Título: Dilma teme pelos Brics
Autor: Martins, Victor; Lyra, Paulo de Tarso
Fonte: Correio Braziliense, 24/11/2011, Economia, p. 19

Em conversa com parlamentares, presidente afirma que os problemas europeus podem prejudicar os países emergentes.

Os sinais de que a crise econômica que derrubou a Europa começa a bater às portas dos Brics — grupo de países formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul —, preocupam a presidente Dilma Rousseff há pelo menos uma semana. Ela manifestou o cenário adverso em jantar com parlamentares aliados e pediu cautela neste momento. "Precisamos ter muita responsabilidade fiscal e econômica para que o Brasil possa enfrentar a turbulência", disse ela na quarta-feira passada, em jantar com a presença do vice-presidente Michel Temer.

No encontro privado, a preocupação da presidente era clara: não há espaço para gastos desnecessários. Dilma pediu empenho para a aprovação da Desvinculação das Receitas da União (DRU) — a emenda já foi aprovada na Câmara, mas precisa passar no Senado até 31 de dezembro para que possa valer em 2012. A presidente também quer cautela dos congressistas na aprovação do Orçamento da União. Ela avisou que todos os aumentos salariais para o funcionalismo já foram dados nos anos anteriores e que não adianta pressionar para elevar os gastos.

Para que os líderes partidários não levassem às bancadas apenas notícias ruins, Dilma sinalizou que a atuação monetária do governo continuará sendo firme, mas não restritiva. O combate à inflação será mantido, mas a tendência é que os juros continuem sendo reduzidos. Ela disse que o governo vai buscar aumentar a oferta de crédito para manter o consumo interno, o principal pilar de sustentação do país durante a crise de 2009.

Dilma confirmou, no entanto, que o Brasil está na rota de risco. Lembrou que a atual crise internacional começou na Grécia, estendeu-se a Portugal e se alastra com uma velocidade surpreendente. "Irlanda e Espanha caíram na sequência. A Itália tornou-se a bola da vez e os efeitos negativos chegaram à França, um dos gigantes do continente", disse a presidente, segundo relato de um dos presentes. Nesse escalada, Dilma não considera impossível que as atuais "locomotivas da economia mundial" — os países emergentes — percam fôlego. "Rússia, Índia, Brasil e até mesmo a China não estão imunes a nada."

Ontem, durante solenidade de comemoração dos 60 anos da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), a presidente adotou um tom mais tranquilizador. Afirmou que o país tem R$ 440 bilhões em depósitos bancários compulsórios que podem ser usados a qualquer momento. "Poderemos enfrentar qualquer problema sem a necessidade de recorrermos ao Orçamento", disse. Dilma também afirmou que o país tem "muito espaço para atuar na política monetária", insinuando novos cortes na taxa básica de juros.

PROPOSTA INTERMEDIÁRIA O Congresso ainda busca um caminho alternativo para conceder o aumento salarial para os servidores do Judiciário. O embate entre o Executivo e o Supremo Tribunal Federal é antigo. Os magistrados defendem um reajuste de R$ 1 bilhão escalonado ao longo dos próximos sete anos, até que se quite o deficit salarial levantado pela categoria. A equipe econômica não aceita a proposta, alegando que o atual cenário internacional impede planejamentos muito ousados a longo prazo. Os Congressistas estudam um caminho intermediário: garantir R$ 1 bilhão no próximo ano mediante o corte de algumas despesas do Orçamento, deixando para discutir no ano que vem os demais recursos para a Justiça. A aposta é que, até lá, o cenário exterior tenha se desanuviado.