Valor econômico, v. 17, n. 4144, 02/12/2016. Política, p. A9

Supremo torna Renan réu no caso do pagamento de pensão à filha

 

Carolina Oms

 

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), se tornou réu pela primeira vez em uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF). A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal votou pelo recebimento da denúncia contra Renan por peculato - ou seja, desviar bem público para proveito particular. O Código Penal fixa pena de dois a 12 anos de prisão para quem é condenado.

Em denúncia apresentada ao STF em 2013, a Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou que o parlamentar não tinha dinheiro suficiente para pagar pensão alimentícia a Mônica Veloso, caso que foi objeto de escândalo em 2007, ano em que Renan também presidia o Senado. Renan é suspeito de destinar parte da verba indenizatória do Senado, utilizada para a manutenção de seu gabinete, para a locadora Costa Dourada Veículos que, segundo a PGR, não prestou os serviços.

Os gastos com a locadora teriam feito parte de uma trama, diz a PGR, para tentar comprovar que o senador teria condições de arcar com despesas de auxílio de uma filha fora do casamento e rebater a tese de que a empreiteira Mendes Junior teria pago os gastos.

Segundo Edson Fachin, relator do caso, estão presentes indícios de autoria suficientes para receber a denúncia. para ele, da quebra de sigilo de Renan, "surgiram indícios de que a verba indenizatória, ao menos parte dela, estaria sendo apropriada ou desviada pelo investigado", disse. O ministro, no entanto, ressalvou que, durante o recebimento da denúncia, não se faz análise aprofundada e não se veicula juízo de condenação.

Além do relator, votaram pelo recebimento da denúncia por crime de peculato os ministros Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Teori Zavascki e Marco Aurélio, Celso de Mello e Cármen Lúcia.

Já Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski votaram pelo arquivamento da denúncia contra o presidente do Senado. Gilmar criticou as investigações da Procuradoria-Geral da República, que, segundo ele, foi apresentada com diversas "bizarrices".

"É uma mera suposição. Para receber a denúncia é necessário ter elementos probatórios mínimos", afirmou Toffoli.

Os ministros Edson Fachin, Luiz Fux e Teori Zavascki votaram ainda pelo arquivamento das outras acusações do crime de falsidade ideológica de documento público e do uso desses documentos. Segundo Fachin, para determinar a falsidade ideológica, o Ministério Público deveria ter dito qual informação era inverídica, não apenas apontar divergência em relação a outro documento.

Para todos os ministros, houve prescrição do crime de falsidade ideológica de documento particular e do uso desses documentos.

Por meio de nota, Renan Calheiros afirmou que recebeu "com tranquilidade" a decisão do STF. "A aceitação da denúncia, ainda que parcial, não antecipa juízo de condenação. Ao contrário, o debate entre os ministros evidenciou divisão e dúvidas quanto a consistência dos indícios do Ministério Público, qualificados como precários por vários deles, inclusive por alguns que aceitaram a denúncia. Não há prova contra o Senador, nem mesmo probabilidades, apenas suposição", diz a nota.

Ao pedir o recebimento da denúncia, o vice-procurador-geral da República, Bonifácio José de Andrada, afirmou que a análise das provas demonstrou que Renan falsificou notas e documentos para tentar comprovar que tinha dinheiro oriundo de negócios de gado, além de ter simulado o recebimento de empréstimos para justificar evolução financeira.

Mesmo réu, Renan deve continuar na presidência da Casa. O presidente do Senado está na linha sucessória de substituição do presidente da República. Em novembro, a maioria do Supremo votou para que réus não possam ocupar cargos na linha sucessória, mas o julgamento foi interrompido após o ministro Dias Toffoli pedir vista do processo, interrompendo o julgamento. Assim, o julgamento ainda não tem aplicação prática.

Atualmente, Renan é alvo de outros 11 inquéritos no STF, sendo oito relacionados à Operação Lava-Jato, por suspeita de participação dele no esquema de desvio de dinheiro da Petrobras.