Direto do túnel do tempo

Alexandre Ernst

10/01/2017

 

 

 

Ao falar de medidas na Saúde, presidente esquece o real e menciona o cruzeiro, moeda extinta há 24 anos, quatro dias depois de se referir à chacina no presídio em Manaus como um ‘acidente pavoroso

 

 

 

-ESTEIO (RS)- O presidente Michel Temer voltou no tempo durante discurso na cerimônia de entrega de ambulâncias para prefeituras gaúchas, em Esteio, Região Metropolitana de Porto Alegre. Enquanto falava sobre medidas do governo federal, com referência ao trabalho do ministro da Saúde, Ricardo Barros, o peemedebista trocou a moeda vigente no país e a gafe causou um certo burburinho no Parque de Exposições Assis Brasil.

É a segunda gafe do presidente em quatro dias: na quinta-feira passada, Temer classificou a chacina no presídio em Manaus de “acidente pavoroso”. Horas mais tarde, o Twitter da Presidência reafirmou o termo, tentando justificar a expressão.

Os aliados presentes no palco, no evento de ontem, como o próprio Barros; os ministros Eliseu Padilha (Casa Civil) e Osmar Terra (Desenvolvimento Social), o governador do Rio Grande do Sul, José Sartori, e o prefeito de Porto Alegre, Nelson Marchezan, ambos do partido de Temer, ignoraram a mancada, mas a plateia achou graça.

Temer se referia ao pouco tempo de seu governo, e destacou para Sartori o que Barros fez na Saúde.

— Em primeiro lugar, ele começou a impedir os tais ralos pelos quais saem os recursos. Em pouquíssimo tempo, logo nós fizemos uma solenidade no palácio em que ele anunciou a economia de 800 milhões de cruzeiros, que significam novas Upas, novas UBS, e também novas ambulâncias — disse Temer, sem perceber que tinha trocado as moedas.

O cruzeiro foi substituído pelo cruzeiro real em 1993. A moeda brasileira passou a ser o real, que vigora até hoje, um ano depois, em 1994. Na transcrição do discurso pelo Palácio do Planalto, o equívoco não foi suprimido, mas a palavra reais apareceu entre colchetes junto a cruzeiros.

Temer foi recebido com protestos em Esteio. Sindicalistas ligados à CUT e Cpers reivindicavam reajuste salarial e pagamento do 13º salário por parte do governo gaúcho. Um forte aparato de segurança foi montado, com PM, Exército e Polícia Rodoviária Federal. Os protestos aconteceram no portão 7, no lado contrário onde Temer desembarcaria de um helicóptero.

Por conta da manifestação, a entrada de prefeitos e convidados teve de ser revista, o que causou transtorno e um pequeno engarrafamento na entrada no Parque de Exposições. Os governantes, em sua maioria da base aliada do governo federal, também foram alvo de palavras de ordem dos manifestantes, mas não houve violência.

Além da entrega de 61 ambulâncias a prefeitos de cidades do Rio Grande do Sul, parte do programa de renovação da frota do Samu, o presidente anunciou que um dos cinco presídios federais de segurança máxima que o governo planeja construir ficará no estado. A construção de novas prisões foi anunciada na última semana, como uma das medidas para enfrentar a crise no sistema penitenciário do país, que já resultou em quase cem mortos esse ano.

— Sei que não é nada agradável anunciar presídio mas, volto a dizer, a realidade social atual exige medidas dessa natureza — disse Temer.

O presidente seguiu do Rio Grande do Sul para Portugal, onde participará do funeral do ex-presidente Mário Soares. Temer citou a viagem e aproveitou para defender a Reforma da Previdência, enviada pelo governo ao Congresso, que fixa a idade mínima de 65 anos para a aposentadoria:

— E eu quero rememorar que, em Portugal, a idade mínima é 66 anos, ainda cortaram 30% da aposentadoria e 30% dos vencimentos do servidor público. Nós não queremos chegar a isso. Nós queremos preparar o futuro para que não precisemos fazer como Portugal, Espanha e outros países.

 

 

O globo, n. 30472, 10/01/2017. País, p. 06.