados é a de consórcios e seguros. Com o crédito escasso e os juros altos, muitos têm optado pela modalidade para comprar imóvel ou veículo. A empresa dobrou o número de vendedores de 60 para 120. Até agosto, os títulos para imóveis cresceram 47% e os de automóvel, 6%.

Frase

“Nosso maior ativo é ter um ano e meio de diárias antecipadas para nossos clientes. E agora deixamos o atendimento tradicional para oferecer uma consultoria de turismo”

Reynaldo Miranda de Abreu, diretor de Negócios do Clube de Turismo da Bancorbrás.