Correio braziliense, n. 19541, 25/11/2016. Política, p. 4

Ação de Graças adia leniência

CRISE NA REPÚBLICA » Feriado americano interrompe negociações de acordo entre Odebrecht, investigadores da Lava-Jato, autoridades suíças e americanas

 

As comemorações americanas pelo feriado do Dia de Ação de Graças interromperam a negociação do acordo de leniência entre a Odebrecht, a Lava-Jato e as autoridades da Suíça e dos Estados Unidos. A paralisação pode inviabilizar a assinatura do acordo antes da viagem do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para a China – o embarque está previsto para hoje.

Com a paralisação, os advogados da empreiteira retornaram para São Paulo ontem, mas tentarão retomar as conversas com os americanos ainda hoje. O último entrave para o fechamento do acordo de delação premiada é o valor que será pago pela empresa aos Estados Unidos, como multa da leniência negociada entre as autoridades americanas, o Brasil e a Suíça. Os EUA pressionam por um valor maior, o que gerou um impasse na reta final das negociações.

Os advogados e investigadores envolvidos na negociação tentavam equacionar o impasse até a tarde de ontem, para evitar que Janot estivesse fora do país quando fosse efetivada a assinatura do acordo. Entretanto, as comemorações da data associada à tradição de dar graças a Deus pelos bons resultados nas colheitas vai transferir a reta final da negociação para a próxima semana. Janot fica na China até o dia 4 de dezembro.

Apesar de a fase de negociação estar praticamente concluída, o material ainda não será enviado ao ministro Teori Zavascki, relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF). Antes de encaminhar as delações para homologação, os procuradores precisam concluir a validação de depoimentos dos delatores – o que pode se estender até as vésperas do recesso do Judiciário, que terá início em 20 de dezembro.

É somente após a homologação que o material pode ser utilizado para embasar a abertura de investigações e pedidos de medidas cautelares, como buscas e prisões. A expectativa é de que, após a assinatura dos acordos de delação e leniência, a Odebrecht divulgue um comunicado à sociedade sobre a situação do grupo.

Investigadores com acesso à negociação disseram que as delações dos executivos, bem como o acordo de leniência da empresa, não devem atingir de maneira uniforme as principais lideranças políticas brasileiras. Embora os principais partidos sejam alvo das delações – PMDB, PT e PSDB – , alguns políticos serão atingidos de “forma fatal” e outros terão suas imagens apenas “arranhadas” pelas revelações. A diferença se dará pelo fato dos valores recebidos da empresa estarem ou não atrelados a desvios praticados em obras e licitações públicas.

A análise feita por alguns investigadores é de que o acordo da empreiteira vai criar o “padrão Odebrecht”, tanto para as penas e multas, quanto para o conteúdo a ser entregue em negociações futuras. A partir de agora, diz um procurador, a empresa ou executivo interessado em delatar terá que oferecer algo além do que a Odebrecht já entregou. Nesse cenário, prevê o investigador, a tendência é que as empresas na fila – Queiroz Galvão, OAS, Mendes Júnior e Galvão Engenharia – consigam alcançar aqueles políticos que porventura tenham ficado de fora do acordo da empreiteira baiana.

 

Testemunhas

Às vésperas do fechamento do acordo, o ex-presidente da empreiteira Marcelo Bahia Odebrecht arrolou 30 testemunhas para sua defesa, incluindo a ex-presidente Dilma Rousseff, os ex-presidentes da Petrobras José Sérgio Gabrielli e Graça Foster, os ex-ministros Guido Mantega e Jaques Wagner e doze executivos ligados à companhia.

Todos os trinta nomes constam da resposta à acusação apresentada pela defesa daOdebrecht na ação penal em que ele é acusado de corrupção e lavagem de dinheiro. Além do empreiteiro, são acusados nesse processo o ex-ministro Antonio Palocci (Fazenda e Casa Civil/Governos Lula e Dilma) e mais 13 réus. Nessa ação, a Procuradoria da República acusa Palocci de atuar para favorecer a Odebrecht no governo federal.

 

Gilmar prorroga inquérito

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), prorrogou por mais 60 dias o inquérito que investiga o envolvimento do senador Aécio Neves (PSDB) em um suposto esquema de corrupção em Furnas.  “Registro que houve atraso no desenvolvimento das investigações”, anotou Gilmar.

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Inquéritos arquivados

 

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ontem ao ministro Teori Zavascki, do Supremo Tribunal Federal (STF), o arquivamento de inquérito contra a ex-governadora do Maranhão Roseana Sarney e contra o senador Edison Lobão (PMDB-MA). O inquérito havia sido aberto com base em delação premiada do ex-diretor de abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa, no âmbito da Operação Lava-Jato.

Em sua delação, Paulo Roberto Costa contou que Roseana recebeu R$ 2 milhões para a a campanha ao governo do Maranhão em 2010, após uma solicitação de Lobão (na época, ministro de Minas e Energia) ao ex-diretor de abastecimento da Petrobras. “A aludida afirmação, por si só, não se mostra suficiente para comprovar a prática de delitos criminais por parte das pessoas referenciadas pelo colaborador, havendo necessidade de elementos de corroboração”, destacou Janot.

No entanto, observou o procurador-geral da República, não foram colhidos “elementos probatórios, ao longo da instrução procedimental, aptos a corroborar as declarações do colaborador Paulo Roberto Costa”. Para o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, defensor de Roseana, nada foi provado porque se tratava de uma "mentira deslavada" de Paulo Roberto Costa.