Renan é denunciado na Lava-Jato por receber propina de empreiteira

Jailton de Carvalho e Manoel Ventura

13/12/2016

 

 

Janot cita Platão e diz que Serveng pagou R$ 800 mil ao senador por meio de doações eleitorais

 

-BRASÍLIA- O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDBAL), foi denunciado ontem pela primeira vez na Operação LavaJato. O senador, que já é réu no Supremo por peculato (desvio de dinheiro público), foi acusado pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, de corrupção e lavagem de dinheiro por receber propina da empreiteira Serveng, que tem contratos com a Petrobras. O deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE) e o empreiteiro Paulo Twiaschor também foram denunciados. Janot pediu que Renan e Aníbal Gomes percam os mandatos se forem condenados.

Janot abre a denúncia citando Platão: “Podemos facilmente perdoar uma criança que tem medo do escuro; a real tragédia da vida é quando os homens têm medo da luz”. Na denúncia, a PGR afirma que Calheiros recebeu propina de R$ 800 mil da Serveng por meio de doações eleitorais na campanha de 2010. Pelas investigações, a Serveng fez duas doações ao Diretório Nacional do PMDB, de R$ 500 mil e R$ 300 mil.

Esses valores foram do Diretório Nacional para o comitê financeiro do partido em Alagoas e deste para Renan Calheiros, mediante diversas operações fracionadas, como estratégia de lavagem de dinheiro. Em troca, Renan patrocinaria interesses da empreiteira, que queria participar de licitações mais importantes na Petrobras, o que foi viabilizado a partir do começo de 2010 por intermédio de Aníbal Gomes.

Janot afirma que Renan tinha influência sobre o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, que agiu em favor da empresa. A PGR narra que “no dia seguinte ao da primeira doação da Serveng, em agosto de 2010, o Diretório Nacional do PMDB” começou a transferir de maneira fracionada o dinheiro para a campanha de Renan.

“A assinatura da primeira autorização de serviço e a primeira doação da Serveng ao PMDB serem no mesmo dia corroboram todo o esquema criminoso, deixando de ser mera coincidência de datas”, diz Janot. Segundo a denúncia, os R$ 800 mil constituem aproximadamente 14% do total de receitas declaradas pela campanha de Renan. A PGR cita como elemento que confirmaria que “doações oficiais eram propina paga dissimuladamente” o fato de que não há doações anteriores a 2010 da Serveng ao PMDB.

“Apenas no ano de participação na primeira licitação e de assinatura do primeiro contrato de vulto começaram a ocorrer doações dessa pessoa jurídica ao partido”, diz a denúncia.

De 2010, ano da primeira doação ao PMDB, até 2014, os valores pagos pela Petrobras à Serveng subiram aproximadamente 380%, segundo a denúncia. Janot descreve o presidente Michel Temer, à época presidente do PMDB, como “notório aliado” de Renan: “Na época, em 2010, o presidente do Diretório Nacional do PMDB era Michel Temer, ao passo que o tesoureiro era Eunício Oliveira, ambos notórios aliados de Renan Calheiros”.

Além das penas previstas para corrupção e lavagem de dinheiro, o procurador cobra R$ 800 mil a título de danos materiais e mais R$ 800 mil para “os danos transindividuais”. O procurador requereu, por fim, a decretação da perda da função pública “para os condenados detentores de cargo, emprego público ou mandato eletivo, principalmente por terem agido com violação de seus deveres para com o Estado e a sociedade”. É a primeira vez que o STF vai ter que decidir se houve pagamento de propina disfarçada de doações eleitorais, uma das teses da Lava-Jato. Ainda não há data para o julgamento da denúncia.

Em nota, Renan disse que “jamais autorizou qualquer pessoa a falar em seu nome” e garantiu estar tranquilo. A nota, assinada pela assessoria da presidência do Senado, reitera que as contas eleitorais de Renan foram aprovadas. Renan responde a outros dez inquéritos no STF, sendo sete da Lava-Jato.

O deputado Aníbal Gomes negou envolvimento em qualquer irregularidade. Admitiu que intermediou um encontro com representantes da Serveng com Paulo Roberto Costa; segundo ele, com o objetivo de apresentar o projeto de um porto com investimento privado, em São Paulo.

— Não tinha dinheiro público. Era investimento privado. A única coisa que eles (Serveng) queriam era alugar para a Petrobras um berçário. Mesmo assim, alguns meses depois, não deu certo — disse o deputado, negando que tenha intermediado pagamentos para Renan.

Em nota, a Serveng disse que recebeu a denúncia com “surpresa e indignação” e que sempre esteve à disposição das autoridades: “A alegação de que a Serveng Civilsan fez doações eleitorais com o fim de ‘participar de licitações mais vultosas na Petrobras’ não faz qualquer sentido e sua inveracidade será provada na primeira oportunidade que nossa defesa tiver para se manifestar nos autos”.

 

“A única coisa que eles (da Serveng) queriam era alugar para a Petrobras um berçário”

Aníbal Gomes (PMDB-CE)

Deputado também denunciado

 

 

O globo, n. 30444, 13/12/2016. País, p. 05.