Temer: "Nunca caí de uma pinguela"

Julia Chaib e Denise Rothenburg

23/12/2016

 

 

CRISE NA REPÚBLICA » Em entrevista coletiva, o presidente disse que a frase de FHC para definir o atual mandato mostra a necessidade de sustentar o governo. Peemedebista afirmou que pode ir ao Supremo caso o TSE casse a chapa de 2014 e garantiu não se importar com a impopularidade

 

A 10 dias do fim do ano, o presidente Michel Temer fez um balanço dos sete meses à frente do governo, quatro, como interino, e três como efetivo. Em café da manhã com jornalistas no Alvorada, sentado ao lado da equipe econômica — ministros da Fazenda, Henrique Meirelles, e do Planejamento, Dyogo Oliveira — Temer negou que vá renunciar. Afirmou ainda que não demitirá o braço direito, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, alvejado em depoimentos da delação premiada da Odebrecht, no âmbito da Lava-Jato. Diante de denúncias, ele foi questionado sobre eventual temor de deixar o governo antes do fim do mandato diante de uma decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em cassar a chapa Dilma/Temer. A Corte deverá julgar no primeiro semestre de 2017 uma ação apresentada pelo PSDB que pede a cassação. Caso o julgamento o condene, o mandatário apresentará recursos até uma decisão definitiva, a qual afirmou que respeitará. Temer ainda disse que a frase do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que definiu o restao de mandato como uma “pinguela”, serve para mostrar a necessidade de sustentar o governo. “Eu nunca caí de uma pinguela.”

 

Sobre riachos

“Você sabe que quando eu era menino, eu sou do interior do estado de São Paulo, uma cidade pequena, e havia um riacho e nesse riacho eu e alguns colegas, éramos meninos, nós brincávamos muito colocando uma pinguela para atravessar exatamente esse riacho. E nós atravessávamos a pinguela, sabe que eu nunca caí, embora fosse uma pinguela, é um coisa interessante. Então quando ouço essa expressão, digamos, delicada do ex-presidente (FHC) de que é uma pinguela, é porque se percebe que há muitas amarguras, muitas paixões, não é? Então, no fundo, o presidente, o ex-presidente Fernando Henrique, quando menciona, ele menciona do tipo: olhe é uma pinguela, mas precisamos sustentar. Eu, quando o vi pela primeira vez eu me recordei que essa foi a primeira coisa, eu me recordei exatamente dessa infância em que eu atravessava a pinguela com muito sucesso, sem nunca ter caído.

 

Ação no TSE

“Havendo uma decisão, haverá recursos e mais recursos não só ao TSE, mas ao Supremo Tribunal Federal também. Mas se o Judiciário tiver uma decisão definitiva, eu serei obediente a ela, senão eu estaria violando a tese que sustento de separação e harmonia entre os poderes”

 

Delações

“Digo com muita frequência que é interessante que no Brasil se formou a seguinte convicção, se um delator mencionou o nome de alguém, ele (o acusado) está definitivamente condenado e sei lá o que leva um delator a dizer isso ou aquilo. (O fato é que) não se pode soltar uma delação por semana. Cria clima de instabilidade”

 

Eliseu Padilha

“Não tirarei o chefe da Casa Civil. Ele segue firme e forte à frente da Casa Civil. Não haverá mudança”

 

Queda de Geddel

“No caso do Geddel, foram cinco dias, foi uma coisa angustiante, é verdade. Estou dizendo isso para mostrar que nesses 5, 6 dias foram momentos muito agitados e, afinal, o ministro Geddel acabou saindo, portanto, compreendendo as naturais angústias do governo”

 

Reforma ministerial

“Estou examinando, pontualmente, caso a caso. Evidentemente em um dado momento, se houver necessidade de reforma ministerial, eu a farei, mas não farei em função do ponto A ou do ponto B, farei uma coisa global para efeito administrativo, ou seja, para agilizar cada vez mais o governo. Mas não penso nisso agora. Se pensar, pensarei no futuro”

 

Racha na base

“É natural que os partidos tenham uma ou outra afirmação transitória. No caso do PSB, é interessante, embora haja manifestações dizendo ‘quero sair do governo’, não chegou a mim, especialmente. Nas decisões do Congresso, ressalvada esta última, tanto PSB quanto o PSDB deram um número muito significativo de votos. Então, não sei se essas manifestações têm impacto sobre a bancada. Nós que passamos quatro anos no Parlamento sabemos que é uma palavra aqui ou acolá, o que importa é saber se ao longo do período legislativo, o governo ganha ou perde. Essa é a grande realidade. E o governo não perdeu coisa nenhuma. O governo propôs a história da recuperação fiscal e ela foi aprovada. Eu ressalto logo esse dado, a interação entre o Executivo e o Legislativo, é fundamental. Ou seja, umas das pautas do nosso governo, uma das chaves do nosso governo, é a palavra diálogo. Quando você reinstaura o diálogo com o Congresso, reinstaura o diálogo com a sociedade, a tendência é que as coisas fluam com muita naturalidade. E a democracia é assim, o Executivo não governa sozinho, governa com o apoio do Poder Legislativo. E naturalmente quando há controvérsia, é que vai para o Poder Judiciário. Então aprovamos isso com muita rapidez”

 

PSDB

“Temos três ministros do PSDB no governo e o reiterado apoio das lideranças do PSDB”

 

Popularidade

“Dizem que há impopularidade. Isso me incomoda? Não, digamos assim, é desagradável, mas não me incomoda para governar. Para governar, alguém até disse há poucos dias: ‘Olha, a popularidade é uma jaula, aproveitem impopularidade para fazer aquilo que o Brasil precisa’. E é o que estou fazendo. Lá na frente haverá reconhecimento, a verdade virá”

 

Previdência

“Induvidosamente, a reforma da Previdência é um dos grandes temas nacionais. Mas ocorreu um fato que nos entusiasmou, que foi o fato de havermos mandado a reforma da Previdência e 10 dias depois ganhou-se admissibilidade da PEC na Comissão de Constituição e Justiça. Vocês sabem que é um tema que eu reconheço a polêmica que envolve, convenhamos que aprová-la em menos de 10 dias foi mais um dado extremamente positivo. E agora, evidentemente, quando o Congresso retomar os seus trabalhos formar-se-á a Comissão Especial, haverá grandes debates. De vez em quando me dizem: ‘Mas será que com a Previdência vai acontecer a mesma coisa que aconteceu com o teto dos gastos?’. Porque o teto dos gastos entrou de um jeito e saiu do mesmo jeito. Não houve modificação alguma. Quando me perguntam da Previdência, eu digo: Não sei dizer, porque haverá uma larga discussão a propósito desse tema. Mas o fato é que ela será realizada com este apoio induvidoso que nós temos tido do Congresso Nacional. O projeto foi fruto de longos meses de trabalho da equipe que cuidou da Previdência. Chegamos à conclusão de que, fazendo isso, seria extremamente útil para o país. Agora, se o Congresso quiser modificar o texto, vamos dialogar, vamos conversar. Mas, no momento, queremos que seja aprovado tal como está”

 

A primeira medida

“Convenhamos, nós temos sete meses de governo, sendo quatro como interino e apenas dois meses e vinte dias, mais ou menos, como efetivo. E vocês sabem que na interinidade há sempre uma dúvida muito grande, então, fica muito difícil às vezes tomar todas as medidas necessárias. Quem exerce a Presidência deve fazê-lo por inteiro, e foi o que nós fizemos durante a interinidade. Veja que um dos primeiros atos foi aquilo que a área econômica, a Fazenda detectou, ou seja, que o deficit não era de R$ 96 bilhões, mas de R$ 170,5 bilhões. Nós remetemos o aditivo ao Congresso Nacional e o Congresso, muito rapidamente, aprovou e eu sempre registro um fato temporal, aprovou às 4h30 da manhã, com quórum na Câmara e no Senado. Revelando, portanto, um apoio extraordinário que eu tenho ressaltado em todos os instantes ao governo”

 

 

Correio braziliense, n. 19569, 23/12/2016. Política, p. 2.