Correio braziliense, n. 19531, 15/11/2016. Política, p.2
Recuo na punição a juízes e procuradores
Azelma Rodrigues
CRISE NA REPÚBLICA » Diante das críticas do Ministério Público Federal, o relator do pacote das medidas anticorrupção retirou de seu parecer o item que instituía o crime de responsabilidade para magistrados e promotores. Comissão especial analisa o texto amanhã.
Por pressão de representantes do Ministério Público Federal (MPF) e da força-tarefa da Lava-Jato, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS) recuou e vai eliminar pontos que previam a punição de juízes e integrantes do MPF por crime de responsabilidade, no relatório sobre as projeto das 10 Medidas Contra a Corrupção. O parecer começa a ser avaliado amanhã à tarde, pela comissão. Ontem, Lorenzoni e integrantes da comissão especial que analisa o pacote de medidas anticorrupção na Câmara dos Deputados, debateram o parecer com integrantes do MPF, incluindo o coordenador da força-tarefa da Lava-Jato, Deltan Dallagnol.
As formas de julgamento de magistrados e integrantes do MPF, por crime de responsabilidade, foram o centro das discussões. Tais medidas, que despertam críticas dos integrantes do MPF e dos procuradores da Lava-Jato, foram introduzidas por Lorenzoni no parecer divulgado semana passada, quando ele ampliou o pacote de 10 para 18 medidas.
As alterações ao projeto original apresentado pelo Ministério Público preveem 10 situações em que o magistrado poderá ser enquadrado na lei de crime de responsabilidade. Por exemplo, “quando exercer atividade político-partidária” ou for “preguiçoso no trabalho”. Ou se o procurador “exercer a atividade de advocacia”, conforme as oito possibilidades listadas pelo relator. No parecer, Lorenzoni justificou que “é indiscutível que juízes e membros do Ministério Público sejam agentes políticos”.
Segundo presentes à reunião, Lorenzoni acatou os argumentos dos procuradores “e a medida cai toda”. A questão poderá ser retomada no futuro, “mas não neste momento, porque poderia prejudicar a aprovação das outras medidas”. O próprio relator afirmou ao fim da reunião que a ideia é eliminar qualquer menção que constranja as grandes investigações que estão merecendo o aplauso da população, em referencia à Lava-Jato.
Votação
O presidente da comissão, deputado Joaquim Passarinho (PSD-PA), disse que a medida será eliminada e outros pequenos ajustes ao parecer serão avaliados, porque o objetivo da comissão não é prejudicar os procuradores ou a Polícia Federal. “O projeto não é contra eles, é a favor”, disse. Mas ele descartou a possibilidade de alterações no conteúdo do que foi apresentado pelo relator. A criminalização do caixa dois de campanhas eleitorais e a questão do enriquecimento ilícito, por exemplo, são pontos que não foram tocados.
“As sugestões do MPF foram bem recebidas pelos parlamentares e o resultado da reunião foi muito positivo ao pacote de medidas anticorrupção e para o país”, avaliou o presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República, José Robalinho Cavalcanti. “Nós avaliamos item por item do que foi feito pelo deputado, e achamos positiva a abertura de os deputados nos receberem para a discussão dessas questões”, continuou.
Lorenzoni acatou ainda a sugestão de ajustes na medida que ampliava a abrangência da ação popular, não só suspendendo o ato lesivo e prevendo o ressarcimento, como também cassando os direitos políticos de quem cometeu a irregularidade. Para Robalinho, a medida “seria uma arma” na mão de algumas pessoas, de “uso pouco adequado”, dando ao cidadão o poder de punição. “O deputado entendeu que era necessário reescrever algumas dessas propostas”, continuou.
Se depender o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a comissão especial deve votar as medidas a tempo de apresentar para avaliação do plenário, no início de dezembro.
Quais são
Confira as 10 medidas propostas originalmente pelo MP
1) Prevenção à corrupção
São várias propostas. Uma delas faz reserva orçamentária para campanhas educativas contra a corrupção. Outra prevê a criação dos testes de integridade, uma simulação de situações em que o agente público é avaliado para saber se ele cometerá um crime. Também serão permitidos os informantes confidenciais dos investigadores, que ficarão em sigilo durante toda a apuração criminal.
2) Criminalização do enriquecimento ilícito
Garante que o agente público não fique impune mesmo se não for possível descobrir ou comprovar quais foram os atos específicos de corrupção praticados que geraram a riqueza ilegal.
3) Aumento da punição
Aumenta a pena para o crime de corrupção, de acordo com o tamanho da propina paga, recebida, oferecida ou solicitada. Torna hediondo o crime a partir de determinados valores. Punições ficariam entre 4 e 12 anos de prisão.
4) Melhoria da eficiência dos recursos
Várias propostas incluem a execução da punição após condenação em segunda instância, como já foi decidido pelo Supremo Tribunal Federal, fim dos embargos infringentes e dos embargos de declaração sucessivos, além de “novas regras para habeas corpus”.
5) Ações de improbidade mais rápidas
A defesa inicial nesse tipo de processo deixa de ser duplicada e passa a ser única. Cria varas e órgãos colegiados para ações de improbidade administrativa. Permite acordos de leniência em casos não criminais.
6) Redução das prescrições
Aumenta os prazos para que um processo seja arquivado, sem o julgamento do réu, pelo fato de ter se passado muito tempo entre os fatos e a análise da Justiça.
7) Diminuição da anulação de processos
Várias mudanças alteraram as hipóteses em que um erro na investigação ou uma nulidade num único ato possa causar a anulação completa em toda a operação anticorrupção. Mesmo ilícito, um documento “obtido a prova de boa-fé” poderia continuar integrando o processo.
8) Criminalização do caixa dois
Torna mais claro que caixa dois é crime e cria a chamada “responsabilização objetiva” para os partidos políticos.
9) Prisão para evitar sumiço do dinheiro
A proposta é criar mais uma possibilidade de prisão preventiva, ou seja, antes de o cidadão ser denunciado e condenado: uma detenção para “permitir a identificação e a localização ou assegurar a devolução do produto e proveito do crime ou seu equivalente, ou para evitar que sejam utilizados para financiar a fuga ou a defesa do investigado ou acusado, quando as medidas cautelares reais forem ineficazes ou insuficientes ou enquanto estiverem sendo implementadas”.
10) Recuperação do “lucro” obtido com o crime
Cria o confisco da diferença entre o total de bens do criminoso e a parte que for provada ter sido obtida de forma lícita.