Valor econômico, v. 17, n. 4149, 09/12/2016. Política, p. A10

Duque diz que Lula interferiu em decisões estratégicas da Petrobras

Renato Duque: depois de mais de um ano de negociações, ex-diretor da Petrobras está perto de se tornar delator

Por: Por André Guilherme Vieira

Por André Guilherme Vieira | De São Paulo

 

Mais próximo de fechar acordo de delação premiada com a Operação Lava-Jato, o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque colabora com a linha de investigação que aponta para uma suposta ingerência política do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em decisões estratégicas tomadas pelo conselho da Petrobras, conforme apurou o Valor PRO, serviço de informação e tempo real do Valor.

Nos últimos três meses, Duque entregou aos investigadores informações e documentos sobre fatos ainda não revelados ou pouco conhecidos, mas que interessam à Lava-Jato. Esses dados coincidem com o período em que Lula presidiu o país por dois mandatos consecutivos, de 2003 a 2010. Duque comandou a estratégica diretoria de Serviços da Petrobras por nove anos, de 2003 a 2012, indicado na cota política do PT. Os contratos fechados em todas as áreas da Petrobras tinham obrigatoriamente de passar pela chancela da diretoria de Engenharia e Serviços.

"[Duque] Tem potencial para derrubar o argumento do 'eu não sabia', e mostrar como o pessoal do andar de cima comandava o esquema operado lá embaixo", garante uma fonte com acesso às tratativas que envolvem a costura do acordo com o ex-diretor. No balanço de 2014, a Petrobras reconheceu baixa contábil de R$ 6,2 bilhões resultante de corrupção em contratos entre 2004 e 2012.

A pré-delação de Renato Duque também atinge o ex-presidente da Petrobras nomeado por Lula, José Sérgio Gabrielli, que dirigiu a companhia de julho de 2005 a fevereiro de 2012.

A força-tarefa tem afirmado em manifestações ao juiz federal Sergio Moro que "diversos fatos vinculados ao esquema que fraudou licitações da Petrobras apontam que o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva tinha ciência do estratagema e dele se beneficiou".

Procurada, a assessoria de imprensa de Lula não quis comentar "especulação de suposta delação". E alegou que nenhuma das 19 testemunhas já ouvidas pelo Ministério Público Federal (MPF) na ação a que o ex-presidente responde em Curitiba por corrupção e lavagem "confirmou qualquer acusação contra Lula".

O petista é processado pela suposta ocultação de um tríplex no Guarujá e pelo recebimento de R$ 3,7 milhões que teriam origem em três contratos firmados pela OAS com a estatal, segundo o MPF.

Duque produziu resumos de informações já entregues ao MPF por sua defesa. São os chamados anexos pré-delação premiada.

Nesses documentos, os advogados do delator informam como ele pretende contribuir com a investigação. A entrega costuma ser acompanhada da indicação de quais meios de prova poderão ratificar os depoimentos.

O ex-executivo da Petrobras também se comprometeu a entregar extratos bancários e a indicar posições de contas mantidas na China ainda não alcançadas pela Lava-Jato. O país asiático não tem acordo de cooperação internacional em matéria penal com o Brasil.

Cumprindo execução provisória de três sentenças que lhe foram impostas pelo juiz Moro por corrupção, lavagem e organização criminosa - que somadas contabilizam mais de 51 anos de cadeia - Duque tem permanecido na carceragem da Polícia Federal (PF), em Curitiba.

É no edifício da PF do Paraná que procuradores costumam tomar depoimentos de delatores presos preventivamente ou já em cumprimento de pena. Delegados, no entanto, não participam das negociações com Duque.

O acordo com o ex-diretor da Petrobras chegou a ser considerado inviável ao menos quatro vezes, porque ele resistia à ideia de se tornar delator. A atitude dele foi considerada arrogante pelos investigadores.

A redução da pena que será cumprida por Duque e o prazo em que ele será obrigado a usar tornozeleira eletrônica ainda estão sendo discutidos.

A defesa de Renato Duque não foi localizada até o fechamento desta edição. A reportagem também não conseguiu manter contato com a assessoria de imprensa do ex-presidente da estatal, José Sérgio Gabrielli.