Valor econômico, v. 17, n. 4144, 02/12/2016. Brasil, p. A2

Governo flexibiliza exigência para dividir recursos da repatriação com os Estados

 

Fabio Graner
Edna Simão
Camilla Veras Mota
Cristiane Agostine

 

Pressionado pelos Estados, o governo federal flexibilizou parcialmente sua posição em torno da partilha da multa da repatriação de ativos no exterior. Em vez de vincular a liberação do dinheiro à efetivação de uma série de medidas de ajuste fiscal, o presidente Michel Temer e o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, aceitaram fazer o pagamento mediante um compromisso político mais genérico dos governadores em adotar ações para o controle de suas despesas e para reforma previdenciária.

Esse compromisso será formalizado numa carta em que os governadores vão assinar e será apresentada a Meirelles e Temer. Nele, os Estados devem explicitar que concordam em implantar um teto de gasto público, parecido com a PEC do teto, mas com duração de 10 anos e sem inclusão das despesas previdenciárias no limite.

O teto de gasto do Estado não deverá "necessariamente" ser corrigido pela inflação como é o caso da União, segundo o governador do Pará, Simão Jatene. A reforma da Previdência dos Estados é a outra parte do acordo, mas as mudanças no sistema ocorrerão conforme as realidades específicas de cada um deles, mas vão incluir aumento de alíquotas de contribuição. Jatene defendeu a adoção de alíquotas diferenciadas.

Ontem, Temer recebeu no Palácio do Planalto cinco governadores, um representando cada região, para discutir a partilha da multa e as medidas de ajuste fiscal. Desde que Meirelles anunciou a divisão do dinheiro mediante contrapartidas fiscais no último dia 22 de novembro, houve um acirramento político, especialmente com os governadores do Nordeste.

No final das contas, nem os governadores conseguiram desvincular totalmente as duas questões, apesar do discurso de parte deles nessa linha após o encontro, e nem o governo manteve a posição bastante rígida adotada em torno da necessidade de "cumprir as medidas" antes da liberação do recurso, que será feita mediante retirada das ações ajuizadas no Supremo Tribunal Federal (STF).

Embora estivesse disputando no STF, o governo avalia que tem um risco não desprezível de sofrer uma derrota na Corte e que, para não perder esse dinheiro "de graça", tem buscado arrancar o máximo de compromissos com o ajuste fiscal. Enquanto estava na postura mais rígida, técnicos da equipe econômica sinalizavam até a possibilidade de alongar a disputa no STF e, em caso de derrota, emitir precatórios a partir de 2018. Esse caminho, no entanto, acirraria o clima político já conturbado.

"O presidente demonstrou todo interesse e toda a disposição de pagar a multa ainda este ano num prazo mais curto possível independente do que nós estamos discutindo aqui", disse Jatene, em entrevista após a reunião. "O ajuste vai ser feito não é porque alguém está mandando. Não porque alguém está trocando alguma coisa pelo ajuste, mas porque as contas não resistem", acrescentou.

Na avaliação do governador do Piauí, Wellington Dias, a multa da repatriação é uma discussão que está sendo feita no Supremo e, portanto, deve ser tratada separadamente das medidas de ajuste fiscal que os Estados vão se comprometer em adotar. "Não estamos aqui condicionando para nossas medidas essa definição sobre o pagamento das multas. É claro se tivermos a condição da União, e o presidente manifestou isso, de pagar sem esperar a decisão do Supremo, tanto melhor. Mas é um acordo que tem um aspecto legal onde a União paga os Estados, que dizem abrir mão das ações", acrescentou. "Não queremos caracterizar isso como uma troca", frisou o governador de Santa Catarina, Raimundo Colombo, destacando que os Estados têm "consciência" da necessidade de colocarem suas contas em ordem.

Para tentar que não houve recuo do governo na cobrança de medidas fiscais dos Estados, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse que a multa da repatriação será dividida entre Estados e que o texto da reforma da Previdência será enviado ao Congresso ainda neste mês. Ele reforçou que os Estados vão seguir os termos de ajuste fiscal da União, com a criação de um teto para limitar os gastos públicos e aumento da alíquota da Previdência dos servidores estaduais. "Tivemos uma reunião com governadores de Estado que propuseram e concordaram com a União de que os Estados devem fazer um ajuste fiscal nos termos da União", afirmou Meirelles a jornalistas antes de falar a investidores em São Paulo.

Segundo os governadores que participaram de encontro com o presidente Temer e o ministro Meirelles, a equipe econômica deverá tornar mais rígidas as exigência para liberação de aval do Tesouro para contratação de empréstimos pelos Estados. Para liberação de garantias, o Tesouro vai exigir a implementação das medidas de ajustes fiscais que os governos estaduais se comprometeram em implementar.