FGTS inativo é liberado e negociação, fortalecida

Vera Batista, Alessandra Azevedo, Denise Rothenburg e Julia Chaib

23/12/2016

 

 

LEGISLAÇÃO » Governo vai autorizar saques de R$ 30 bilhões nas contas inativas até 2015, o que beneficiará 10,2 milhões de pessoas. Projeto de lei prevê extensão da jornada diária para até 12 horas por meio de negociação entre patrões e empregados

 

Depois de lançar a proposta de reforma da Previdência, no início do mês, o governo apresentou ontem um projeto de lei que modificará 12 pontos da legislação trabalhista. O “presente de Natal”, como foi definido pelo presidente Michel Temer, inclui medidas como horário de trabalho de até 12 horas por dia (oito normais mais quatro horas extras), desde que se respeite o limite de 44 horas semanais e de até quatro horas extras, e contratos temporários mais duradouros, de até 120 dias — atualmente, não podem passar de 90 dias. São medidas que agradam aos empresários. Mas o governo também informou que desonerações tributárias para empresas não serão renovadas em 2017.

Além disso, Temer anunciou, que serão liberados, por meio de medida provisória, os saques nas contas do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) inativas até 31 de dezembro de 2015, sem limite de valor. O trabalhador que deixou o emprego e não retirou os recursos poderá resgatar o total  disponível. É possível consultar por meio de aplicativo da Caixa Econômica Federal o saldo das contas.

Somente em 1º de fevereiro de 2017 será publicado um cronograma com as datas, de acordo com o dia de aniversário de quem tiver o direito. Com isso, calculou o Ministério do Planejamento, serão injetados mais de R$ 30 bilhões na economia. Na noite de quarta-feira, ainda se cogitava restringir os saques a 10 salários mínimos (R$ 8,8 mil), o que acabou não ocorrendo.

“É uma injeção de recursos que vai mobilizar, movimentar a economia e equivale, também pelos cálculos do Planejamento, a cerca de 0,5% do PIB Produto Interno Bruto (PIB) e sem pôr em risco a própria solidez do FGTS”, disse Temer.

 

Segurança

Os itens da minirreforma trabalhista, que terão força de lei em acordos ou convenções coletivas, incluem o parcelamento de férias anuais em até três vezes — hoje são duas —, compensação da jornada de trabalho, intervalos intrajornadas, plano de cargos e salários, banco de horas, trabalho remoto, entre outros.

De acordo com as novas regras de limite de horas, se um funcionário trabalhar duas horas extras na segunda-feira e duas na terça, não poderá exceder o horário normal entre quarta e sábado, por exemplo. Essa possibilidade dependerá de acordo entre empregados e empregador, de forma a garantir maior segurança jurídica às relações trabalhistas.

As novas normas foram enviadas ao Congresso por meio de projeto de lei, em regime de urgência, que deverá ser aprovado em até 60 dias. O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, ressaltou que as propostas “não retiram direitos dos trabalhadores e têm o objetivo de valorizar as negociações coletivas”. Uma MP publicada ontem renova por um ano a adesão de empresas ao Programa Seguro-Emprego, em que há redução de 30% de salários e jornada em troca de compromisso de manutenção das vagas.

 

Desonerações

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que “medidas bombásticas” não funcionam. “Há uma lista concedida pelo governo anterior. Decidimos que não teria nenhuma nova ou renovações. Por que não cancelar?”, indagou. Mais tarde completou: “O princípio é não renovar as desonerações que estejam vencendo em 2017”.

Durante a apresentação do projeto de minirreforma trabalhista, no Planalto, Paulo Skaf, presidente da Federação das Industrias de São Paulo (Fiesp), disse que as medidas foram “anunciadas em momento oportuno” e que elas incentivam a competitividade. “Tenho certeza que o Congresso terá a sensibilidade necessária para aprová-las”, frisou.

O mercado financeiro olhou o pacote com desconfiança. Para Newton Rosa, economista-chefe da Sul América Investimentos, as medidas não reduzem, como deveriam, o custo do trabalho. “No fundo, os encargos continuam os mesmos”, estranhou.

Fernando Aquino, do Conselho Federal de Economia (Cofecon), considerou o pacote “perigoso”, embora o governo insista que não haverá precarização das relações de trabalho. “Não é totalmente assim. A ampliação do prazo do contrato temporário, por exemplo, de 90 para 120 dias pode, sim, provocar uma dispensa sem verba rescisória, o que prejudica o trabalhador.” O pior item, no entanto, é a tendência do negociado sobre o legislado, disse Aquino. “Há um risco de sindicatos fracos fazerem negociações injustas”, reiterou.

Ao contrário do pensamento das centrais sindicais, mas também não tão alinhado ao pensamento do empresariado, o advogado trabalhista Fábio Chong, do escritório L.O. Baptista Advogados, avaliou como “tímidas” as mudanças anunciadas ontem pelo governo. “Acho que se avançou muito pouco em termos da tão sonhada modernização das relações trabalhistas. Estamos décadas atrasados nesse tópico. O que foi proposto, da forma que foi proposto, não gera empregos, não altera significativamente as relações de trabalho e não resolve um dos maiores problemas, que é o excesso de burocracia”, lamentou.

 

Frase

“É uma injeção de recursos que vai movimentar a economia sem  pôr em risco a a solidez do FGTS”

Michel Temer, presidente da República

 

 

Correio braziliense, n. 19569, 23/12/2016. Economia, p. 7.