Ministros do STF mudaram Renan no cargo

Manoel Ventura

10/12/2016

 

 

Há um mês, magistrados avaliaram que réu não pode chefiar Poder

 

-BRASÍLIA- No julgamento que manteve Renan Calheiros (PMDB-AL) na presidência do Senado, ao menos dois ministros dos Supremo Tribunal Federal (STF), além do decano Celso de Mello, decidiram não aplicar uma tese que eles haviam adotado, em novembro, para caracterizar a incompatibilidade entre exercer cargo que está na linha sucessória da Presidência da República e ser réu em ação penal. No mês passado, os ministros Luiz Fux e Teori Zavascki seguiram integralmente o voto de Marco Aurélio Mello, relator da ação, que entendeu ser necessário afastar do cargo de presidente da Câmara, do Senado ou do STF quem teve denúncia aceita.

Nesta semana, ao votarem para derrubar a decisão de Marco Aurélio que tirava Renan do cargo e colocá-lo de volta no comando do Senado, Fux e Teori apresentaram novas justificativas. No julgamento iniciado em 3 de novembro — e suspenso por pedido de vista do ministro Dias Toffoli —, Marco Aurélio sustentou que não bastava afastar a possibilidade de um réu assumir a Presidência, solução adotada no caso Renan, mas era necessário retirálo do cargo. Teori Zavascki, ao acompanhar o relator, na época, citou o afastamento do ex-deputado Eduardo Cunha da presidência da Câmara.

Na decisão que afastou Eduardo Cunha, Teori argumentou que, embora a Constituição não declare expressamente a necessidade de afastamento da função de presidência dos Poderes, “não é demasia afirmar que ela acena vividamente nesse sentido, sobretudo nas hipóteses em que seja possível vislumbrar que as infrações penais tenham sido adjetivadas por desvios funcionais”. O Supremo aceitou denúncia contra Renan Calheiros por peculato — desviar bem público em proveito particular.

Ao votar na quarta-feira passada, porém, Teori reconheceu que já se manifestara pela saída de réus dos cargos, mas disse não ver urgência no caso do peemedebista.

— Não me parece defluir de sua condição de presidente do Senado já em fins de mandato outro risco de dano da ordem institucional que não o eventual exercício, nesse período, do cargo de presidente da República. É nesses limites que proponho que seja referendada a liminar — afirmou Teori.

Quando acompanhou totalmente o voto de Marco Aurélio, em novembro, o ministro Luiz Fux discursou em defesa da ética por ocupantes de cargos públicos:

— É ultraje conceber que o chefe da nação remanesça normalmente no exercício de suas atribuições constitucionais quando se encontra contra ele em trâmite ações penais ou de responsabilidade.

No caso Renan, Fux usou a crise política e econômica para dizer que o “periculum in mora” (perigo de demora, um dos fundamentos para a concessão da liminar) era inverso caso o senador saísse do cargo:

— Tendo em vista a inexistência de previsão constitucional de afastamento, e tendo em vista uma agenda política nacional que clama por socorro e deliberação imediata, nós estamos vivendo, quer queiramos ou não, uma anomalia institucional. O momento atual é de anormalidade institucional. O “periculum in mora” é inverso. Já há uma agenda do Parlamento sobre a qual o Judiciário não pode ter a menor ingerência tratando-se de um estado democrático de direito, onde, se existe instância hegemônica, ela deve ser o Poder Legislativo. Estamos agindo com a responsabilidade política que nos impõe.

 

 

O globo, n. 30441, 10/12/2016. País, p. 10.