Valor econômico, v. 17, n. 4150, 12/12/2016. Brasil, p. A3

PEC acelera corrida pela aposentadoria

Marta Watanabe

 

Mesmo com a proposta de uma regra de transição e a promessa de garantir os direitos a quem cumprir antes as condições legais para a aposentadoria, a iminente reforma previdenciária deve apressar a corrida pela aposentadoria. Para analistas, a tendência é que a incerteza sobre as mudanças aumente a aposentadoria pelo fator previdenciário, mesmo que isso signifique um benefício de valor menor.

O fator previdenciário permite a aposentadoria por tempo de contribuição - 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem -, independentemente da idade. Mas, quanto mais jovem o trabalhador, menor é o valor do benefício.

Dados da Secretaria da Previdência do Ministério da Fazenda mostram que o valor médio das aposentadorias iniciais concedidas entre julho de 2015 a maio deste ano pelo fator previdenciário foi de R$ 1.840,53 mensais enquanto na fórmula 85/95 foi de R$ 2.798,38. O cálculo leva em conta das aposentadorias rurais e urbanas por tempo de contribuição.

Mesmo assim, o fator previdenciário representa mais da metade das aposentarias concedidas e já ganhou mais espaço este ano. Ainda segundo a Previdência, de julho a dezembro do ano passado, o fator previdenciário foi aplicado em 55,4% das aposentadorias concedidas. Os dados mais atualizados deste ano, de janeiro a maio, mostram elevação para 58,3% dos benefícios com fator previdenciário.

"O brasileiro é mais imediatista e muitas vezes não quer esperar mais quatro ou cinco anos para se aposentar", diz Newton Conde, da Conde Consultoria Atuarial. "A tendência é que o fator previdenciário seja ainda mais procurado agora, com o receio da reforma", avalia.

Válida desde junho de 2015, a fórmula 85/95 exige também tempo mínimo de contribuição de 30 anos para a mulher e de 35 anos para o homem. Mas nesse caso a soma da idade e o tempo de contribuição precisam resultar em pelo menos 85 pontos para a mulher e 95 pontos para o homem. Cumprido o requisito, o aposentado tem direto ao benefício integral. Por isso o valor da aposentadoria por essa regra costuma ser maior que o do fator previdenciário.

Na maior parte dos casos, porém, a fórmula 85/95 demanda que o trabalhador espere alguns anos a mais para completar os pontos necessários. Nesse sistema, o número mínimo de pontos para se aposentar também aumenta gradualmente nos próximos anos até chegar a 90 pontos a partir de 31 de dezembro de 2026.

Hoje um homem com 55 anos de idade e 35 anos de contribuição, por exemplo, recebe pela fórmula do fator previdenciário 69,2% do benefício calculado com base na média de salários. A soma da idade e do tempo de contribuição - 55 mais 35 - resulta em 90 pontos. Se esperar mais e mantiver sua contribuição até 2019, porém, esse trabalhador completará 96 pontos e poderá se aposentar pelo sistema 85/95, o que lhe garantiria aposentadoria integral. Para dezembro de 2019 essa regra estabelece 96 pontos.

O brasileiro, porém, não quer esperar, diz Leonardo Rolim, ex-secretário da previdência e atualmente consultor da Câmara. "No Japão não precisaríamos da regra do 85/95 para tentar elevar a idade da aposentadoria. Somente o fator previdenciário teria feito isso. No Brasil, os trabalhadores em geral preferem perder 30% do valor do benefício, mesmo que seja uma perda para o resto da vida." A tendência, diz Rolim, é que com a reforma da previdência em debate, haja uma corrida maior ainda para a aposentadoria.

"Como é relativamente jovem ainda, a maior parte dos trabalhadores olha a aposentadoria como renda complementar. Aos 55 anos, por exemplo, o homem pede o benefício e continua trabalhando. Ele não pensa no futuro em que dependerá somente do valor da aposentadoria", diz Conde.

Analistas lembram que o fator previdenciário achata a aposentadoria de quem para de trabalhar mais jovem, mas eleva o valor do benefício para quem espera mais tempo. Atualmente, pelo fator previdenciário, o homem que se aposenta aos 65 anos de idade e 49 anos de tempo de contribuição recebe praticamente uma vez e meia -148,8% - o benefício calculado com base na média de salários. Uma mulher nas mesmas condições recebe 165,3% do benefício.

Com a reforma previdenciária proposta pelo governo federal 65 anos de idade e 49 anos de contribuição são condições mínimas para garantir 100% do benefício seja para homens ou mulheres.

O contraste dá a medida de como são bem mais duras as regras propostas em relação ao fator previdenciário. De qualquer forma, seja pelo fator previdenciário ou pela fórmula 85/95, o valor da aposentadoria está submetido ao teto atual de R$ 5.189,82. "Mas não é isso que faz a diferença hoje para a decisão de se aposentar. Porque a maior parte das pessoas estão bem abaixo disso", diz Conde.

Dados do anuário estatístico de 2014 da Secretaria da Previdência mostram 70% das aposentadorias urbanas concedidas por tempo de contribuição têm valor de até três pisos previdenciários, que corresponde atualmente a R$ 2.640,00. Na faixa de até dois pisos previdenciários - o que corresponde a R$ 1.760,00 - estão 46,7% das aposentadorias.