O Estado de São Paulo, n. 44970, 01/12/2016. Política, p. A5

Renan tenta votar medidas, mas fracassa

 

Julia Lindner
Erich Decat
Isabela Bonfim

 

Em manobra articulada em seu gabinete com alguns líderes do Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), tentou na noite de ontem votar requerimento de urgência do pacote anticorrupção, menos de 24 horas após a aprovação na Câmara, mas foi derrotado.

A iniciativa, na prática, levaria à discussão da proposta, a toque de caixa, para o plenário.

A manobra contou com o apoio de integrantes das bancadas do PMDB, PP, PR, PT, PTB, PSB, PDT e PTC, que votaram a favor da urgência. Apesar da tentativa, o grupo conseguiu apenas o apoio de 14 senadores, mas 44 se posicionaram contra. Em razão disso, o projeto foi encaminhado para ser discutido inicialmente na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Em meio às reações acaloradas, Renan chegou a orientar para que dois senadores fossem à tribuna para falar contra o requerimento e dois a favor, mas nenhum subiu à tribuna para defendê-lo.

Segundo apurou o Estado, Renan decidiu colocar o projeto com urgência na ordem do dia porque ficou “irritado” com as ameaças dos coordenadores da Lava Jato.

Entre os participantes da reunião realizada no gabinete de Renan estavam o líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), e o senador Roberto Requião (PMDB-PR), que deve ser designado relator da proposta. Requião também é o relator do projeto que atualiza a lei de abuso de autoridade no Senado, defendido por Renan.

O líder do governo, senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), também teria participado da reunião, mas saiu irritado ao saber do acordo que estava sendo costurado.

Em discurso no plenário da Casa, Nunes disse que a proposta ia na contramão da opinião pública. “Sou contra essa matéria. Ela foi aprovada na madrugada de ontem e a maioria dos senadores não a conhecem.

Não nos coloquem na contramão da opinião pública. Não quero que essa matéria chegue na mesa do presidente Temer para vetar ou apoiar”, afirmou.

 

Julgamento. Em rota de colisão com o Judiciário, Renan pode se tornar réu hoje no Supremo Tribunal Federal (STF). A Corte vai decidir se aceita denúncia contra por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso.

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‘Só regime fascista aceitaria’, diz peemedebista

 
Julia Lindner
Daiene Cardoso
Igor Gadelha
Isadora Peron

 

Antes de tentar colocar regime de urgência para a votação do pacote anticorrupção no Senado, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), afirmou que a decisão da Câmara sobre as 10 medidas “não pode sofrer pressão externa”.

Renan disse que as propostas apresentadas pelo Ministério Público Federal, com apoio de mais de 2 milhões de assinaturas da sociedade, estava “fadado” a sofrer modificações. Ele avaliou que alguns pontos só seriam aprovados em um “regime fascista”. “Propostas como informante do bem, validação de provas ilícitas e teste de integridade só seriam aceitas em um regime fascista”, afirmou.

Renan rebateu as declarações de procuradores da forçatarefa da Lava Jato, que ameaçaram deixar as investigações caso o presidente Michel Temer sancione o texto da forma que está. Os procuradores acusam os deputados de “desfigurar” a proposta enviada pelo MPF.

Para o peemedebista, qualquer tentativa de interferência nas decisões dos parlamentares “conflita e interpõe” a democracia.

“Não se pode fazer cadeia nacional para pressionar por nada que absolutamente contesta e esvazia o Estado democrático.” Após decisão da Câmara, o pacote ainda será analisado pelo Senado. Mais cedo, Renan demonstrou que não tem pressa em dar sequência à tramitação.

Segundo o peemedebista, ele “respeitará” os prazos regimentais e enviará o texto para comissões permanentes, o que deve adiar a análise do plenário para o próximo ano.

 

Maia. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também reagiu ontem às críticas contra a forma como a Casa votou o pacote anticorrupção. Destacando a todo momento que a votação foi transparente e nominal, Maia disse que a Câmara exerceu seu papel institucional, legislou com independência e precisa ter suas prerrogativas respeitadas.

“Porque o resultado do processo legislativo não foi o que alguns queriam, não dá para a gente falar que a Câmara fez algo equivocado, a Câmara tomou sua decisão por maioria. E a história julgará cada um daqueles que votou”, disse.

Após mais de duas horas de reunião com líderes partidários, Maia deixou a reunião negando que houve retaliação ao MPF e à magistratura. Ele ressaltou que os Poderes são independentes e harmônicos e a Câmara exerceu sua independência de forma democrática. / JULIA LINDNER, DAIENE CARDOSO, IGOR GADELHA, ISADORA PERON

 

Críticas

“Propostas como informante do bem, validação de provas ilícitas e teste de integridade só seriam aceitas em um regime fascista.”

Renan Calheiros