PF sem regime especial

Geralda Doca e Lucianne Carneiro

10/12/2016

 

 

Atividades de risco terão idade mínima mais alta e tempo maior de contribuição

 

-BRASÍLIA- A reforma da Previdência prevê acabar com a aposentadoria especial nas atividades de risco no serviço público, o que afeta servidores da Polícia Federal, além de policiais civis. Pela norma atual, esses funcionários podem se aposentar mais cedo que os demais, com 30 anos de contribuição (homens) e 25 anos de contribuição (mulheres) — sem idade mínima. Ou seja, uma mulher que ingressou na carreira aos 21 anos pode requerer o benefício aos 46 anos de idade. Agora, isso pode mudar.

De acordo com a proposta de emenda constitucional (PEC) enviada ao Congresso, as regras ficarão mais duras mesmo na transição. Nesse caso, será preciso atingir a idade mínima de 55 anos, com 30 anos de contribuição, no caso dos homens, e de 50 anos de idade, com 25 anos de contribuição, no das mulheres.

Será enquadrado na regra de transição quem tiver mais de 50 anos (homens) e 45 anos (mulheres). Quem estiver abaixo dessa faixa etária terá de cumprir regras mais rígidas e só poderá se aposentar aos 65 anos de idade, tendo contribuído por pelo menos 25 anos.

A proposta também extingue o tratamento diferenciado aos funcionários da PF e policiais civis, que atualmente têm direito de levar na aposentadoria o último salário e o mesmo reajuste salarial concedido aos funcionários na ativa, independentemente da data em que ingressaram no serviço público. Caso a reforma seja aprovada, esse tratamento diferenciado só será mantido para quem ingressou na carreira antes de 2004.

Quem for mais jovem e tiver de cumprir as mudanças integralmente terá o benefício calculado da mesma forma que os trabalhadores da iniciativa privada: com base nos 51% sobre a média dos 80% maiores salários de contribuição, mais um ponto percentual adicional a cada ano de contribuição.

Outros tipos de aposentadorias especiais existentes, como as concedidas aos trabalhadores com deficiência ou que lidam com agentes nocivos à saúde, serão mantidas, mas as regras ficarão mais duras. Atualmente, eles podem se aposentar antes dos demais, sem idade mínima. Com a PEC, esses trabalhadores precisarão ter pelo menos 55 anos de idade e 20 de contribuição, tanto no setor público quanto no privado.

Pelas regras atuais, quem trabalha com agentes nocivos à saúde pode se aposentar aos 15, 20 ou 25 anos de contribuição, conforme o setor. No caso de deficientes, o tempo depende do grau do problema: se for deficiência leve são 33 anos; moderada, 29 anos; e grave, 25 anos. O tempo de recolhimento para a maioria dos trabalhadores é de 35 anos (homem) e 30 anos (mulher).

 

CONVERGÊNCIA DE REGRAS

Assim que a PEC for aprovada, o governo pretende detalhar o que são agentes nocivos e seus efeitos à saúde do trabalhador, para calibrar melhor as regras. Portanto, a idade mínima e o tempo de contribuição podem variar de acordo com a atividade. Pela proposta, a diferença entre os demais trabalhadores terá de ser de no máximo dez anos, na idade, e de cinco anos, no tempo de contribuição.

Segundo o secretário de Previdência, Marcelo Caetano, as mudanças nas aposentadorias especiais têm como principal objetivo a convergência de regras:

— É menos pelo impacto nas contas e mais pela harmonização das regras.

Segundo dados da Previdência, há no regime geral (INSS) 388 mil aposentados, que custam R$ 11,4 milhões por ano. Não há dados consolidados no sistema de aposentadoria dos servidores públicos.

Para policiais militares e bombeiros, excluídos da PEC e que também têm aposentadoria especial, a orientação do governo federal é que os governadores façam um pedido conjunto ao relator da proposta na comissão especial que vai tratar do tema, deputado Arthur Maia (PPSBA), para incluir a categoria nas mudanças. Eles foram retirados da PEC na última hora.

 

Jony Reifman, 56 anos

O dentista Jony Reifman, de 56 anos, esteve na agência do INSS do Centro do Rio para obter informações atualizadas sobre suas contribuições e agora vai buscar a ajuda de um especialista para tomar a melhor decisão: se pede aposentadoria agora ou se espera pelas regras de transição. Ele começou a trabalhar aos 18 anos, ajudando o pai numa clínica de odontologia, e diz que o trabalho de dentista inclui periculosidade, pelo contato constante com raios-X, mas teme que, com as novas regras, não consiga se aposentar tão cedo. “Quero fugir desse barco naufragando. Vou estudar se é melhor pedir agora a aposentadoria ou se vou perder renda”, diz Reifman, que, mesmo após a aposentadoria, pretende continuar trabalhando.

Dúvida

Como será o cálculo da minha remuneração?

Resposta

Caso se aposente após a promulgação da reforma, a aposentadoria de Jony Reifman seguirá as novas regras para cálculo do benefício: 51% do valor, mais um ponto percentual por ano de contribuição.

 

Fernanda Lourenço Campos, 58 anos

Com 23 anos de contribuição ao INSS e 58 anos de idade, Fernanda Lourenço Campos diz que as mudanças na previdência trouxeram incerteza para sua vida. Ela parou de contribuir em 2006, mas sempre teve a perspectiva de que poderia se aposentar aos 60 anos com uma renda de um salário mínimo. “Trabalho como autônoma, com shiatsu e acupuntura. Sabia que teria que continuar trabalhando depois de aposentada, mas achava que teria pelo menos um mínimo garantido. Agora, estou na incerteza”, lamenta.

Dúvida

Posso pedir a aposentadoria agora? Ou por quanto tempo mais terei que trabalhar para conseguir me aposentar?

Resposta

Trabalhadores a partir dos 50 anos, no caso de homens, e 45 anos, no caso de mulheres, serão enquadrados nas regras de transição. Com isso, devem pagar um “pedágio” de 50% sobre o tempo que falta para a aposentadoria na regra atual. No caso de Fernanda, faltariam dois anos para ela se aposentar por idade pelas regras atuais. Então, após a promulgação da reforma, em vez de esperar dois anos, ela terá de esperar três anos (dois+50%).

 

 

O globo, n. 30441, 10/12/2016. Economia, p. 25.