Correio braziliense, n. 19541, 25/11/2016. Economia, p. 7

Sem investimentos, o país perde 74 mil vagas

Fechamento de postos de trabalho com carteira assinada, em outubro, anunciado pelo Ministério do Trabalho, mostra que empresas ainda não têm confiança para desengavetar projetos. No mês passado, só o comércio criou empregos

Por: ALESSANDRA AZEVEDO E VERA BATISTA

 

O Brasil continua tendo mais demissões do que contratações. Em outubro, o país perdeu 74,7 mil postos de trabalho com carteira assinada, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), divulgados ontem pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social. Foi o 19º mês seguido de fechamento de vagas formais. Nos últimos 12 meses terminados em outubro, o saldo é de 1,5 milhão de postos de trabalho suprimidos.

Apesar de negativo, o balanço do mês passado foi melhor que o de outubro de 2015, que teve 169 mil vagas fechadas, o pior resultado para a série histórica do Caged, iniciada em 1992. Já na comparação com setembro deste ano, quando o país perdeu 32 mil postos, outubro teve baixa de 0,3% no estoque de empregos formais.

A queda em relação a setembro, no entanto, já era esperada, afirma o coordenador geral de Estatísticas do Trabalho, do Ministério do Trabalho, Mário Magalhães. “É sazonal. A trajetória anual, com raras exceções, mostra agosto e setembro como melhores resultados do ano. A gente tinha pouca esperança que outubro estivesse pior que setembro”, disse ele.

Segundo Magalhães, o último trimestre costuma ter os piores resultados. Prova disso é que, nos últimos 12 meses, dezembro teve o pior saldo de empregos, com 596 mil demissões a mais que contratações. “Dezembro costuma ser negativo mesmo quando não estamos em crise. É o mês em que as empresas fazem os ajustes de pessoal e demitem algumas pessoas”, explicou o coordenador.

Nos 12 meses em que está desempregada, Sandy Silva, 18 anos, só conseguiu duas entrevistas de emprego, mesmo tendo enviado centenas de currículos para empresas e casas de família. Apesar de ter experiência como doméstica, ela não foi aprovada em nenhuma delas. “Fui demitida porque a minha patroa também perdeu o emprego. A situação está difícil para todo mundo”, comentou a jovem. “Precisam mudar as políticas para garantir que todos tenham uma fonte de renda”, disse.

 

Setores

A melhora nos dados anuais do emprego apontada pelo Caged estava dentro das expectativas dos analistas de mercado. Embora o número de dispensas tenha recuado em relação a 2015, ainda não se percebe otimismo em relação ao que poderá acontecer a médio e longo prazos com a economia brasileira e com os índices de desemprego até que o governo comprove que conterá gastos e fará as reformas necessárias. “As contratações aumentam sempre entre setembro e dezembro. O que há de diferente é que, no ano passado, as perspectivas eram de turbulência muito forte no Brasil. Hoje, o país está na expectativa”, destacou o economista Emerson Casali, especialista em relações de trabalho.

“Promessas não têm efeito no ambiente de negócio. Sem a aprovação da proposta que limita as despesas, que deverá ser votada em 13 de dezembro pelo Senado, é difícil enxergar 2017”, reforçou Casali. Não foi por acaso, disse ele, que os piores resultados do Caged foram na construção civil (33.517 postos fechados), que vem tendo quedas sucessivas por conta da contração do crédito, e no setor de serviços (30.316 vagas eliminadas).

Além da construção civil, os setores de serviço e agricultura também sofreram perdas, de 30,3 mil e 12,5 mil vagas, respectivamente. “Os serviços, sobretudo, sofrem com a inadimplência do setor público, pelo atraso no pagamento de fornecedores e também pela dificuldade de honrar até os salários com o funcionalismo. Nesse cenário, uma recuperação do emprego deverá ocorrer apenas a partir do segundo semestre de 2017”, disse. O único setor que teve resultado positivo em outubro foi o comércio, com 12,9 mil postos a mais.

 

Sustos

Para Eduardo Velho, economista-chefe da A2A Asset INVX, o lado levemente positivo é que o Caged indicou que “o fundo do poço já passou”. As dispensas ainda vão continuar crescendo nos próximos meses, porém em ritmo mais lento. “A taxa de desemprego, em 2014, era de cerca de 5%. Hoje, está em 12%, e devemos chegar, no início do ano que vem, a 13%. Ainda é uma paulada. Não dá para ter otimismo. Os empresários estão cautelosos e dificilmente vão iniciar investimentos. No entanto, eles já ajustaram o orçamento. Não esperam mais grandes sustos. Essa é a diferença”, analisou Velho.

Ajudará a dissipar as dúvidas do empresariado, além das propaladas reformas alardeadas pela equipe econômica, mais uma queda nos juros básicos da economia de 0,25% (para 13,75%), ainda em novembro, disse Velho.

“A trajetória da inflação também está sendo observada. O mercado já reagiu e reduziu o crescimento econômico para 1%. Se a inflação não for contida e apontar a possibilidade de ultrapassar os 4,7% em 2017, a situação pode se complicar”, destacou Velho.